Edição do Fórum da Mulher do Jequitinhonha discute gestão da água no Vale

Texto por Petra Fantini e fotos de Agatha Azevedo

Reunir mulheres e compartilhar relatos, esta é a ideia principal do Fórum da Mulher do Jequitinhonha. Este ano, o evento chega a sua quinta ediçãotrazendo o tema da gestão das águas, em que foi discutida a exploração e manutenção das reservas da região e como isto afeta direta e indiretamente a vida das mulheres.

Realizado anualmente pelo Polo de Integração da UFMG no Vale do Jequitinhonha em articulação com o Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher (Nepem), o Fórum foi constituído ao redor do debate sobre o papel da mulher na vida do Vale. Conta, em todas as suas edições, com a questão da ocupação do espaço público pela figura feminina, além de ser lugar de luta perene pelo fim da violência contra a mulher.

Em parceria ainda com a Prefeitura de Virgem da Lapa, este ano o evento reuniu mais de 400 mulheres entre trabalhadoras rurais, assentadas, quilombolas, indígenas, juventude, sindicalistas, de comunidades e de movimentos sociais em torno de uma demanda urgente na região: a escassez de água. Conhecida pela seca e pelas dificuldades socioeconômicas dela resultante, o Vale do Jequitinhonha hoje enfrenta novos desafios nesta área.

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Vilões da água

A descoberta de uma grande jazida de minério de ferro em 2008 atraiu muitas empresas de mineração para a área. Um dos maiores males desta atividade é a utilização de minerodutos para o transporte das pedras, que exige quantidades monumentais de água extraída de rios e lagos da região, os quais já estão visivelmente secos.

Outra atividade que vem atingindo os moradores da região é a monocultura de eucalipto. Reflexo de políticas de incentivo público desenvolvidas a partir dos anos 70, a plantação de extensas florestas de eucalipto tem como objetivo sustentar as empresas de celulose e ferro gusa – extraído do carvão vegetal da planta – da região. Além da desmatação sistemática da vegetação natural do cerrado, a árvore ainda é responsável por sugar toda a água da terra em que é plantada, impossibilitando que qualquer outra coisa cresça lá posteriormente. Por fim, há as barragens de hidrelétricas. Principal fonte de energia no país, só na região do Norte de Minas Gerais há projetos para a implantação de 400 barragens de hidrelétricas, causando a inundação de paisagens inteiras e o desmantelamento da vida de milhares de famílias.

Todas essas atividades são ainda cercadas por questões trabalhistas. A chegada de grandes empresas de exportação acarreta um conhecido processo de exploração em que toda a riqueza natural da região é comercializada em outras áreas e pouco ou nenhum lucro deixa à população local, a qual ainda se vê forçada a entrar em sub empregos – como a feitura de mudas de eucalipto, que paga 15 reais a cada 1000 saquinhos produzidos, trabalho primariamente realizado por mulheres e crianças; e a enfrentar problemas como prostituição e aumento da violência. E é aqui que entra a mulher em tudo isto. São elas as maiores vítimas da prostituição nos canteiros de obras, do aumento da violência doméstica causada pelo crescimento do alcoolismo dos maridos que se tornam desempregados, dos trabalhos análogos à escravidão aos quais se veem obrigadas a se submeter para ajudar no sustento da família. Com base em tudo isso, o V Fórum da Mulher do Vale do Jequitinhonha organizou Grupos de Trabalho, ministrados por bolsistas do Nepem, que reuniram mulheres direta e indiretamente atingidas por essas problemáticas para a discussão e elaboração de uma Carta das Águas. Inspirado na Carta da Mulheres desenvolvida na edição de 2011 do evento, desta vez a carta foi voltada principalmente aos problemas socioeconômicos relacionados aos recursos hídricos da região.

Representatividade feminina nas instituições

A presença da figura feminina na vida pública da região foi outro ponto central do evento. Com falas das representantes da Secretaria de Políticas para as Mulheres de Minas Gerais, Áurea Carolina e Renata Rosa, além de relatos de Aline Ruas, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e da vereadora do município de Itaobim, Maflávia Ferreira, o assunto foi pontuado como essencial para que a voz da mulher se faça ouvir. Um dos objetivos do Programa Fórum das Mulheres do Vale do Jequitinhonha deste ano é selecionar e instruir mulheres que possam atuar como delegadas na 4ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, a ser realizada em março de 2016. Assim, o V Fórum serviu como introdução ao assunto que será melhor abordado no Eixo 2 – Formação para a Cidadania de Gestoras e Conselheiras, com realização de oficinas de formação. “Nossa presidenta Dilma está sendo crucificada não só pelo seu projeto político, mas por ser mulher”. É com frases como esta que mulheres como Cléa Amorim de Araújo, do Cáritas Diocesana de Araçuaí, abriram o tema da presença da mulher em instituições públicas. Como explicado pela sub secretária Áurea Carolina em sua conferência sobre os desafios das políticas para as mulheres, a falta da presença feminina em cargos públicos começa nas bases machistas da sociedade, que historicamente confina as mulheres nos espaços domésticos de suas casas.

Além das conferências e palestras, o evento contou ainda com a realização de um ato que saiu em passeata pelas ruas de Virgem da Lapa gritando, entre outras, pela reforma agrária, pelo fim da violência contra a mulher e pelo protagonismo feminino nas lutas sociais.

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