ÚLTIMA ATUALIZAÇÃO

13/04/2014

ATORES ENVOLVIDOS

Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Extração de Ferro e Metais Básicos de Congonhas, Belo Vale e Ouro Preto (METABASE);Companhia Siderúrgica Nacional; Ferrous Resources do Brasil;Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Congonhas; Ministério Público Estadual de Minas Gerais (MPE/MG); Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais; Nacional Minérios S.A. (Namisa);Associação Comunitária do Bairro Plataforma;Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM); Prefeitura Municipal de Congonhas; Governo do Estado de Minas Gerais.

MUNICÍPIO

Congonhas, Jeceaba

CLASSIFICAÇÃO GERAL E ESPECÍFICA

Atividades Industriais (Mineração)
Uso e ocupação do solo (Parcelamento / Loteamento em área rural)

Atividades / Processos Geradores de Conflito Ambiental

Plataforma de escoamento de minério da CSN; Especulação imobiliária e negociação fora dos padrões almejados pelos moradores

Descrição do caso:
(população afetada, ecossistema afetado, Área atingida, histórico do caso)

 

A história da mineração de ferro em Congonhas é secular, tendo ligação direta com o início da siderurgia no Brasil. A primeira companhia criada data do início do século XIX, financiada ainda pela coroa e nominada como “Fábrica de Ferro Patriótica de Congonhas” (MILANEZ, 2010).  Adiante, sucedendo a pioneira A.Thun & Cia, que já explorava, desde 1913 em pequena escala e de forma rudimentar o minério de ferro da região, surge a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) ainda na década de quarenta,  que teria como função alavancar a siderurgia nacional através da extração de matéria prima para a fabricação de aço. A atuação da empresa na região iniciou-se no ano de 1946, como uma estatal criada pelo então presidente Getúlio Vargas, após formalização de um decreto e obtenção de um empréstimo junto aos Estados Unidos em troca de apoio na Segunda Guerra Mundial. A cidade, reconhecida pela UNESCO em 1985 como patrimônio mundial devido às esculturas dos doze profetas presentes no Santuário do Bom Jesus de Matozinhos, conjunto arquitetônico e paisagístico que, dentre outras obras, é composto pelas esculturas dos doze profetas  e os passos da paixão de Cristo, todos esculpidos por Aleijadinho, tornou-se um dos maiores produtores de minério de ferro bruto do Quadrilátero Ferrífero, alcançando municípios com grande vocação mineraria como Ouro Preto, Mariana e Itabira. Nos dias atuais Congonhas se consolida como uma área promissora de investimento para empresas privadas e multinacionais de nome.

 

Assim sendo, o aquecimento econômico provocado pela implantação e rápida escalada de produção da CSN na região acarretou mudanças bruscas também em municípios vizinhos como Ouro Branco, Jeceaba e Conselheiro Lafaiete, de tal forma que muitos moradores locais se tornaram os empregados da mineração da companhia recém-instalada e suas empreiteiras. Aliada a essa mão de obra local, as oportunidades de trabalho atraíram famílias vindas de outros estados, que fixaram moradia nos bairros periféricos e em alojamentos temporários, muitos deles oriundos de outras regiões do Brasil em primeira experiência de moradia na região sudeste. Os bairros na região central da cidade (Alvorada, Eldorado, Campinho, Gran Park, Pires, entre outros) logo se tornaram bairros operários, enquanto a parte rural de Congonhas foi sendo gradualmente impactada pelos empreendimentos situados no entorno da mineração da mina Casa de Pedra (Plataforma, Esmeril, Santa Quitéria, Pires e Alto Maranhão).  Desta forma, os bairros foram crescendo, alguns em lugares muito próximos dos campos de extração. Os moradores convivem com o esgotamento maciço de recursos naturais que outrora serviam para o abastecimento de água local.

 

Ainda falando sobre consequências para a população, a utilização de técnicas de extração de minério consideradas defasadas, no sentido de provocar danos ambientais, causam o aumento de partículas de minério de ferro no ar e grande parte dos moradores congonhenses sofre com os incômodos e com os problemas de problemas respiratórios decorrentes da poeira. A construção de ferrovias e estradas para o escoamento do contingente extraído alargou ainda mais o perímetro de impacto. Aliado a isso, a falta de cuidado com os rejeitos tem provocado a poluição do Rio Goiabeiras, que a jusante se une com o Rio Maranhão, um dos rios que cortam a cidade. A conjuntura de situações descritas ilustra as dificuldades sentidas pelos moradores vizinhos à mineração Casa de Pedra em manter sua qualidade de vida frente às atividades implantadas.

 

Dentre esses territórios, o caso mais grave é observado no conjunto de aproximadamente cem casas que formam o bairro Plataforma, localizado a uma proximidade de 15 metros dos trilhos da companhia ferroviária MRS e da plataforma de abastecimento dos vagões da CSN. O seu aglomerado habitacional constitui-se de uma mistura de operários da empresa e suas empreiteiras (ativos e aposentados) e com alguns poucos remanescentes dos antigos agricultores que se estabeleceram antes da chegada do empreendimento na região. Seus moradores têm convivido nos últimos anos com uma grande incerteza provocada por uma proposta de expansão da atividade mineral no Alto Paraopeba: a criação de um complexo parque industrial em zona rural da cidade que iria abranger a desapropriação de 4 mil hectares de terras, 13% do total do município e 80% das terras agrícolas, sendo prevista a remoção das famílias. Em 21 de agosto de 2006, a CSN informou em audiência com o Ministério Público Estadual seu interesse em expandir suas atividades para área do bairro. Em 06 de novembro do mesmo ano, os moradores indagaram a empresa sobre os rumores de desapropriações. A resposta que obtiveram por parte da empresa foi de que os rumores não procediam. Todavia, ainda em novembro, a CSN afirmou, em ofício ao MPE, que tinha interesse em expandir suas atividades para a área, o que implicaria na remoção das famílias do bairro e inviabilizaria investimentos reivindicados pela população.

 

Mesmo diante dessa pretensão da companhia, em agosto de 2007, foi firmado um TAC, pelo qual a empresa ficou obrigada a cercar a área da linha, fazer a passarela e implementar coleta seletiva no bairro; a CSN se comprometeu também a fazer medições mensais das partículas suspensas no ar (MINAS GERAIS, 2005).  Assim sendo, a partir do ano de 2007 iniciou-se o processo de negociação com os moradores. A princípio, previa-se a retirada de cerca de 500 sitiantes e realocando em regiões urbanas do centro da cidade. Principal interessada na empreitada, a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), pretendia investir aproximadamente 12 bilhões de reais na região, podendo assim extrair, pelotizar e transformar o minério em aço comercializável em uma única região (CODAP, 2010). A visão do governo local é de que “a prefeitura também foi surpreendida com o tamanho da área destinada ao distrito industrial, mas [aceitou] a proposta do estado para abrigar não só a CSN, mas outras empresas que podemos atrair para o município” (CABIDO, 2007).

 

O projeto de expansão da companhia se resumiu ao aumento vertiginoso das áreas de lavra e do volume de minério explorado, sendo que as usinas nunca saíram do papel. Tal  fato gerou grande inquietação em Congonhas, e em especial, instabilidade aos moradores do Bairro Plataforma, pois uma parte da população, em parte  vencida pelo cansaço,  iniciou negociação junto à CSN, aceitando a proposta de realocação para o bairro Campinho, na região central de Congonhas. De acordo com os moradores, a avaliação pouco criteriosa no estabelecimento do perímetro do novo terreno ofertado no plano de realocação, bem como a negociação por valores inferiores à realidade são fatores que geram grandes incertezas quanto aos verdadeiros interesses da companhia. Assim sendo, o projeto Nova Plataforma não atendeu de forma efetiva as necessidades e perspectivas do contingente realocado, principalmente pelo tamanho do lote que não favorece o plantio e espaço livre para recreação das crianças.

 

A insatisfação perante às táticas utilizadas pelas CSN podem ser percebidas nos depoimentos abaixo, que demonstram o descaso da companhia para com os moradores do Bairro Plataforma. Elas mostram relatos de pessoas que aceitaram a proposta de troca integral de moradia. Os encarregados pela negociação se esforçam em apresentar as vantagens das novas moradias e os benefícios da sua proximidade com o centro de Congonhas a fim de evitar possíveis compensações monetárias, que seriam muito dispendiosas para o orçamento da CSN e poderiam demorar anos para serem viabilizadas aos indivíduos de direito:

 

 Me diga por favor onde vou plantar minha horta e criar minhas galinhas dentro da cidade? (Moradora do bairro Plataforma).

 (...) muitos dos moradores que foram para o Novo Plataforma foram e estão insatisfeitos, foram porque não conseguiram suportar a pressão causada pela empresa, essa pressão ambiental e psicológica, ela dá um valor muito inferior querendo tomar o que a gente tem, e tudo que a gente tem lá foi conquistado com suor, foi lutado e não roubado. (...) Assim, eu não quero falar de valores, negociação é algo particular, mas tem pessoas lá que possuem 5 lotes e estão oferecendo 50 mil reais nos lotes, e não é coisa pequena não. Ela mudou os projetos da casa que ela ofereceu aos moradores, eram 6 padrões e elas mudaram para 2, sem consentimento, sem falar nada pra nós. Mudaram esses modelos de alvenaria para um de steel flaming, que é de placa, os moradores não estão satisfeitos com isso (Relato de morador em Reunião Pública realizada em fevereiro de 2014 na Câmara dos Vereadores de Congonhas)

 

Tendo em vista que o processo de negociação vem ocorrendo de forma pouco criteriosa desde 2007, alguns moradores não aceitaram se mudar do bairro e estão sofrendo devido a condições insalubres de vida nos arredores da plataforma do empreendimento. Muitas casas foram negociadas e derrubadas, e as famílias remanescentes sofrem com a ineficiência dos serviços públicos básicos como postos de saúde e correios. A situação foi agravada devido às dificuldades de acesso ao bairro, pois a sua estrada de acesso vem sendo utilizada como trajeto para a chegada dos caminhões e pick-ups à mina Casa de Pedra. A Prefeitura Municipal de Congonhas não tem dado assistência devida para os mesmos, e inclusive não tem conseguido manter diálogos construtivos com a CSN, e por isso recomenda uma nova intervenção do MPE junto à companhia. Vereadores de Congonhas afirmam que somente um órgão com poder de polícia com perfil fiscalizador como o Ministério Público poderia impor sanções eficazes, visto que o empreendimento, por ter um grande histórico de atuação como empresa estatal, utiliza de seu poderio institucional para atropelar o poder municipal e o poder estatal. No entanto, as experiências de atuação do órgão no ano de 2007 foram ineficazes quanto à regulação e mitigação dos impactos socioambientais da Plataforma, e até mesmo à garantia da dignidade humana  para seus moradores.

 

Conclui-se que a efetividade da proteção estatal aos interesses e direitos coletivos é baixa - aquém do mínimo esperado e garantido por lei-, ao contrário da pujança dos lucros das empresas, do volume de  arrecadação auferida pelos cofres públicos e do vertiginoso volume de minério exportado da região com destino a China e outros países:  

 

O Prefeito não vê mecanismos, o Prefeito conversa com a CSN, mas não temos um resultado prático junto à CSN, prova o desrespeito e o descaso com vossas excelências. A gente já acompanha este problema há muito tempo, e sabemos do desrespeito que a CSN tem não só com os moradores de Plataforma mas também com todos os sitiantes que já teve, aquele engodo, aquela mentira, que desapropriou, e voltou tudo à estaca zero, não vai ter usina, não vai fazer pelotização porcaria nenhuma, vai só arrancar minério, exportar minério, e é isso que a gente vê. Então a gente não vê um mecanismo que realmente faça efeito. (Relato do vereador Advar Geraldo Barbosa, durante audiência pública realizada na Câmara de Vereadores de Congonhas, em fevereiro de 2014).

 

Fonte(s):

 

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DE MINAS GERAIS, Reunião busca consenso sobre investimento em Congonhas. Disponível em: <http://www.almg.gov.br/not/bancodenoticias/Not_599074.asp>. Acesso em: 17/06/2010.

 

ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE MINAS GERAIS. MPMG obtém na Justiça liminares contra mineradoras que atuam em Congonhas. Abril/2012. Disponível em: http://www.mp.mg.gov.br/portal/public/noticia/index/id/34146. Acesso em: 10/08/2012. 

 

 ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE MINAS GERAIS. Recurso de mineradora que atua em Congonhas é negado pela Justiça. Maio/2012. Disponível em: http://www.mp.mg.gov.br/portal/public/noticia/index/id/35819. Acesso em: 10/08/2012.

 

ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE MINAS GERAIS. Vale, Namisa e CSN são multadas em quase 10 milhões por descumprirem decisão judicial. Junho/2012. Disponível em: http://www.mp.mg.gov.br/portal/public/noticia/index/id/36620. Acesso em: 10/08/2012.

 

CABIDO, A. C. Perspectivas de Desenvolvimento do Alto Paraopeba. Prefeitura Municipal de Congonhas Palestras. Disponível em: http://www.congonhas.mg.gov.br/?pg=palestras. Acesso em: Jun. 2012.

 

CODAP. Alto Paraopeba, um dos maiores pólos de desenvolvimento do país. Revista CODAP. n. Maio 2010a.

 

MILANEZ, B. Grandes minas em Congonhas (MG), mais do mesmo? In: Recursos Minerais & Sustentabilidade Territorial. Vol. I Grandes Minas. Org.: REGO, F. et al. Nov. 2011.