ÚLTIMA ATUALIZAÇÃO

18/02/2024

ATORES ENVOLVIDOS

Vale ‐ BHP Billinton ‐ Samarco, Fundação Renova, Comunidades da bacia do Rio Doce, Ministério Público Estadual (MPMG e MPES), Ministério Público Federal (MPF), Comissão de Atingidos pela Barragem de Fundão (CABF), Movimento dos Atingido por Barragens (MAB), Cáritas Brasileira Regional Minas Gerais.

MUNICÍPIO

Mariana

CLASSIFICAÇÃO GERAL E ESPECÍFICA

Atividades Industriais (Mineração)

Atividades / Processos Geradores de Conflito Ambiental

Descrição do caso:
(população afetada, ecossistema afetado, Área atingida, histórico do caso)

 

Considerando a complexidade e a longevidade do desastre da Samarco no Rio Doce, o histórico do caso contido nesta ficha foi organizado em tópicos, cujo sumário é apresentado a seguir. 

Sumário

I - CONTEXTUALIZAÇÃO - O DESASTRE E SEUS EFEITOS

 

Acepções acerca do desastre

Efeitos do desastre sobre a saúde

Ser atingido: sofrimento social e violências

Desdobramentos institucionais e consequências do desastre

Licenciamento ambiental da Samarco

Contenção do vazamento dos rejeitos da barragem de Fundão

O programa de demissão voluntária da Samarco

Os rejeitos carreados até a hidrelétrica Risoleta Neves - Candonga

Os acordos e seus desdobramentos

Cadastramento dos atingidos de Mariana

Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo: questões relativas ao tombamento dos territórios

devastados, reassentamento e matriz de danos:

Patrimônio

Reassentamento

Bento Rodrigues

Paracatu de Baixo

Famílias da “roça”

Matriz de danos

Formas de resistência

Ocupação do Escritório da Fundação Renova

 

II - 4 ANOS DE DESASTRE: PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS DE OUTUBRO DE 2019 A MARÇO DE 2020

 

Volta das atividades da Samarco no complexo de Germano

Matriz de danos de Mariana

Judicialização do processo de reparação na bacia do rio Doce

Análise de riscos à saúde humana

Reassentamento

Pautas judicializadas em Mariana: novos núcleos familiares e parâmetros de

compensação:

Marco Temporal para a formação de novos núcleos familiares

Compensações

 

III - 6 ANOS DE DESASTRE: PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS DE MARÇO DE 2020 A NOVEMBRO DE 2021

 

Indenização na bacia do rio Doce

Prescrição e cadastro em Mariana

Reassentamento

Alimentação animal

Assessorias técnicas 

Processos contra a Fundação Renova

Negociação da repactuação no Conselho Nacional de Justiça (CNJ)

 

IV - 7 ANOS DE DESASTRE: PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS DE NOVEMBRO DE 2021 A NOVEMBRO 2022

 

Repactuação

Barretos

 

V - 8 ANOS DE DESASTRE: PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS EM 2023

 

Continuidade das disputas pelo cadastramento dos atingidos em Mariana

Repactuação

Processo de Mariana passa a fazer parte da 4ª Vara Federal

Ações na Inglaterra

Campanha "Revida Mariana"

Processo Criminal 

Entregas nos reassentamentos

Encerramento do Sistema Indenizatório Simplificado

Ameaça de finalização dos trabalhos da Cáritas

Atividades dos 8 anos

 

VI - REFERÊNCIAS

 

 

 I. CONTEXTUALIZAÇÃO - O DESASTRE E SEUS EFEITOS

No dia 05 de novembro de 2015, rompeu-se a barragem de Fundão, localizada no município de Mariana (MG). Fundão era uma das barragens de rejeitos da exploração de minério de ferro da empresa Samarco Mineração S.A., cujo capital é controlado paritariamente pela Vale S.A. e BHP Billiton Brasil Ltda. O desastre, considerado “um dos maiores do mundo em termos de sua abrangência socioambiental” (ZHOURI et al, 2016a), liberou cerca de 50 milhões de metros cúbicos de resíduos minerários, ou “lama”, que percorreu cerca de 600 Km ao longo da bacia do Rio Doce, abrangendo os estados de Minas Gerais e Espírito Santo, passando por 41 municípios até chegar ao Oceano Atlântico. O desastre provocou de imediato a perda de 19 vidas humanas, milhares de vidas de animais, bens materiais, como casas, carros, móveis, benfeitorias, objetos pessoais e afetivos e afetou drasticamente o território dos povoados de Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo, Camargos, Bicas, Ponte do Gama, Paracatu de Cima, Pedras e Campinas, no município de Mariana, bem como Barreto e Gesteira, pertencentes a Barra Longa, cuja sede municipal também foi afetada pelos rejeitos. “O comprometimento da vida do Rio Doce até o litoral do estado do Espírito Santo ocasionou ainda significativos danos à qualidade da água naquela bacia hidrográfica, fonte de abastecimento e de produção de alimentos para milhões de habitantes” (ZHOURI et al, 2017).

Centenas de famílias, em sua maioria das comunidades de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, foram deslocadas compulsoriamente, passando a viver na cidade de Mariana. Inicialmente, as famílias atingidas foram alojadas em ginásios poliesportivos;em seguida, foram transferidas para hotéis e, após alguns meses, alocadas em casas alugadas em diferentes pontos da cidade, onde permanecem vivendo. Essas famílias perderam suas referências, seu território como base de sustentação de seus modos de vida e de sua existência, hortas, quintais, lugares de memória, criações, relações de vizinhança, referências, para muitos, de toda uma vida centrada no lugar. 

Com o rompimento da barragem, o Rio Doce foi assoreado, teve matas ciliares destruídas, além da morte de diversas espécies da fauna e da flora. Segundo laudo técnico do IBAMA (IBAMA, 2015), o rio foi contaminado por metais pesados e componentes com potencial tóxico como Alumínio (Al), Bário (Ba), Cálcio (Ca), Chumbo (Pb), Cobalto (Co), Cobre (Cu), Cromo (Cr), Estanho (Sn), Ferro (Fe), Magnésio (Mg), Manganês (Mn), Níquel (Ni), Potássio (K), Sódio (Na), comprometendo as atividades pesqueiras e agropecuárias de toda a área afetada. Além disso, em Governador Valadares e outras cidades próximas, mais de 300 mil habitantes tiveram problemas com a água para consumo, devido ao contato da lama com os cursos hídricos que abastecem os municípios.

A lama com rejeitos de minério vindos através do Rio Doce também atingiu o estado do Espírito Santo, passando inicialmente pelos municípios de Baixo Guandu, Colatina e Linhares, chegando à foz, na vila de Regência Augusta, no dia 21 de novembro de 2015, dezesseis  dias após o rompimento da barragem. Com a chegada da lama, a população dos povoados de Regência, Areal, Entre Rios e Povoação,  localizados no município de Linhares/ES, se viu profundamente afetada pelo desastre, principalmente pelo fato de que se trata de uma região que tem na pesca, na agricultura e no turismo, e inclusive na prática de surf, suas principais atividades econômicas. Ademais, o comprometimento do abastecimento de água afetou e continua afetando todos os moradores da região.

As comunidades localizadas adjacentes à foz do Rio Doce, principalmente nos municípios de São Mateus e Aracruz, também foram severamente afetadas pelo derrame de rejeitos, tendo suas atividades laborais interrompidas e modos de vida comprometidos. Não obstante, o reconhecimento institucional dessas áreas enquanto atingidas não foi imediato e demandou um intenso processo de luta e mobilização dos atingidos.

Em nota técnica elaborada em fevereiro de 2017, o ICMbio e o Projeto Tamar informaram que a pluma de rejeitos da Samarco “atingiu com diferentes intensidades e concentrações toda a região costeira do estado do Espírito Santo, sendo que a área compreendida entre o município de Serra e a divisa com o estado da Bahia foi a mais atingida” (Nota técnica nº 3/2017/ Vitória ES/TAMAR/DIBIO/ICMBio). A nota afirma ainda que todas as comunidades pesqueiras localizadas na área abrangida pela lama de rejeitos, ou que realizam atividade de pesca nesta área foram, portanto, atingidas. A despeito dos  direitos dos atingidos, muitos moradores das regiões afetadas no estado do Espírito Santo continuam até hoje sem receber o auxílio emergencial.

 

ACEPÇÕES ACERCA DO DESASTRE

Faz-se necessária uma compreensão do desastre como algo que transcende o rompimento da barragem de rejeitos, ou seja, o “evento catastrófico que o deflagra” (ZHOURI et al, 2016a, 2016b, 2017). Esta acepção do desastre nos remete a questões relacionadas a escolhas políticas, sociais e econômicas, que vão desde a localização geográfica dos empreendimentos minerários à própria opção pela construção de barragens para deposição dos rejeitos de minério (ZHOURI et al, 2017). Trata-se de um processo bastante complexo e multiescalar, que envolve um cenário global de reprimarização da economia, com destaque para a exploração dos territórios de países latinoamericanos em grandes projetos de desenvolvimento. Soma-se a isso a flexibilização da legislação ambiental, bem como da fiscalização de empreendimentos que oferecem grandes riscos às populações cujos territórios e cujas vidas são vulnerabilizadas em decisões que ocorrem à sua revelia. Outros aspectos devem ser considerados, como a redução de custos de operação, segurança e infraestrutura de empreendimentos minerários, relacionados às oscilações do mercado global de commodities. Estes são apenas alguns fatores relacionados a esse processo que envolve um desastre dessa magnitude. Assim, como o desastre não se inicia com o evento catastrófico, ele não termina com a passagem dos rejeitos pelos territórios. O desastre prolonga-se no tempo, produzindo, dentre outras situações, o “sofrimento social dos atingidos” (ZHOURI et al, 2017). Ainda de acordo com ZHOURI et al (2017), trata-se de um “desastre sociotécnico” termo utilizado para enfatizar “um processo deflagrado para além de uma falha meramente técnica, remetendo-nos assim às falhas da governança ambiental, produtoras de novos padrões de vulnerabilidade que expuseram, de fato, a população a uma situação de risco” (Ibidem).

 

EFEITOS DO DESASTRE SOBRE A SAÚDE

Um dos fatores que demonstra a perpetuação do desastre ao longo do tempo e do espaço são seus efeitos sobre a saúde física e mental de milhares de pessoas ao longo da bacia do Rio Doce, a curto, médio e longo prazo. Um exemplo bastante significativo é a poeira de rejeitos que gera diversos problemas à saúde, em Barra Longa, cidade localizada próxima ao encontro dos rios Gualaxo e Carmo, e onde ficou depositado  grande volume de rejeitos. Os moradores padecem pelo aumento dos casos de problemas gastrointestinais (diarreia, vômitos, dor abdominal) dermatológicos (dermatites inespecíficas), oculares (conjuntivites inespecíficas) e respiratórios (rinites, exacerbação de crises de asma) (RODRIGUES et al, 2016). Dados da rede municipal de saúde também apontam aumento exponencial nos casos de dengue  e outras epidemias nesta região. Em uma das visitas técnicas da equipe do GESTA ao município, em 2016, uma moradora contou que sua filha de pouco mais de um ano sofria com sérios problemas alérgicos e respiratórios e necessitava de medicações e atendimentos médicos constantes. A despeito de laudos médicos que apontavam como um dos fatores preponderantes desses problemas de saúde a qualidade do ar - contaminado pela poeira de rejeitos -, essa moradora de Barra Longa, à época, lutava por seu reconhecimento enquanto atingida. Logo após o rompimento da barragem, a Samarco informou em diferentes notas (aqui e aqui), que o rejeito não traz riscos à saúde, sendo classificado como inerte e não perigoso pela norma brasileira NBR 10.004. Assim, apenas medidas paliativas foram tomadas para minimizar os danos em Barra Longa, como por exemplo,  orientações aos moradores quanto ao uso de panos molhados e bacias de água nas casas. Além disso, a empresa reiterou a lavagem das ruas diariamente, para minimizar a poeira.

Apesar de muitas solicitações por parte dos atingidos, as informações da empresa quanto à qualidade da água e ao risco advindo da presença dos rejeitos nos cursos hídricos, solo e ar, são vagas e insuficientes. Questiona-se sobre a presença de metais pesados (dentre eles arsênio, chumbo, manganês, mercúrio, cádmio, cobre e zinco) prejudiciais à saúde e seus possíveis efeitos nas pessoas e animais expostos. Alega-se que é preciso uma avaliação de uma longa série histórica de dados, por exemplo, para afirmar se o consumo de vegetais plantados na área afetada pela lama oferece riscos à saúde. Enquanto isso, as pessoas que vivem nessas áreas sofrem com o descaso, as dúvidas e o medo de viver em seu próprio território. Um estudo do Instituto de Biofísica da UFRJ realizado com o apoio do Greenpeace (2017) aponta para a contaminação da água por metais pesados, a exemplo do níquel (aqui). Queixas de moradores de Barra Longa corroboram este quadro, conforme noticiado pelo MAB em 26 de março de 2018 (aqui).

Efeitos do desastre sobre a saúde mental das populações afetadas também vêm sendo discutidos por pesquisadores, Ministério Público, assessoria técnica dos atingidos (em Mariana e Barra Longa), dentre outros. De acordo com a Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares, “os impactos psicossociais são múltiplos e reverberam ao longo do tempo, a partir da dinâmica de cada comunidade atingida” (RODRIGUES et al, 2016). O sofrimento psicossocial se relaciona às inúmeras perdas materiais e simbólicas, como casas, objetos pessoais e afetivos, vínculos, modo de reprodução social, dentre outras. Destacam-se ainda as perdas das atividades econômicas,  que além de gerarem o sustento familiar, eram esteios das identidades de diversas pessoas. É significativo por exemplo o caso dos pescadores afetados pelo desastre, que perderam as condições de trabalho, autonomia e dignidade, bem como a relação com o rio, dependendo agora de um cartão da empresa, muitas vezes insuficiente e gerador de múltiplas formas de sofrimento.

Os efeitos do desastre sobre a saúde continuam em andamento e apresentam novas facetas ao longo do tempo, sem que seja possível prever futuras repercussões. Periodicamente,  atualizamos esta ficha adicionando alguns dos novos desdobramentos. Sobre as afetações na saúde humana, sugerimos ver o tópico “ANÁLISE DE RISCOS À SAÚDE HUMANA” e materiais complementares relacionados.

 

SER ATINGIDO: SOFRIMENTO SOCIAL E VIOLÊNCIAS

O tratamento institucional dado aos atingidos por parte da empresa e das instituições do Estado constitui um dos principais fatores que engendram o sofrimento social dos afetados pelo desastre. Em Mariana, moradores dos distritos rurais de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo foram acomodados no dia seguinte ao rompimento da barragem em hotéis da cidade, onde se tornaram alvo de instâncias diversas que se apresentaram como mediadores entre a empresa e os atingidos, a exemplo dos comitês de mediação promovidos pela prefeitura de Mariana. “Nesse contexto, passaram a lidar com a desinformação, os boatos, os assédios, as desconfianças, as difamações, as brigas, os medos e as tensões, típicos da formação e atuação das organizações de representação” (ZHOURI et al, 2016, p.38).

O ato de alojar os desabrigados em hotéis espalhados pela cidade e, posteriormente, em casas alugadas, distantes umas das outras, trouxe problemas também para a articulação dos atingidos, além de afetar suas relações de vizinhança e parentesco. “Mesmo lidando com o trauma do desastre, elas foram obrigadas, sem tempo de preparo, a formarem comissões representativas e aprenderem estratégias de diálogo e de negociação” (ZHOURI et al, 2016, p.38). Os atingidos tiveram que participar de um cronograma de reuniões semanais, de segunda a quinta-feira, para “negociar” com a empresa Samarco e também para se organizarem enquanto grupo mobilizado na cobrança de seus direitos, um processo extremamente exaustivo. Uma das consequências desta exaustiva rotina de reuniões quase diárias foi o esvaziamento das mesmas e o crescente sentimento de impotência e do não ressarcimento de todos os direitos dos afetados pelo desastre como um fato. De acordo com ZHOURI et al (2017, p. 33-34):

a vivência do desastre como “atingido” transforma-se também na experiência duradoura de linguagens, espaços e tempos alheios, alienados, dados pela submissão ao aluguel e ao “cartão-benefício”fornecido pelas empresas, pela sujeição ao poder deliberativo das instâncias jurídicas e corporativas e, sobretudo, pela espera que se constitui um estado de permanente angústia e frustração.

 

O desastre provocou destruição ambiental, social, simbólica e tantas outras perdas incomensuráveis que multiplicam-se e acumulam-se ao longo do tempo entre os sujeitos afetados e seus territórios. O desastre perpetua o sofrimento social dos afetados,  e as tentativas de reparação são insuficientes e insatisfatórias, encaminhadas através de um processo decisório que envolve a disputa por direitos. Enquanto isso, as vítimas continuam convivendo com as incertezas e com o preconceito dos próprios moradores de Mariana que, muitas vezes, atribuem a culpa do desemprego e da crise na cidade às principais vítimas deste desastre.

Sugestões de leitura:

E-book “Mineração, Violências e Resistências (ZHOURI et al, 2017).

BARBOSA, Ilklyn (2018). “Pra mostrar pra eles que nós precisamos é de lá, não daqui”: rituais de resistência como novas formas de narrar e vivenciar o desastre no rio Doce. Monografia.

DE LIMA, Maryellen Milena (2018). “Aqui no é o nosso lugar”: efeitos socioambientais, a vida provisória e o processo de (re)construção de Paracatu de Baixo, Mariana/MG. Monografia.

SILVA, Jessica Lorrany de Jesus (2019). Mineração como forma de vida e morte. Entre a dependência e o desastre em Mariana - MG. Monografia.

NOGUEIRA PEREIRA, Ana Beatriz (2019). “Sentir o calor da terra, pra sentir que a gente está vivo”: memória, identidade e territorialidade na vivência cotidiana do desastre da Samarco”. Dissertação.

 

 

DESDOBRAMENTOS INSTITUCIONAIS E CONSEQUÊNCIAS DO DESASTRE

Ainda em novembro de 2015, mês do rompimento da barragem, deu-se início a uma série de acordos entre a mineradora Samarco e órgãos de Estado, além de exigências e limitações feitas pelo órgão ambiental à empresa, como a suspensão de sua licença de atuação, em 09/11/2015. Dentre os acordos preliminares, estavam o pagamento de uma caução socioambiental de 1 bilhão de reais, a ser paga em dez dias a partir de 16/11/2015; o aluguel de casas ou o pagamento de hotel para as famílias desabrigadas; e o pagamento de multa, dentre outras medidas. Embora tais acordos tenham sido assumidos, diversos moradores reclamavam, um mês após o desastre, quanto à demora ou descumprimento das suas obrigações para com os atingidos. Diversos órgãos internacionais, como a ONU, condenaram o desastre, ressaltando a necessidade da participação do Estado na mediação dos conflitos e no diálogo com os atingidos.

A discussão sobre a responsabilização do desastre, nos primeiros meses, foi um assunto recorrente. Enquanto a Vale S.A. não se assumia como responsável, classificando ainda como “precipitadas” as manifestações do Ministério Público Estadual que ajuizara  ação civil pública contra as três empresas (Vale, Samarco e BHP Billiton), alegando que as causas do desastre “ainda não haviam sido solucionadas”, a presidenta Dilma Rousseff, durante a abertura da 21ª Conferência das Nações Unidas sobre mudanças climáticas (COP21), em 30/11/2015, condenava a empresa publicamente, dizendo que “estamos reagindo a um desastre por medida de redução de danos, apoio às populações atingidas, prevenção de novas ocorrências e também punindo severamente os responsáveis por essa tragédia" (UOL, 2015). Ao mesmo tempo, em sua visita ao Brasil em 2015, a ONU condenou tanto as empresas como o governo, afirmando que ambos possuem responsabilidade sobre o desastre, acentuando que a tragédia foi consequência de um crime (UOL, 2015).

Diversas investigações foram  e ainda estão sendo feitas pelo Ministério Público Federal, Polícia Civil MG, Polícia Federal e pela própria Samarco junto à auditoria internacional Cleary Gottlieb Steen & Hamilton LLP. Segundo a promotoria integrante do grupo de força-tarefa articulado pelo Ministério Público para apurar as causas do desastre, houve fraude de documentos para manter a barragem de Fundão ativa. A Polícia Federal em suas investigações concluiu que foram feitos desvios das despesas originalmente destinadas à barragem na intenção de beneficiar os investimentos voltados para a elevação da produção de minério pela Samarco. O relatório produzido pela Samarco com a auditoria internacional Cleary Gottlieb Steen & Hamilton LLP (disponível aqui), concluiu que a presença de lama no ponto de ruptura da barragem, onde deveria haver somente areia, foi um elemento-chave para romper a estrutura.

O debate sobre as consequências socioambientais do desastre também foi intenso durante os primeiros três meses. Estudos foram realizados por diversas instituições, públicas, privadas, e organizações não-governamentais. Relatórios sobre a qualidade da água, sobre a mortandade de peixes, sobre a ameaça de extinção de diversas espécies e sobre as condições de trabalho dos funcionários da Samarco foram divulgados. Nenhum agente foi designado responsável definitivo por determinar os danos; em consequência,  se estabeleceu uma disputa de laudos entre os produzidos pelas próprias empresas através da Fundação Renova, os de experts do Ministério Público (como LACTEC), as assessorias técnicas dos atingidos nos territórios em que esse direito foi efetivado, assim como por outras instituições públicas. A guerra de laudos contribui para aprofundar o desastre e as incertezas que produzem sofrimento.

 

LICENCIAMENTO AMBIENTAL DA SAMARCO

As discussões sobre as licenças necessárias para a operação da empresa e sobre a política ambiental também se acentuaram. De acordo com a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD), a Licença de Operação (LO) da barragem de Santarém estava vencida desde 25 de maio de 2013. Na mesma situação estava a Mina do Germano, outra estrutura do mesmo complexo, que estava com a LO vencida desde 27 de julho de 2013. Segundo a SEMAD, a empresa protocolou um pedido de renovação desta licença antes do prazo do vencimento. Contudo, o pedido permaneceu em análise na Superintendência Regional de Regulação. Ainda no processo de licenciamento, em 2007, houve pressão por parte da Samarco para que a licença da barragem do Fundão fosse concedida antes da conclusão da obra, havendo ainda problemas estruturais na barragem, como pressão excessiva. Após o rompimento, ainda em dezembro de 2015, depois do surgimento de diversas notícias sobre irregularidades nas obras, o Ministério Público Federal (MPF) abriu um inquérito para investigar servidores públicos de Minas Gerais que concederam as licenças para a empresa Samarco.

É importante ressaltar que o desastre aconteceu seis semanas após o encaminhamento, em regime de urgência, do Projeto de Lei – PL 2.946/2015 pelo Governador Fernando Pimentel à Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O PL aprovado propôs a alteração radical do sistema e da política ambiental de Minas Gerais com o intuito de “destravar” e agilizar licenciamentos, dificultando a participação de populações atingidas pelos empreendimentos. Cite-se ainda a criação da Superintendência de Projetos Prioritários (SUPPRI), no âmbito da SEMAD, para licenciar, a portas fechadas, projetos públicos e privados tidos como “de relevância” para o desenvolvimento social e econômico do Estado ou para a proteção ou reabilitação do ambiente.

 

Sobre a licença para a retomada das operações, sugerimos ver o tópico “VOLTA DAS ATIVIDADES DA SAMARCO NO COMPLEXO DE GERMANO” desta ficha.

 

CONTENÇÃO DO VAZAMENTO DOS REJEITOS DA BARRAGEM DE FUNDÃO

Em abril de 2016, passados cinco meses do rompimento da barragem, os rejeitos de Fundão ainda vazavam pela bacia do Rio Doce. Diante disso, o Poder Judiciário de Minas determinou que a empresa contivesse os vazamentos, com previsão de multa de 1 milhão de reais por dia, após o dia 20/04/16, prazo final para a resolução do problema. No entanto, um parecer técnico elaborado pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), enviado à Justiça de Minas no dia 26/04/16, apontava que a lama não havia parado de poluir o rio e recomendava a aplicação da multa. Ademais, as construções dos diques S1-A, S2-A e S3 para solucionar os problemas de instabilidade da retenção dos rejeitos foram insuficientes, pois, apesar de melhorar um pouco a qualidade da água, não impediam o carreamento dos sedimentos na bacia. Com relação a isso, a Samarco propôs a construção do dique S4, alagando parte importante do território de Bento Rodrigues. A empresa alegou que esta seria a única forma de impedir que os rejeitos da barragem voltassem a atingir a Bacia do Rio Doce durante o período chuvoso. No dia 21 de setembro de 2016, o governo de Minas Gerais autorizou a mineradora a iniciar a construção do dique, que foi apresentado pela Samarco à SEMAD como medida emergencial até a definição sobre o destino do território de Bento Rodrigues. O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) protocolou uma ação civil na 1ª Vara de Mariana/MG  solicitando que a mineradora apresentasse um estudo que demonstrasse a real necessidade da construção do dique S4 em Bento Rodrigues. No início de 2017,  a Samarco afirmou ter concluído as obras de contenção de rejeitos, com as estruturas finalizadas da Barragem de Nova Santarém e do dique S4, na área de Bento Rodrigues. Os atingidos de Bento Rodrigues se posicionaram contra o alagamento de parte do território, porém, suas reivindicações não foram consideradas e atualmente grande parte do distrito com terrenos ainda pertencentes às famílias de Bento Rodrigues se encontra submersa.

 

O PROGRAMA DE DEMISSÃO VOLUNTÁRIA DA SAMARCO

Outro assunto que teve muita repercussão foi o desemprego, fruto de uma relação histórica de exploração e dependência da atividade minerária. Alguns movimentos de moradores, associações e comerciantes locais, principalmente, na região de Mariana, pediram a volta das atividades da Samarco. Integrantes do movimento “Justiça sim, desemprego não”, por exemplo, chegaram a fazer um abaixo-assinado com cerca de 16 mil assinaturas com a intenção de pressionar para que a mineradora voltasse a operar no município.

Alegando não ter mais condições de manter todos os trabalhadores, uma vez que não estava operando, a Samarco acatou a proposta feita pelos Sindicatos que representam os funcionários da mineradora e adotou o Programa de Demissão Voluntária (PDV). A intenção da empresa era demitir 1,2 dos 3 mil funcionários em Minas Gerais e no Espírito Santo. O prazo para os funcionários aderirem ao programa foi entre os dias 24 de junho e 29 de julho de 2016: 925 funcionários se inscreveram, e outros 153 foram demitidos involuntariamente. A partir de negociações com os Sindicatos, outro PDV foi colocado em curso a partir de novembro de 2017 e aproximadamente 600 funcionários foram desligados através do programa e por meio de demissões involuntárias.

 

OS REJEITOS CARREADOS ATÉ A HIDRELÉTRICA RISOLETA NEVES - CANDONGA

Outro aspecto do desastre foi que os rejeitos carreados pelo Rio Doce afetaram a estrutura da Hidrelétrica Risoleta Neves, mais conhecida como Candonga. A Samarco foi encarregada de fazer a dragagem dos rejeitos para limpar a Hidrelétrica. Próximo ao paredão da barragem de Candonga,  ficaram retidos 1,6 milhão de metros cúbicos de lama, o que levantou suspeita sobre o risco de rompimento desta hidrelétrica com a chegada das chuvas, hipótese que foi posteriormente descartada pelo Ibama. Entretanto, a mineradora Samarco não cumpriu o acordo estabelecido (que determinava a conclusão da limpeza da Hidrelétrica até dezembro de 2016) e foi multada em R$ 1 milhão, além de R$ 50 mil por dia de atraso na retirada da lama. 

 

OS ACORDOS E SEUS DESDOBRAMENTOS

Outra resposta institucional ao desastre partiu do ajuizamento de uma Ação Civil Pública (ACP) pela União, juntamente com os governos de Minas Gerais e Espírito Santo, contra a Samarco e suas proprietárias (Vale e BHP Billiton). O processo no 0069758-61.2015.4.01.3400, da ACP, foi ajuizado no dia 30 de novembro de 2015, em Brasília, na Justiça Federal da 1a Região e, posteriormente, deslocado para o foro de Belo Horizonte, para a 12a Vara Federal da Seção Judiciária de Minas Gerais.

No âmbito dessa ação foi firmado, no dia 02 de março de 2016, um acordo judicial através de um Termo de Transação de Ajustamento de Conduta (TTAC), que ficou conhecido como “Acordão”. Esse acordo foi construído sem a participação dos atingidos, o que evidencia estratégias assimétricas que podem fragilizar direitos, além de promover a resolução do conflito por meio de negociações, em busca de um consenso, deslocando o foco sobre a responsabilização das empresas pelo desastre. O TTAC previu, dentre outras coisas, 41 programas de reparação socioeconômica e socioambiental que deveriam ser executados por uma Fundação de direito privado, criada e mantida pelas empresas, sem fins lucrativos e com gestão independente, supervisionada por um Comitê Interfederativo (CIF) composto por representantes da União, dos governos dos estados de Minas Gerais e do Espírito Santo, dos municípios atingidos, e do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Doce (CBH-Doce).

A homologação do acordo foi feita em maio de 2016, pela Justiça Federal da 1a Região e, poucos dias após o anúncio, o Ministério Público Federal apresentou embargo à decisão, apontando falhas como a estipulação de um limite de gastos para a empresa sem qualquer justificativa para a quantia estabelecida e a criação de uma Fundação gerida pela empresa, que teria poder de decisão sobre as vítimas, supervisionada por um Comitê Interfederativo sem a participação de representantes dos atingidos em sua composição. No mesmo mês, o Ministério Público Federal moveu ação judicial em desfavor das empresas Samarco, Vale e BHP Billiton por danos sociais, econômicos e ambientais causados pelo rompimento da barragem, em que foram pedidos R$ 155 bilhões a título de ressarcimentos e indenizações. Além das empresas, foram processados a União e os Estados de Minas Gerais e o Espírito Santo e respectivos órgãos ambientais dos dois estados. Quatorze membros da cúpula administrativa da Samarco foram denunciados à Justiça pelo Ministério Público de Minas Gerais, acusados de omitir informações relacionadas ao risco proporcionado pelas barragens do complexo Germano, atrapalhando o desenrolar do trabalho dos órgãos do meio ambiente e do Ministério Público.

Em 2 de maio de 2016, após apresentar os resultados da investigação da Força Tarefa, o MPF ajuizou uma ACP[1] contra a União, os Estados de MG e ES, seus entes autárquicos e as três empresas, apontando os vícios do TTAC. Porém, nessa mesma semana,  o TTAC foi homologado pela coordenadora geral do SitCom, passando por cima das duas instâncias já encarregadas do caso: a 12a Vara e a 5a Turma do Tribunal Regional Federal (TRF) 1. Finalmente, em julho de 2016,  a homologação foi suspensa pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) por conflito de competência, uma vez que as decisões no âmbito da Ação Civil Pública em questão só poderiam ser tomadas pela 12a Vara Federal da Seção Judiciária de Minas Gerais. O caso voltou à 5a Turma do TRF 1, que em 17 de agosto de 2016 declarou a nulidade da homologação. Com isso, os processos judiciais contra as empresas não foram extintos, porém começou a negociar-se a reformulação do TTAC, agora com o MPF participando das discussões[2].

Porém, no fim de julho,  as empresas  haviam criado a Fundação Renova que, a partir de 02 de agosto de 2016, começara a atuar como responsável pelas medidas de gestão do desastre que vinham sendo feitas pela própria Samarco.

Com a nulidade da homologação do TTAC e a Ação Civil Pública 69758-61.2015.4.3400 para ser julgada pela 12ª Vara Federal da Seção Judiciária de Minas Gerais, a juíza Rosilene Maria Clemente de Souza Ferreira, responsável pelo Núcleo de Conciliação da 12ª Vara Federal em Belo Horizonte, providenciou alguns despachos de retorno de inúmeras Ações Civis Públicas impetradas por diversas comarcas regionais, como a Ação impetrada pelo Ministério Público Estadual da Comarca de Mariana, por exemplo, para que fossem resolvidas em suas respectivas localidades. O intuito era dar maior agilidade  à distribuição de competências e se dedicar exclusivamente às Ações do Ministério Público Federal.

Desde então, a reparação do desastre em Mariana é gerida no contexto da ACP impetrada na Comarca local, enquanto o restante da bacia do Rio Doce está sujeito às negociações para reformular o “Acordão”. O modo que os processos jurídicos locais interagem com os acordos gerais sobre a bacia nos territórios específicos é complexo, sujeito a controvérsias, e continua aberto para a análise.

No dia 13 de setembro de 2016,  ocorreu a primeira reunião de conciliação, após a anulação da homologação do “Acordão”. À mesa de negociação sentaram-se apenas as empresas rés no processo, o procurador do Estado de Minas Gerais, representantes da Advocacia Geral do Estado e da União e membros da força tarefa do Ministério Público Federal. A participação dos atingidos e entidades assessoras  ficou  limitada a um acompanhamento na plateia, sem direito à manifestação. Algumas tratativas iniciais foram estabelecidas, como a contratação de perícias e auditorias, bem como a realização de audiências públicas e a possibilidade de contratação de assessoria técnica para os atingidos do município de Barra Longa.

Após a anulação da homologação do TTAC (o “Acordão”), o Ministério Público Federal (MPF) firmou com Samarco, Vale e BHP, em 18 janeiro de 2017, o Termo de Acordo Preliminar (TAP). Como uma tentativa de contornar falhas do acordo anterior, esse previu a criação de uma reserva no valor de R$ 200 milhões para a reparação dos danos socioeconômicos e socioambientais na região do município de Barra Longa (MG), além da contratação de quatro organizações - a Ramboll Group A/S, para avaliar e monitorar os Programas de Reparação Socioambiental e Socioeconômica executados pela Fundação Renova, o Instituto Lactec para fazer o diagnóstico socioambiental, a Integratio Consulting para o diagnóstico socioeconômico e assistência aos atingidos, e o Banco Mundial para coordenar os trabalhos das outras três empresas, em parceria com o MPF. Entretanto, a Integratio não foi aceita pelos atingidos por já haver prestado serviços à Vale, então o Eixo Socioeconômico precisou ser rediscutido.

No dia 10 de março de 2017, um Workshop realizado pelo Ministério Público Federal e pelo Ministério Público Estadual de Minas Gerais constituiu um Grupo de Trabalho formado por entidades (grupos de pesquisa e entidades da sociedade civil) envolvidas em atividades de pesquisa, extensão e assessoria às vítimas do desastre para a elaboração do Termo Aditivo para o Eixo Socioeconômico do Termo de Acordo Preliminar (TAP). O TAP foi parcialmente homologado pela 12ª Vara da Justiça Federal de Minas Gerais no dia 16 de março de 2017, enquanto o GT seguiu ativo até a assinatura do aditivo no dia 16 de novembro de 2017. O Termo Aditivo ao TAP previu a disponibilização de assessoria técnica aos atingidos(as) em toda extensão da bacia do Rio Doce (com metodologia a ser definida pelo Fundo Brasil de Direitos Humanos), mas o juiz titular da 12ª Vara Federal também acrescentou ao Termo Aditivo Preliminar modificações controversas, como a cláusula 7.3, a qual determina que “fica expressamente vedada a vinculação político-partidária, a movimentos sociais, ONGs e entidades religiosas no processo de escolha das entidades que devem prestar o serviço [de assessoria técnica dos atingidos (BRASIL, 2018a, p. 9). Foi prevista também a realização de um diagnóstico socioeconômico (sob a responsabilidade da Fundação Getúlio Vargas). Entretanto, por existirem conflitos de interesses entre a Vale e a FGV, no dia 26 de janeiro de 2018 a Fundação Getúlio Vargas foi impedida pelo Ministério Público das Fundações do Rio de Janeiro de executar o diagnóstico. Segundo a promotoria do MPRJ, a Vale integra o Conselho de Curadores da FGV desde 2011, o que “configuraria um evidente alinhamento de interesses”.

No dia 08 de agosto de 2018 foi homologado o Termo de Ajustamento de Conduta, chamado de TAC Governança, com objetivo de alterar o sistema de governança dos programas de reparação estabelecidos anteriormente pelo TTAC, visando torná-lo mais participativo. O acordo confirmou a Fundação Renova como executora dos programas socioambientais e socioeconômicos, e confirmou também a contratação da Fundação Getúlio Vargas para atuar como expert do eixo socioeconômico. Além disso, previu a criação de mais três instâncias externas: um Fórum de Observadores formado por representantes da sociedade civil, de grupos acadêmicos, das pessoas atingidas e dos povos e comunidades tradicionais atingidos, sem poder deliberativo; Comissões Locais formadas pelas pessoas atingidas para representar a coletividade dos atingidos de cada município; e Câmaras Regionais formadas por pessoas atingidas indicadas pelas respectivas Comissões Locais para compor fóruns de discussão com a Fundação Renova. A composição do Comitê Interfederativo (CIF) foi alterada e passou a incluir, com direito a voz e voto, 01 (um) técnico indicado pela Defensoria Pública e 03 (três) pessoas atingidas para representar toda a bacia do rio Doce ou técnicos por elas indicados. Também foi estabelecida a criação de Câmaras Técnicas pelo CIF, como órgãos técnico-consultivos. Dentre outras coisas, o TAC Governança também alterou a estrutura interna da Fundação Renova. O Conselho de Curadores passou a ser  composto por 02 (dois) atingidos indicados pelas Câmaras Regionais (ou técnicos escolhidos por eles), 01 (um) membro indicado pelo CIF, e 06 (seis) membros indicados pelas empresas, sendo que “as decisões do Conselho de Curadores serão tomadas pelo voto favorável de, pelo menos, 05 (cinco) de seus membros” (Termo de Ajustamento de Conduta, 2018, Parágrafo Décimo Primeiro). O Conselho Consultivo da Fundação passou a ser composto por 04 (quatro) membros indicados pelo Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Doce (CBH-Doce), 07 (sete) pessoas atingidas de toda a bacia, 02 (dois) representantes de organizações não governamentais (sendo um indicado pelo CIF e outro pelo Ministério Público), 03 (três) representantes de instituições acadêmicas (sendo um indicado pela Fundação Renova, um pelo CIF e um pelo Ministério Público), 02 (dois) representantes de entidades atuantes na área de Direitos Humanos (sendo um indicado pelo Ministério Público e um pela Defensoria Pública), e 01 (um) representante de entidades atuantes na área de Desenvolvimento Econômico (indicado pela Fundação Renova).

Sugestão de leitura:

ZUCARELLI, Marcos Cristiano (2018). A matemática da gestão e a alma lameada: os conflitos da governança no licenciamento do projeto Minas-Rio e no desastre da Samarco. Tese.

 

Para acompanhar os desdobramentos desta questão, veja o tópico “JUDICIALIZAÇÃO DO PROCESSO DE REPARAÇÃO NA BACIA DO RIO DOCE”.

 

CADASTRAMENTO DOS ATINGIDOS DE MARIANA

O GESTA tem acompanhado em suas pesquisas e análises diversos aspectos associados ao desastre, dentre eles “a política das afetações que compreendem as classificações administrativas assim como as ações por elas engendradas e adotadas por parte do Estado e das empresas responsáveis pelo desastre.” (ZHOURI et al, 2017). Parte dessa política é o instrumento cadastral proposto pela empresa visando à identificação das vítimas e suas perdas, e que tem por objetivo embasar o processo de reparação.

O Programa de Levantamento e de Cadastro dos Impactados (PLCI) foi proposto pela Fundação Renova e a aplicação começou a ser realizada por uma empresa terceirizada, a Synergia, ao longo dos municípios afetados pelo desastre. Em uma análise aprofundada do PLCI, o GESTA identificou nesse documento uma série de questões problemáticas, como por exemplo:

as classificações e categorias adotadas, assim como a própria estrutura do instrumento cadastral e a lógica que o subjaz, [as quais] reforçam o controle da empresa sobre a definição e reconhecimento dos efeitos do desastre e, consequentemente, de quem é considerado “impactado” pelo rompimento da barragem, resultando em uma concepção subjacente de “atingidos inelegíveis”. (ZHOURI et al, 2017, p.51).

 

Em outubro de 2016, os atingidos de Mariana conseguiram na justiça o direito de suspender a aplicação do cadastro nessa cidade. Foi estabelecida então a criação de um Grupo de Trabalho para debater e negociar a "revisão" de grande parte do cadastro. O GT formou-se com a participação de atingidos, Assessoria Técnica da Cáritas* e profissionais contratados para este debate, Renova, Synergia, entre outros. A partir de sugestão da Cáritas, o Documento foi dividido em 5 partes para análise: (I) Perdas ou Danos Materiais, (II) Perdas ou Danos de Atividades Econômicas, (III) Perdas ou Danos de Bens Coletivos, (IV) Perdas ou Danos de Bens Imateriais e (V) Levantamento de Questões individuais e temas não contemplados nos módulos anteriores.

Em Janeiro de 2018, a Cáritas Brasileira Regional Minas Gerais, Assessoria técnica aos  atingidos e  atingidas  pela barragem  de rejeitos da Samarco (Vale e BHP Billiton) em Mariana-MG iniciou o processo de contratação de profissionais para começar o trabalho de aplicação do novo Cadastro. A equipe era constituída por cerca de 60 profissionais, quadro esse composto por especialistas de diversas áreas e formações, contando inclusive com atingidos como mobilizadores locais.

Após diversas audiências e reuniões em Grupos de Trabalho, foi homologado, no dia 02 de outubro de 2018, na comarca de Mariana, um acordo para orientar a negociação das indenizações aos atingidos no município. Dentre os pontos principais homologados no acordo,  esteve a instauração de uma nova ação, impedindo assim a prescrição do período legal para a interpelação judicial relativa à reivindicação de indenizações junto às empresas. Apesar de não deixar claro quais serão os parâmetros para a aferição dos danos, o acordo estabeleceu o ônus da prova como responsabilidade das empresas, bem como a obrigação das mesmas de realizarem a indenização e a reparação integral dos danos. Segundo o acordo, cada família poderia recorrer à proposta de indenização feita pela Fundação Renova, tendo como instrumento para tal um dossiê elaborado pela assessoria técnica (Cáritas) a partir do Cadastro e seus Instrumentos Complementares, tais como Cartografia Social, Vistorias Técnicas do Terreno e Tomada de Termo junto a cada núcleo familiar.

Diante do exposto, torna-se importante ressaltar que apesar das críticas direcionadas ao Programa de Levantamento e de Cadastro dos Impactados (PLCI) o instrumento de pesquisa original elaborado pela Synergia continuou sendo aplicado nas demais regiões afetadas no estado de Minas Gerais e Espírito Santo sem a justa revisão prevista pela medida judicial mencionada acima (restrita a Mariana). Sendo assim, os dados advindos do PLCI serviram para o processo de caracterização dos afetados e consequente adesão ao Programa de Indenização Mediada (PIM) da Fundação Renova. Conforme observado em campo e relatado pelos atingidos, ambos os programas citados padeceram pela falta de transparência e geraram constantes constrangimentos aos moradores ao caracterizá-los com perfil ou sem perfil de atingido.

Sugestões de leitura:

GESTA (2016). Parecer sobre o Cadastro Integrado do Programa de Levantamento e Cadastro dos Impactados (PLCI) elaborado pelas empresas Samarco e Synergia Consultoria Ambiental. Parecer Técnico.

ZUCARELLI, Marcos Cristiano (2018). A matemática da gestão e a alma lameada: os conflitos da governança no licenciamento do projeto Minas-Rio e no desastre da Samarco. Tese.

 * “A Cáritas Brasileira - Regional Minas é uma entidade de promoção e atuação social que trabalha na defesa dos direitos humanos. (...) Em Mariana a Cáritas coordena o projeto de Assessoria Técnica aos atingidos/as pela barragem de Fundão. A equipe de assessoramento técnico vem trabalhando desde outubro de 2016 em Mariana e tem como objetivos centrais: promover a reparação de direitos aos atingidos/as e garantir o acesso à informação e ampla participação de todos/as os/as atingidos/as nos processos de reconstrução, indenização e compensação.” (Extraído de “Jornal A Sirene, Ed. 12, março de 2017, disponível emhttps://issuu.com/jornalasirene/docs/a_sirene_mar__o_ed12_issuu”)

 

BENTO RODRIGUES E PARACATU DE BAIXO: QUESTÕES RELATIVAS AO TOMBAMENTO DOS TERRITÓRIOS DEVASTADOS, REASSENTAMENTO E MATRIZ DE DANOS

       Patrimônio

No dia 19 de abril de 2016,  foi realizada uma audiência pública para que os atingidos decidissem o destino dos territórios destruídos pela lama. Com o intuito de preservar a memória dos lugares foi decidido por unanimidade o tombamento, como Patrimônio Histórico, de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, junto ao Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Mariana (COMPAT). No dia 28 de abril do mesmo ano,  as duas localidades foram tombadas provisoriamente enquanto o processo seguiria em tramitação. No dia 1º de Maio de 2016,  em uma audiência pública junto às comunidades afetadas, o Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Mariana decidiu, por unanimidade, tombar as localidades de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo como Patrimônio Histórico, processo discutido entre órgãos municipais, Ministério Público e atingidos.

Vale destacar que a construção do Dique S4, que alagou parte do território de Bento Rodrigues, não foi submetida ao COMPAT, negligenciando a necessidade de aprovação pelo conselho. O que a Samarco fez foi o envio de uma notificação da construção da estrutura no território para a instituição,  em outubro, posterior ao decreto do governo de Minas que autorizou a construção do dique. Diante da situação, o COMPAT decidiu solicitar uma ação para que a Samarco fosse obrigada a submeter o projeto do Dique S4 à sua aprovação, no dia 14 de outubro de 2016. Porém, mesmo assim o Dique foi construído.

       Reassentamento

Os atingidos que moravam nas localidades de Paracatu de Baixo e Bento Rodrigues, diante das alternativas apresentadas pelas empresas, escolheram os terrenos em que serão reconstruídas as comunidades. No dia 7 de maio de 2016,  foi escolhido o local onde será a “Nova Bento Rodrigues”. A comunidade atingida, diante dos três terrenos propostos, escolheu com 92% dos votos o terreno de 350 hectares, conhecido como Lavoura, que se localiza a, aproximadamente,  9 quilômetros de Mariana. Já os moradores de Paracatu de Baixo escolheram no dia 03 de setembro de 2016 o terreno conhecido como Lucila, que se situa a aproximadamente 35 quilômetros de Mariana e 2,2 quilômetros do antigo subdistrito.

Os reassentamentos de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo  foram planejados pela Fundação Renova sob uma perspectiva urbanística, a despeito de se tratar de comunidades com modos de vida predominantemente rurais. Devido à legislação de uso e ocupação do solo contida no Plano Diretor do município, as áreas selecionadas tiveram que passar do status de “rural” para “urbano”. Assim, somente após esta alteração,  o “Plano Urbanístico” que possibilita a efetivação dos reassentamentos foi aprovado.

No dia 04 de novembro de 2017,  moradores de Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo e Gesteira se reuniram para reclamar da morosidade do processo, pois as famílias temem que o prazo não seja cumprido. Com isso, o Promotor da Comarca de Mariana, Guilherme Meneghin, ajuizou uma ação civil pública para que a Samarco cumpra o cronograma de reassentamento dos atingidos, sob multa de R$ 20 milhões por dia de atraso. Além disso, foi  pedida a intervenção judicial da empresa caso a Samarco não cumpra (G1, 04 nov.2017).

Em 2018, inciou-se a elaboração de “Diretrizes de Reparação do Direito à Moradia” de forma a garantir que as empresas cumpram com os acordos para o reassentamento. Na audiência do dia 06 de fevereiro de 2018,  foram homologadas algumas dessas diretrizes. A Comissão de Atingidos de Mariana, junto à Assessoria Técnica, encaminhou para a Fundação Renova, Samarco, Vale e BHP Billiton a contestação destas 82 diretrizes.

Mesmo após a criação de um GT Interdisciplinar mediado pelo MPMG, voltado especificamente para as questões ligadas ao reassentamento e no qual participam atingidos e sua assessoria técnica, Fundação Renova e empresas, ainda há pontos indefinidos e contestados pelas empresas. Ainda não há, por exemplo, por parte da Fundação Renova, garantia permanente de acesso à água para as atividades agrossilvopastoris no reassentamento, também não há garantia de cobertura das despesas adicionais e/ou novos custos advindos da mudança para o reassentamento (tais como tributos urbanos),  assim como não há garantia de acesso permanente à assessoria técnica destinada à retomada das atividades econômicas de turismo, comércio e serviço, entre  outras.

Na audiência ocorrida no dia 27 de junho de 2019, a juíza da Comarca de Mariana determinou que as decisões acerca dos processos de reassentamento serão decididas em audiências judiciais, com  o objetivo de acelerar e resolver o que está sendo tratado como conflito. Os reassentamentos familiares, que anteriormente eram discutidos coletivamente no GT Moradia, agora serão discutidos individualmente e judicializados caso a caso.  Alguns atingidos se mostraram insatisfeitos com a mudança, pois questões de ordem do reassentamento coletivo, como a estação de tratamento de esgoto (ETE) de Bento ou reconfiguração dos lotes, ficaram sem espaço de diálogo com a supressão dos GTs.

Inicialmente,  o prazo para a entrega dos reassentamentos de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo era março de 2019;  prazo estipulado pela própria Fundação Renova em seus meios de comunicação. Porém, em fevereiro de 2019,  a juíza titular da 2ª vara da Comarca de Mariana, responsável pelo processo, estipulou o dia 27 de agosto de 2020 como prazo final para a entrega dos reassentamentos e reconstruções, sob pena de uma multa diária  no valor de 1 milhão de reais em caso de atraso. Contudo, a Fundação Renova mais uma vez solicitou a postergação do prazo,  justificando atrasos que ela mesma causou (prazos para obtenção dos licenciamentos, mudanças nos projetos urbanísticos, lentidão mediante as decisões dos atingidos, entre outros) (JORNAL A SIRENE, ed. 46, fevereiro de 2020). Em audiência acompanhada pelo GESTA no dia 27 de junho de 2019 com a juíza da comarca de Mariana, Marcela Oliveira Decat de Moura, a pauta voltou a ser discutida. Com a questão do prazo para o reassentamento em aberto na mesa de negociações do Fórum até outubro de 2019, o embate ficou entre a proposta feita pela Cáritas, juntamente com os atingidos (as) e o Ministério Público, de que Bento Rodrigues e Paracatu sejam reassentadas até agosto de 2020, e de outro lado,  a proposta da Fundação Renova, de que o reassentamento de Bento Rodrigues aconteça até dezembro de 2020 e de Paracatu até junho do ano seguinte (2021). Sem acordo entre as partes, durante a audiência acompanhada pela equipe do GESTA no dia 29 de outubro de 2019, foi decidida a judicialização dessa pauta, ficando a determinação de prazo a critério do Poder Judiciário.

Sugestões de leitura:

CÁRITAS (2021a). Atrasos. Relatório de entrega dos reassentamentos. Mariana/ MG. (Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo e Comunidades Rurais). Fevereiro de 2021.

CÁRITAS (2021b). Relatório Técnico. Atraso na reparação do direito à moradia. Reassentamento de Paracatu de Baixo, Mariana/MG. Abril de 2021.

OLIVEIRA, Raquel; ZHOURI, Andréa; LOPO, Rafael e DE LIMA, Maryellen Milena (2020). Normas técnicas, cálculos (in)críveis e a incerteza irredutível: equivalências e suficiências contestadas na reparação de um desastre. Em: Antunes de Sant’Ana, Horácio & Rigotto, Raquel M. Ninguém bebe minério. RJ: 7Letras, pp. 74-104.

 

       Bento Rodrigues

O terreno da Lavoura que foi escolhido para a reconstrução do Bento pertencia à siderúrgica Arcelor Mittal, portanto, se trata de um vasto território com plantações de eucalipto, o que pode ter comprometido a qualidade do solo e da água. Além disso, a área abriga um aterro sanitário a céu aberto, o que também compromete as condições ambientais para possível aproveitamento agrícola posterior. Até julho de 2017,  a comissão de atingidos e a assessoria técnica não tinham acesso a estudos técnicos relativos aos danos ambientais na área.

O projeto urbanístico de Bento, realizado pela Fundação Renova, foi vetado pela SEMAD (Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, órgão licenciador) e CIF (Comitê Interfederativo) em julho de 2017. Com isso, os atingidos passaram novamente por uma série de oficinas para reajustar o projeto que invadia áreas de alta declividade e de Mata Atlântica, erros da “equipe técnica” especialmente contratada pela Fundação Renova. O Projeto Urbanístico deverá ser feito tendo em vista o reassentamento da comunidade na parte mais baixa do terreno.

No dia 22 de dezembro de 2017,  foi sancionado pela prefeitura de Mariana o projeto de lei que permite a urbanização da área rural da Lavoura. Requisito que atende o cumprimento da legislação do município podendo assim dar continuidade ao processo de reassentamento.

A supressão vegetal do terreno e a terraplanagem se iniciaram em setembro de 2018. Em outubro do mesmo ano, destacaram-se disputas em torno de três problemas levantados pelos atingidos no GT Interdisciplinar: (1) a alocação de famílias nos lotes previstos no reassentamento, que destoa da concepção da comunidade sobre si mesma; (2) a provisão de lotes para “novos núcleos familiares”, decorrentes de casos de moradores cujas casas encontravam-se em terrenos cedidos por outrem, casamentos, divórcios e assim por diante (a Fundação Renova insiste na criação de um ranking de prioridades para ocupação destes lotes); (3) a política tributária a ser aplicada ao novo Bento Rodrigues, uma vez que os atingidos denunciam a insustentabilidade da comunidade ante  a carga tributária urbana imposta ao reassentamento, a prefeitura de Mariana não pretende arcar com os subsídios dados a um novo zoneamento urbano e a Fundação Renova sugere que a política tributária aplicada à comunidade deve ser discutida na Câmara dos Vereadores em momento mais adequado,  ainda indefinido.

No dia 29 de julho de 2019,  foram iniciadas as obras da primeira casa do reassentamento de Bento Rodrigues (Jornal O Tempo, julho de 2019). O prazo inicial para entrega das casas (cerca de 255) era para 2019, postergado para agosto de 2020 e como mencionado acima, foi adiado novamente para o dia 27 de fevereiro de 2021.

 

       Paracatu de Baixo

O primeiro projeto de reassentamento de Paracatu de Baixo não considerava toda a comunidade. A empresa estava excluindo cerca de 20 famílias do distrito, em um jogo de conceitos que determinava quem era e quem não era atingido “diretamente”. Por exemplo, os habitantes considerados com “dupla moradia”, ou seja, que tinham residência em Paracatu, mas que devido à sua condição de trabalho, também residiam em Mariana, não estavam sendo considerados elegíveis ao reassentamento. Posteriormente, além do terreno de Lucila, para o reassentamento de Paracatu de Baixo foi necessária a aquisição de mais oito propriedades no entorno. Ademais, o processo de regularização cartorial (registro de compra e venda, registro de inventário) resultou em atrasos sucessivos. Até agosto de 2017,  apenas quatro dos nove terrenos haviam sido adquiridos, outros quatro estavam em processo de negociação e um vinha oferecendo impasses (Jornal A Sirene, agosto de 2017). Os moradores de Paracatu se recusaram a seguir com o processo de discussão do Projeto Urbanístico do reassentamento sem que os terrenos estivessem efetivamente adquiridos (Jornal A Sirene, agosto de 2017).

Desde a seleção do terreno de Lucila, os moradores, por conhecerem a área, alertavam sobre a escassez da água e condições do solo. Em novembro de 2017,  a SEMAD - Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais - apresentou dados que apontavam para inviabilidades técnica e ambiental para a construção da comunidade de Paracatu no terreno Lucila. Dentre os problemas ressaltados, figuravam a questão da disponibilidade hídrica (tanto no tocante ao consumo humano, quanto das práticas rurais), declividade do terreno, existência de áreas alagáveis e o tamanho do terreno, que ainda não é considerado suficiente para reassentar toda a comunidade. Seguem-se as incertezas.

Após a compra de terrenos vizinhos e com a escolha de algumas famílias para optar  pelo reassentamento familiar e/ou a compra assistida de terreno em outra localidade, o Projeto Conceitual do Reassentamento de Paracatu foi aprovado em assembleia dos atingidos, realizada no dia 13 de setembro de 2018, contando apenas com um voto contrário ao projeto apresentado pela Renova. Inicia-se, com isso, a redação e discussão do Projeto de Lei que permite a alteração do Plano Diretor do município de Mariana de modo a dar ensejo ao início das obras do reassentamento. No entanto, ainda permanecem dúvidas em relação à ocupação dos lotes planejados.

No mesmo 13 de setembro de 2018, a Câmara de Mariana aprovou um PL que prevê a criação de Áreas de Diretrizes Especiais (ADIES) no município, para dar conta do reassentamento. Ainda em setembro de 2018,  foi  levado à Câmara de Mariana um Projeto de Lei (PL) para alteração do Plano Diretor do município, com o objetivo de “criar e regulamentar a Área de Diretrizes Especiais de Paracatu de Baixo, para fins de implantação do reassentamento de interesse social deste subdistrito”, segundo a própria Secretaria de Obras de Mariana. O PL foi recebido com estranheza pelos vereadores e, com isso, foi encaminhado à Fundação Renova para que ajustes fossem feitos antes de ser novamente colocado em discussão e eventual aprovação.

Em 09 de outubro de 2018,  foi realizada uma reunião entre representantes da prefeitura de Mariana, Câmara dos Vereadores, Fundação Renova, Cáritas e Atingidos com o fim de apresentação e discussão da minuta do PL ajustado pela Renova, além de suscitar maior consenso entre os envolvidos sobre o projeto e sanar, de antemão, possíveis dúvidas, acelerando o processo de aprovação do Projeto pela Câmara. Supondo a criação de um zoneamento habitacional misto (rural e urbano), o PL levantou uma série de indagações relativas às concepções de como era e como deve ser Paracatu, os tipos de edificações admitidas e possibilidades de desenvolvimento futuro da comunidade. Além disso, a exemplo de Bento Rodrigues, levantaram-se preocupações sobre os novos tributos previstos.

No dia 07 de julho de 2019,  foi realizada a primeira missa da comunidade de Paracatu de Baixo,  no terreno da Lucila. O espaço que está destinado ao reassentamento da comunidade é bastante íngreme, com histórico de pastagem e plantação de eucalipto. Algumas placas foram colocadas para demarcar os lugares  onde serão construídas as ruas. Na parte plana foi construída a sede do canteiro de obras. Na estrutura maior será o refeitório dos funcionários que irão trabalhar nas obras, e foi nesse espaço que foi celebrada a missa.

Sugestões de leitura:

CÁRITAS (2021b). Relatório Técnico. Atraso na reparação do direito à moradia. Reassentamento de Paracatu de Baixo, Mariana/MG. Abril de 2021.

OLIVEIRA, Raquel; ZHOURI, Andréa; LOPO, Rafael e DE LIMA, Maryellen Milena (2020). Normas técnicas, cálculos (in)críveis e a incerteza irredutível: equivalências e suficiências contestadas na reparação de um desastre. Em: Antunes de Sant’Ana, Horácio & Rigotto, Raquel M. Ninguém bebe minério. RJ: 7Letras, pp. 74-104.

 

       Famílias da “roça”

Dezenas de famílias de outras localidades da zona rural de Mariana também tiveram suas casas ou parte dos seus terrenos destruídos pela onda de lama da Samarco. Inicialmente, a reconstrução foi a única opção de atendimento oferecida pelas mineradoras às famílias das comunidades de Borba, Camargos, Campinas, Paracatu de Cima, Pedras e Ponte do Gama. Após longo processo de negociação com a Fundação Renova, em 2017, as famílias localizadas na zona rural conquistaram o reassentamento familiar no âmbito dos direitos à moradia. Esta modalidade de reassentamento consiste na indicação feita pela família atingida,  de um imóvel em Mariana ou em qualquer outro município, em área urbana ou rural, e a Fundação Renova se responsabiliza pelo processo de compra do imóvel e construção da nova casa ou reforma da casa pré-existente. Com o apoio da Assessoria Técnica (realizada pela Cáritas), as famílias da zona rural se mobilizaram e conquistaram essa modalidade de reassentamento, pois a proposta de reconstrução não foi suficiente para reparar os efeitos provocados por este desastre,  vivido cotidianamente. Posteriormente, no âmbito das negociações das diretrizes de reassentamento, passou a ser uma opção de restituição de moradia também para as famílias das comunidades de Bento Rodrigues e de Paracatu de Baixo. Com isso, as famílias que sofreram deslocamento físico compulsório, isolamento comunitário, inabitabilidade e impossibilidade de manutenção dos métodos tradicionais de produção, conquistaram o direito ao reassentamento ou à reconstrução no âmbito das diretrizes de reassentamento (CÁRITAS, 2021).

As famílias dos subdistritos de Ponte do Gama, Borba, Pedras, Paracatu de Cima e Campinas estão em processo de negociação da reconstrução dos seus lares com a Fundação Renova. Há queixas de que a reconstrução de algumas casas não está sendo realizada de forma transparente e participativa com os seus respectivos proprietários. Além disso, as famílias lutam para que possam escolher os terrenos de destino, pois se recusam a ir morar na área de “dam break”, ou seja, nos locais de risco, considerando a possibilidade de rompimentos futuros das estruturas ainda existentes. Para estas famílias,  a luta é sobretudo pela autoconstrução ou o reassentamento familiar, pois assim poderão ter autonomia para reconstruir e/ou reformar suas respectivas moradias.

 

       Matriz de danos

Em Mariana, as negociações também se concentraram na Matriz de Danos, instrumento criado para classificar e valorar perdas e danos gerados pelas ações das empresas mineradoras. No dia 27 de agosto de 2019,  a Fundação Renova protocolou, junto à 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Mariana, sua resposta ao Ofício  n.º 403/2018 relativo à celebração de Termo de Transação entre o MPMG e as empresas. A referida transação visa promover a indenização das vítimas do rompimento da barragem de Fundão a partir da propositura e acordo sobre a Matriz de Danos. Mediante o Ofício  n.º 403/2018, o MPMG apresentou à Fundação Renova e às empresas uma proposta de Matriz de Danos resultante de um longo trabalho de diálogo e construção conjunta, envolvendo a assessoria técnica da Cáritas e os atingidos do município de Mariana, e levando em conta uma série de encontros no âmbito do GT Moradia.

Essa proposta surge como tentativa de  contraposição  a uma primeira Matriz de Danos do PIM (Programa de Indenização Mediada), apresentada pela Fundação Renova que não incorporava as possibilidades de avanço ensaiadas no decorrer dos debates sobre as indenizações. Entretanto, a Fundação Renova contestou a Matriz construída e proposta por atingidos, Cáritas e MP e, com o fim do GT, audiências públicas em Mariana se tornaram o espaço onde perdas e danos são identificados, negociados e valorados. Nessa esteira, no dia 11 de junho de 2019, em nome da “igualdade processual”, a juíza Marcela de Moura autorizou a contratação, pela Cáritas, de serviços especializados para construção de uma Matriz de Danos independente da Fundação e das mineradoras, de modo a subsidiar as decisões judiciais concernentes às negociações de indenizações:

“É certo que o processo de cadastramento realizado pela referida assessoria técnica, que engloba o preenchimento de formulários, cartografia familiar, vistoria do terreno atingido e entrevista individual sobre os danos morais, é uma ferramenta necessária para os atingidos negociarem a indenização de forma esclarecida, com os subsídios necessários para analisar se a proposta de acordo apresentada pelas rés é, de fato, justa.

No entanto, as informações contidas no cadastro aplicado pela assessoria técnica devem ser aliadas à matriz de danos, que nada mais é do que uma precificação, ou seja, uma valoração de todos os prejuízos, a fim de que os atingidos, com o acompanhamento jurídico oferecido pela Cáritas Brasileira, saibam o que perderam e tenham um subsídio mínimo de avaliação da proposta de acordo oferecida pelas rés.

Para tanto, a Cáritas Brasileira contratou o Instituto de Pesquisas Econômicas Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (IPEAD/CEDEPLAR), vinculado à Universidade Federal de Minas Gerais, cujo plano de trabalho compreende a valoração dos danos, a um custo de R$1.541.025,81, conforme documentação que instruiu o pedido do Ministério Público.

Ressalto que as rés, através da Fundação Renova, estão realizando, paralelamente, os cadastros dos atingidos, bem como a matriz de danos, para fins de apresentação das propostas de acordo, de modo que, em observância ao princípio da igualdade processual, é necessário que os atingidos tenham, além do cadastramento, a sua própria matriz de danos, confeccionada pela assessoria técnica de sua confiança, direta ou indiretamente” (TJMG, 2019, sem página).

 

Os resultados deste trabalho foram apresentados aos atingidos ao longo do segundo semestre de 2019, sendo a última parte da Matriz revelada no dia 22 de outubro do mesmo ano. No entanto, apesar da contratação de instituições para elaboração dessa Matriz de Danos e de já realizado o trabalho, a Fundação Renova recorreu à segunda instância no Tribunal de Justiça de Minas Gerais, pedindo a revisão da decisão da juíza, em Mariana, alegando sobreposição nos trabalhos propostos pela FGV e LACTEC para a bacia do rio Doce.

 

Sugestão de leitura:

“Vitória dos(as) atingidos(as) na defesa da Matriz de Danos”, Jornal A Sirene, 31 de março de 2020.

 

Sobre o andamento desta questão, ver atualizações nos tópicos “4 ANOS DE DESASTRE: OS PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS DE OUTUBRO/2019 A MARÇO/2020” e “QUASE 6 ANOS DE DESASTRE: PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS DE MARÇO DE 2020 À OUTUBRO DE 2021”.

 

FORMAS DE RESISTÊNCIA

Em meio a esse contexto de violações de direitos e sofrimento social dos afetados pelo desastre,  torna-se de fundamental importância destacar as diversas formas de resistência nesse processo. Desde ações coletivas, organizadas em movimentos  até ações no âmbito individual ou no  familiar, são múltiplas as formas que os afetados pelo desastre encontram para defender suas memórias, seu lugar, suas relações, vínculos, modo de vida e direitos enquanto atingidos.

Destacamos um processo que vem acontecendo desde o ano de 2016, e que se fortaleceu no ano de 2017, que é a realização de festejos  e celebrações religiosas por parte de pessoas das comunidades de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo nos territórios devastados pela lama. Ao longo de 2017, a equipe do GESTA pôde acompanhar alguns desses momentos, como a Festa de Santo Antônio, padroeiro de Paracatu de Baixo, e a Festa do Menino Jesus e de Nossa Senhora Aparecida, também em Paracatu. Nesta comunidade, acompanhamos a luta de lideranças pela liberação do espaço da Igreja Matriz de Santo Antônio para a realização das missas e festejos religiosos. O espaço foi finalmente liberado pela Fundação Renova em setembro de 2017, para a ocasião da celebração da missa da Festa do Menino Jesus, uma das mais importantes para a comunidade.

Em Bento Rodrigues,  acompanhamos a Festa de São Bento e de Nossa Senhora das Mercês, dentre outras celebrações, missas e ações coletivas como acampamentos no território que foram liderados sobretudo pelo grupo “Loucos por Bento”, formado por moradores como forma de resistência e defesa do lugar.  Na data em que se completaram os dois anos do rompimento, essas celebrações se intensificaram em diversas comunidades da região de Mariana como forma de denúncia e de ressignificação dos lugares solapados.

Outro aspecto dessa resistência foi a criação do jornal A Sirene, resultado da mobilização do grupo #UmMinutoDeSirene e da crítica à inexistência de uma sirene que alertasse as comunidades no momento do rompimento da barragem. O jornal é feito por voluntários e pelos próprios atingidos e conta com um fundo destinado aos projetos, a partir de um acordo entre o MPMG e a Arquidiocese de Mariana. O jornal tem o intuito de mostrar a história através do olhar, de críticas, reflexões e  questionamentos das comunidades atingidas. Caracteriza uma forma de jornalismo conhecida como jornalismo comunitário, que tem como traço fundamental o comprometimento político, participativo e engajado, e que tem o potencial de despertar nos indivíduos uma atitude mais crítica em relação ao conteúdo ao qual eles têm acesso (ROCHA, 2005), como é o caso das questões sobre memória, reassentamento, violação de direitos e reparação dos danos.

 

       Ocupação do Escritório da Fundação Renova

No dia 3 de junho de 2019, cerca de 120 pessoas atingidas dos municípios de Mariana, Barra Longa e Acaiaca ocuparam o escritório da Fundação Renova, em Mariana, e apresentaram 19 pontos de reivindicações sobre o processo de reparação. A resposta inicial da Fundação Renova foi insatisfatória e devido a isso os atingidos decidiram permanecer no escritório da fundação. No dia 19 de junho de 2019,  o GESTA acompanhou a reunião dos atingidos participantes da ocupação com alguns representantes da fundação. A pauta da reunião estava balizada nas 19 reivindicações apresentadas, sendo algumas das principais delas o reconhecimento do direito a auxílio/assistência emergencial para os garimpeiros e pescadores atingidos pelo rompimento, a cobrança por agilidade nos processos de reassentamentos e o reconhecimento de Acaiaca como munícipio atingido; assim como a realização de uma reunião da Renova sobre a perda de renda dos moradores da cidade. A ocupação, que durou 23 dias, foi encerrada no dia 25 de junho de 2019. Os atingidos e as atingidas receberam uma resposta da Fundação Renova sobre os seus pontos de reivindicação na noite do dia 24. No ofício enviado, a Renova reafirma que realizará o cadastro, aplicado na bacia do Rio Doce, a partir de agosto de 2019. Ela também afirma que fornecerá cestas básicas às famílias em situação de vulnerabilidade, também a partir de agosto.

Enquanto no âmbito institucional os processos relativos ao reassentamento e às indenizações se arrastam por seis anos com poucas sinalizações de um reassentamento célere e com descumprimento de prazos estipulados, esses sujeitos sociais resistem de diversas formas, interpelando essa situação de extrema violência que lhes foi imposta pelo desastre através da organização em torno da defesa do lugar e de sua memória, participando de comissões, grupos de trabalho, audiências, manifestações e atos públicos em defesa de seus direitos e  lutando pelo próprio reconhecimento enquanto atingidos.

 

Sugestões de leitura:

BARBOSA, Ilklyn (2018). “Pra mostrar pra eles que nós precisamos é de lá, não daqui”: rituais de resistência como novas formas de narrar e vivenciar o desastre no rio Doce. Monografia.

 

DE LIMA, Maryellen Milena (2018). “Aqui no é o nosso lugar”: efeitos socioambientais, a vida provisória e o processo de (re)construção de Paracatu de Baixo, Mariana/MG. Monografia.

 

NOGUEIRA PEREIRA, Ana Beatriz (2019). “Sentir o calor da terra, pra sentir que a gente está vivo”: memória, identidade e territorialidade na vivência cotidiana do desastre da Samarco”. Dissertação.

 

OLIVEIRA, Raquel; ZHOURI, Andréa; LOPO, Rafael e DE LIMA, Maryellen Milena (2020). Normas técnicas, cálculos (in)críveis e a incerteza irredutível: equivalências e suficiências contestadas na reparação de um desastre. Em: Antunes de Sant’Ana, Horácio & Rigotto, Raquel M. Ninguém bebe minério. RJ: 7Letras, pp. 74-104.

 

ZUCARELLI, Marcos Cristiano (2018). A matemática da gestão e a alma lameada: os conflitos da governança no licenciamento do projeto Minas-Rio e no desastre da Samarco. Tese.

 

 

II. 4 ANOS DE DESASTRE: OS PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS DE OUTUBRO/2019 A MARÇO/2020

VOLTA DAS ATIVIDADES DA SAMARCO NO COMPLEXO DE GERMANO

No dia 25 de outubro de 2019,   o Conselho de Política Ambiental de Minas Gerais (COPAM), por meio da Câmara Especializada de Atividades Minerárias (CMI), aprovou o retorno das atividades da Samarco no complexo Germano. A autorização foi concedida mesmo mediante a apresentação de diversas irregularidades (apontadas também no parecer de vistas) pelo Fórum Nacional da Sociedade Civil (Fonasc), este que foi o único voto contrário ao retorno das atividades das mineradoras. Foram 10 votos favoráveis, 1 abstenção e apenas 1 voto contrário. O parecer técnico favorável à retomada foi apresentado pela Superintendência de Projetos Prioritários (SUPPRI) e serviu de esteio ao voto dos conselheiros.

“O fato de a SUPPRI, mais uma vez, apresentar no seu parecer uma argumentação burocrática absurda sobre as estruturas com rejeitos só prova que o sistema de gestão ambiental de Minas Gerais é que é o verdadeiro desastre. É totalmente inaceitável que a Samarco queira retomar suas atividades no complexo minerário sem eliminar completamente qualquer risco às pessoas e ao meio ambiente na bacia do Rio Doce tão castigado. E a Vale, que sempre afirmou que suas barragens de rejeitos eram seguras e não iriam romper, já demonstrou que além de incompetente na gestão dessas estruturas é criminosamente negligente, diz a ambientalista Maria Teresa Corujo.” (ANGELO, M., Observatório da Mineração, 25 de outubro de 2019).

 

A autorização de retorno foi dada há exatos 9 meses do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, deixando mais de 250 mortos e há quase 4 anos do rompimento da barragem em Mariana,  completados no dia 05 de novembro de 2019.

 

MATRIZ DE DANOS DE MARIANA

A decisão final do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), no dia 11 de fevereiro de 2020, foi que as mineradoras deverão arcar com os custos da elaboração da Matriz de Danos construída em conjunto com os atingidos, o que legitima esse trabalho independente. Para efeitos de indenização, a Fundação Renova não é obrigada a utilizar essa matriz, podendo adotar seus próprios valores nas propostas. Porém, os atingidos têm então um instrumento para avaliar comparativamente as propostas da Renova, e não havendo acordo, sendo necessária a decisão judicial, o juízo responsável poderá decidir a partir da avaliação dos dois instrumentos: a matriz formulada pela Renova e a matriz desenvolvida pela Cáritas e pela CABF.

Sugerimos a leitura da reportagem do Jornal O Tempo, disponível Aqui.

 

JUDICIALIZAÇÃO DO PROCESSO DE REPARAÇÃO NA BACIA DO RIO DOCE

Através de petição conjunta, no final de 2019,  a Advocacia Geral da União (AGU) e a Advocacia Geral do Estado de Minas Gerais (AGE/MG) solicitaram audiências específicas para “tratamento adequado” aos “programas de reparação e indenização do Desastre de Mariana”, pois os programas tratados no CIF não estavam funcionando de forma justa, efetiva e plena para eixos considerados emergenciais (RESENDE, fevereiro de 2020).

Em outubro de 2019, o  juiz da 12ª Vara estabeleceu a obrigação das partes de apresentarem eixos prioritários para a reparação e a indenização,  com a discriminação dos temas consensuados e daqueles que ainda constituíam objeto de divergência. Na ocasião, foi agendada nova audiência, que aconteceu em 11 de dezembro de 2019, para a apresentação das planilhas do consenso e dissenso elaboradas.

A partir do que foi apresentado anteriormente, na audiência ocorrida no dia 19 de dezembro de 2019,  na sede da Justiça Federal em Minas Gerais, foi determinado pelo Juiz Mário de Paula Franco Júnior,  da 12ª Vara da Justiça Federal de Minas Gerais que o CIF (Comitê Interfederativo) passará a ser consultivo no que tange a eixos prioritários de reparação de danos. Ou seja, o CIF que foi criado no TTAC (“Acordão”) para aprovar e fiscalizar a implementação dos programas pela Fundação Renova, agora passará a ser somente consultado, concentrando as decisões exclusivamente no Poder Judiciário. A decisão judicial foi pautada na justificativa da falta de efetividade do CIF e com isso, atrasos e descumprimento dos programas estabelecidos para a reparação dos danos por parte da Renova. Foi estabelecido pelo Juiz que as partes deverão apresentar eixos temáticos elegidos como prioritários: sendo  homologados os eixos em consenso e examinados os dissensos para serem proferidos em audiências posteriores. Quanto  aos demais eixos, ou seja, não prioritários, o CIF segue seu funcionamento inicial de orientação, validação, monitoramento e avaliação. (Consulte a Ata aqui)

Ficaram estabelecidos 10 eixos prioritários:

  1. Recuperação ambiental extra e intra calha;
  2. Risco à saúde humana e risco ecológico;
  3. Reassentamento das comunidades atingidas;
  4. Infraestrutura e Desenvolvimento;
  5. Retorno Operacional da Usina Hidrelétrica Risoleta Neves (Candonga);
  6. Medição de performance e acompanhamento;
  7. Cadastro e Indenizações;
  8. Retomada das atividades econômicas;
  9. Abastecimento de água para consumo humano;
  10. Contratação das Assessorias Técnicas.

Decisões da Justiça Federal relacionadas aos eixos acima, ver aqui.

No decorrer de 2020 e 2021 surgiram mais três eixos prioritários:

  1. Ações de saúde - Fundo de 150 milhões;
  2. Proibição da Pesca na Bacia do Rio Doce;
  3. Reestruturação do Sistema de Gestão Organizacional Interno da Fundação Renova.

 

Sugestão de leitura:

REZENDE, Leonardo (2020). O caminho inverso da reparação no desastre ambiental da Samarco.

 

ANÁLISE DE RISCOS À SAÚDE HUMANA

As preocupações  com os danos à saúde física e mental fazem parte do cotidiano dos atingidos de Mariana e Barra Longa. Os relatos trazem diversos adoecimentos como: transtornos respiratórios, dermatites, quadros graves de ansiedade e depressão, além do medo e incerteza em relação à toxicidade da lama nas áreas contaminadas.

Com o objetivo de produzir dados para subsidiar medidas voltadas aos danos à saúde da população atingida pelo rompimento da barragem, em julho de 2018, a *Câmara Técnica de Saúde (CT-Saúde) acordou com a Fundação Renova a contratação da empresa AMBIOS para a realização de um Estudo de Avaliação de Risco à Saúde Humana (ARSH) com base nas diretrizes do Ministério da Saúde. Esta avaliação foi realizada entre 2018 e 2019 e entregue à Fundação Renova em março de 2019. Devido à contestação dos resultados da avaliação, a Renova não os tornou públicos até novembro daquele ano. Quando se tornou público que os resultados estavam sendo omitidos pela Fundação e pelo governo de Minas Gerais, foi agendada pela Secretaria Estadual de Saúde uma devolutiva dos resultados aos atingidos em eventos em Mariana e Barra Longa, dos quais a Fundação se recusou a participar. As conclusões obtidas pela AMBIOS apontam para a classificação dos locais examinados como “Categoria A: Perigo urgente para a Saúde Pública”  no passado, no presente e no futuro (GESTA, 2020).

Em dezembro de 2019, a Fundação Renova apresentou o documento intitulado “Projeto de Gestão Integrada para a Saúde e Meio Ambiente (GAISMA)”. Dentre os pareceres emitidos a partir desta disputa, a RAMBOLL e o Ministério da Saúde concluíram que a metodologia apresentada na GAISMA não é adequada para uma avaliação relativa aos riscos à saúde da população atingida, pois a metodologia se apresenta limitada. Como por exemplo: “a avaliação dos compartimentos ambientais da GAISMA é restrita à análise do solo, não incorporando outras matrizes como água e alimentos cultivados nas áreas atingidas” (GESTA, 2020, p. 3).

Porém, mesmo diante das contestações e reticências exprimidas em âmbito técnico-científico em torno desta metodologia defendida pela Renova, além da rejeição pelo Ministério Público, Ministério da Saúde e o grupo interdefensorial do rio Doce (DPU, DPES, DPMG), o juiz Mário de Paula Franco Júnior, da 12ª Vara Federal Cível e Agrária de Belo Horizonte, no dia 02 de março de 2020, determinou que a metodologia a ser  utilizada no âmbito das avaliações e ações de saúde (eixo prioritário 2: risco à saúde humana e risco ecológico) seria a da GAISMA. Este ambíguo projeto de gestão/metodologia foi desenvolvido pela Renova, estando diretamente ligado às empresas rés do processo (GESTA, 2020).

Ademais, o Juiz da 12ª Vara nomeou como perito judicial para esse tema a empresa AECOM do Brasil Ltda, sediada nos EUA e com escritório em São Paulo. A consultoria atua nos ramos de engenharia, construção e consultoria, além de ter como cliente a própria VALE S. A. Portanto, a empresa  AECOM também não preenche requisitos mínimos de independência necessários ao papel do perito judicial.

Acesse o conteúdo complementar sobre a questão da saúde aqui.

De acordo com notícia do Ministério Público Federal, também em março de 2020, o órgão ingressou com ação civil pública para obrigar a Fundação Renova a custear a implementação de um Plano de Ação de Saúde em Barra Longa, bem como despesas extraordinárias do SUS em decorrência do desastre, com a justificativa de que “os recursos necessários ao custeio dos serviços de saúde até hoje não foram aportados pelos causadores do dano e os recursos públicos disponíveis não têm sido, nem de longe, suficientes para fazer frente ao quadro de agravamento da saúde da população local” (MPF, março de 2020) aqui. No entanto, a 12ª Vara Cível-Agrária de Belo Horizonte, em 16/04/2020, entendeu que as ações voltadas para resolução de problemas relacionados à saúde pública já estavam sendo devidamente tratados no âmbito do TTAC e TAC-Gov, sob tutela daquele mesmo juízo no Eixo Prioritário 2: “Trata-se de EIXO PRIORITÁRIO estabelecido na via judicial, com propósito específico de endereçar adequadamente as ações e soluções de saúde no âmbito do Desastre de Mariana como um todo, e evidentemente em Barra Longa/MG, a partir da realização definitiva do estudo de risco à saúde humana e risco ecológico (GAISMA-Aprimorado)” (Justiça Federal, 2020a, p. 8). Nesta mesma decisão, o juízo reitera que “não há, até o presente momento, NENHUM laudo técnico ou conclusão técnica, validada em juízo, que ateste ou confirme a alegação de contaminação da população de Barra Longa por metais pesados, matéria, inclusive, que é objeto específico da perícia judicial em andamento, ante a flagrante divergência sobre o tema” (Idem, p. 11).

Asserções contrárias às manifestas nessa última decisão da 12ª vara proliferaram. A Câmara Técnica de Saúde (CTS-CIF), em análise do GAISMA-Aprimorado, emitiu a Nota Técnica nº 32/2020, na qual lê-se a seguinte avaliação: “Não houve alterações substantivas na versão apresentada [do GAISMA] e nem o atendimento àquelas já sinalizadas em Deliberação do Sistema CIF. O documento mantém sua forma de estruturação, não trazendo as mudanças necessárias já apresentadas anteriormente para que o documento se adeque às linhas de avaliação dos órgãos públicos competentes da área de saúde. A ausência das alterações necessárias para a avaliação do risco à saúde humana por parte do setor saúde inclusive vai contra o apregoado pelo juízo federal, que busca “um equacionamento definitivo do modelo de GAISMA aprimorado”. Assim, considerando a peremptoriedade do prazo legal, avaliamos que a proposta apresentada pela Fundação Renova é incipiente, não apresentando evidências de que a referida metodologia possa atender aos objetivos de um estudo de risco à saúde humana, tal qual orienta as diretrizes do Ministério da Saúde do Brasil” (p. 8).

Em 16 de abril, MPF, DPU, DPES e DPMG interpõem agravo às decisões da 12ª vara relacionadas à adoção do GAISMA e à invalidade jurídica do trabalho desenvolvido pela Ambios-Grupo EPA. Entretanto, o juízo manteve seu entendimento em relação ao GAISMA e deu sequência no processo. Cabe notar, ainda, que a Deliberação nº 398 do CIF, de abril de 2020, rejeita a adoção do GAISMA.

Conforme Nota Técnica nº 03/2020 produzida pelo Laboratório de Educação Ambiental e Pesquisa: Arquitetura, Urbanismo, Engenharias e Processos para Sustentabilidade, da Universidade Federal de Ouro Preto, “em 14 de maio de 2020 a Advocacia Geral da União (AGU), representando o IAJ-CIF, o IBAMA, o ICMBio, a ANM e a ANA, opôs Embargos de Declaração, com efeitos infringentes (ID 55051523). Em síntese, a manifestação sustenta a necessidade de andamento do processo judicial nos termos externados pela Deliberação CIF nº 398, de 17.04.20201, editada entre a interposição do agravo de instrumento e a r. 1 Deliberação nº 398 de 17.04.2020: Deliberou sobre a manifestação do CIF perante os documentos protocolados pela Renova sobre a Entrega 5.2 do Eixo prioritário 02 da Decisão Judicial expedida em 19 de dezembro de 2019 pela 12ª Vara Federal Cível de Minas Gerais. A decisão do TRF é que a continuidade do pleito em referência deve ser deduzida junto ao Juízo da 12ª Vara da SJMG avançando sob toda a égide do contraditório, ampla defesa e devido processo legal. Os órgãos públicos subscritores das presentes contra razões ratificam integralmente o teor dos Embargos de Declaração apresentados pela AGU. Em 18 de maio de 2020,  foram interpostas, pelo Ministério Público Federal,  contrarrazões aos Embargos de Declaração da Advocacia-Geral da União (ID 55453588). MP/MG, MP/ES, AGE-MG e PGE-ES apresentaram manifestação conjunta aderindo ao recurso da AGU, defendendo a utilização da GAISMA. Em 20 de maio de 2020, MPF/MG, MPF/ES, AGU/MG e PGE/ES manifestam-se sobre os Embargos de Declaração apresentados pela Advocacia-Geral da União. Rechaçam as contrarrazões apresentadas pelo Ministério Público Federal, e pedem que não sejam acolhidas as considerações apresentadas” (LEA-AUEPAS, 2020:10).

É digno de nota o fato de que, em 13 de maio de 2020, mediante Ofício CT-Saúde/CIF nº 19/2020, a CT-saúde reitera solicitação feita junto à Fundação Renova (Ofício CT-Saúde/CIF nº 08/2020, de março do mesmo ano) de entrega dos resultados da ARSH, elaborada pela AMBIOS, no município de Linhares/ES: “o óbice da Fundação Renova na apresentação da referida documentação representa empecilho indevido na atribuição da Câmara Técnica de Saúde de acompanhar, monitorar e fiscalizar o programa de apoio à saúde física e mental da população impactada”, conforme se lê no ofício da CT-Saúde. A Renova respondeu a esse ofício em 21 de maio de 2020, recusando-se a entregar os resultados da ARSH. A Fundação alegou que a decisão de se utilizar a metodologia chancelada pelo Ministério da Saúde era de caráter liminar e ocorrera “sem escuta das partes favoráveis à implementação da metodologia GAISMA-Aprimorado [...]” (SEQ26375/2020GJU, p. 1), afirmando ainda que a “decisão não ostenta a necessária estabilidade material e processual, pois ainda passível de reversão” (Idem, p. 1-2).

Em 13 de julho de 2020, a desembargadora federal Daniele Maranhão Costa rejeita os embargos de declaração interpostos pela União e pelas empresas Samarco Mineração S.A., Vale S.A. e BHP Billiton Brasil Ltda, além de pontuar, entre outras questões, que (1) “a escolha da empresa AECOM do Brasil Ltda não atende à expectativa dos agravantes, notadamente porque a empresa teria aderido à aplicação da GAISMA, em que pese, agora com mais clarividência, diante do teor da Resolução CIF 398/2020, a gestão proposta pela Fundação Renova não atenderia aos critérios adequados para condução do processo reparatório” (Justiça Federal, 2020b, p. 4); (2) “O fato é que as embargantes, por meio da Fundação Renova, não obstante tenham tido a oportunidade de adequar a GAISMA aos critérios traçados pela CT Saúde e pelo Ministério da Saúde, devolveu a proposta supostamente aprimorada sem os ajustes necessários, sendo essa omissão, inclusive, a responsável pela necessidade da intervenção judicial quanto ao ponto, já que a suposta GAISMA-aprimorada pouco aprimoramento na verdade concretizou, como ficou bem claro na decisão, com suporte nas manifestações dos órgão técnicos, evidenciando pouca vontade de solucionar e conduzir adequadamente o processo reparatório por parte dos responsáveis pelo acidente de tão evidentes proporções e que insistem em procrastinar a solução dos problemas relacionados aos riscos à saúde” (Justiça Federal, 2020b, p. 4); (3) “Ao alegar contradição, sob o fundamento de que na parte dispositiva da decisão esta Relatora ressalta a possibilidade de utilização da GAISMA, penso não haver razão para a insurgência, já que está clara a necessidade de adequação e de oitiva das partes, conforme exposto “desde que conformada aos contornos definidos pelo Ministério da Saúde e pela CT-Saúde (integrante do CIF), e desde que essa opção se mostre a mais adequada e eficaz para a condução dos trabalhos, tudo condicionado ao contraditório”. A adoção dos estudos elaborados pela AMBIOS e pelo Grupo EPA não se constitui contradição, mas importa em entendimento defendido pelos agravantes e acolhidos por esta Relatora” (Justiça Federal, 2020b, p. 5).

* Câmara Técnica de Saúde (CT-Saúde), órgão composto em sistema colegiado para integrar o CIF (Comitê Interfederativo), previsto pelo Termo de Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) celebrado entre a União, os estados de Minas Gerais e Espírito Santo e as empresas Vale, Samarco e BHP. Como unidade técnica integrante do CIF, o objetivo da CT-Saúde é fornecer subsídios e direcionamentos técnicos que permitam ao CIF orientar, monitorar e fiscalizar a execução do TTAC. (GESTA, 2020, p. 1).

 

REASSENTAMENTO

Em audiência no dia 7 de janeiro de 2020,  a Juíza titular estipulou nova data para reassentamento das comunidades atingidas, acatando parcialmente o recurso impetrado pelas empresas em 2019. A multa de R$1 milhão por dia de atraso na entrega dos reassentamentos foi mantida, porém o prazo foi postergado para fevereiro de 2021 para conclusão de todas as obras. (JORNAL A SIRENE, ed. 46, fevereiro de 2020). O Ministério Público entrou com recurso e aguarda a decisão final.

 

Sugestões de leitura:

CÁRITAS (2021a). Atrasos. Relatório de entrega dos reassentamentos. Mariana/ MG. (Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo e Comunidades Rurais). Fevereiro de 2021.

CÁRITAS (2021b). Relatório Técnico. Atraso na reparação do direito à moradia. Reassentamento de Paracatu de Baixo, Mariana/MG. Abril de 2021.

 

PAUTAS JUDICIALIZADAS EM MARIANA: NOVOS NÚCLEOS FAMILIARES E PARÂMETROS DE COMPENSAÇÃO

       Marco Temporal para a formação de novos núcleos familiares

Considerando que mudanças sociais estão ocorrendo, visto que as bases familiares são processos, foi homologado no âmbito das diretrizes de reassentamento que a Samarco, a Vale e a BHP Billiton, por meio da Fundação Renova, deverão moradia aos novos núcleos familiares formados após o dia 05 de novembro de 2015. A luta  dos(as)  atingidos(as)junto à Assessoria Técnica, é que o marco temporal seja considerado até o dia da entrega dos reassentamentos. Porém, as empresas rés decidiram adotar unilateralmente o marco temporal de janeiro de 2019, ou seja, estão desconsiderando novos núcleos formados após esta data.

No dia 10/10/2019,  o MPMG entrou com uma Ação Civil Pública de Cumprimento de Sentença visando o cumprimento do acordo já homologado judicialmente. No dia 22/09/2020,  houve decisão judicial  em primeira instância, estabelecendo que novos núcleos formados até dezembro de 2020 têm garantido o direito à moradia. O MPMG entrou com recurso em segunda instância para ampliar esse prazo.

Mesmo com a data definida por decisão judicial (marco temporal: 22/09/2020),  as famílias atingidas, que se encontram nesta situação, não estão sendo reconhecidas pela Fundação Renova. Segundo o Relatório de entrega dos reassentamentos produzido pela Cáritas (2021), em Bento Rodrigues foram identificados cerca de sessenta casos de novos núcleos e não há no Master Plan previsão de lotes destinados ao atendimento dessas famílias. Neste mesmo relatório consta que na comunidade de Paracatu de Baixo existem 33 novos núcleos familiares e a Fundação Renova reconhece apenas   2 núcleos.

Portanto, mesmo diante  do acordo homologado e  da decisão judicial, a maior parte dos atingidos que se enquadram como novos núcleos familiares não estão sendo reconhecidos/atendidos pela Fundação Renova.

       Compensações

O processo de reparação dos danos deve garantir a retomada dos modos de vida das comunidades atingidas pelo rompimento de Fundão. Porém, no reassentamento, as famílias se encontram em situações tais  como: perda de área, declividade acentuada, vizinhança comprometida, entre outras, o que compromete o retorno aos modos de vida.

Conforme homologado na Diretriz de reassentamento nº 14, de 06/02/2018, as mineradoras deverão compensar as famílias em caso de não restituição igual ou melhor que a situação anterior. Os parâmetros de compensação devem ser de acordo com as necessidades e realidades das famílias atingidas.

No dia 26 de agosto de 2020,  ocorreu a primeira audiência judicial sobre compensações, porém as famílias atingidas não puderam participar presencialmente em decorrência da pandemia da Covid-19. A audiência ocorreu em formato virtual e foram apresentadas propostas de conversão e compensações pelos atingidos, porém as  empresas rés não concordaram com as propostas. A audiência foi encerrada, pois os atingidos tiveram que solicitar mais tempo para apresentar uma contraproposta.

No dia 17 de setembro de 2020, as empresas se posicionaram em não aceitar a proposta dos atingidos, e dentre os argumentos apresentados estava a alegação de que não deve haver a “inversão do ônus da prova”, ou seja, quem deve provar os problemas e prejuízos que as famílias atingidas estão sofrendo devido a erros da Fundação Renova é o MPMG. 

Ainda não houve decisão judicial em relação aos parâmetros de compensação e não há previsão de quando isto será definido.

De acordo com o relatório da Cáritas (2021), em fevereiro de 2021, a Fundação Renova não havia apresentado laudos que comprovem a impossibilidade técnica de resolução dos problemas identificados nos lotes e apresentados ao longo desses cinco anos, e as respostas das mineradoras se resumem à proposta de valor indefinido para compensações financeiras.

Sugestões de leitura:

Jornal A Sirene - O Crime não compensa - 28 de outubro de 2020.

ATRASOS:  Relatório de entrega dos reassentamentos - 27 de fevereiro de 2020.

 

III. 6 ANOS DE DESASTRE: PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS DE MARÇO DE 2020 A OUTUBRO DE 2021

 

INDENIZAÇÃO NA BACIA DO RIO DOCE

No âmbito do Eixo Prioritário 7 (Cadastro e Indenizações), foi aberto em Baixo Guandu (ES), em maio de 2020, um novo processo para discutir o fechamento de cadastro e as indenizações no território. A partir de então, uma série de outros processos semelhantes foram abertos em diferentes territórios ao longo da bacia. Os processos correram em sigilo, de forma que o Ministério Público e a Defensoria Pública só tomaram conhecimento depois de várias decisões já terem sido feitas. Repetidamente, as Comissões de Atingidos propuseram quais seriam as categorias atendidas e os valores de indenização, a Fundação Renova apresentou contrapropostas e o juiz da 12a Vara Federal decidiu sobre as categorias e os valores. A partir do reconhecimento das categorias, o juiz definiu os critérios de elegibilidade, as formas de comprovação e os valores das indenizações, e determinou que a Fundação Renova criasse uma plataforma online para executar os trâmites desse Sistema Indenizatório Simplificado (SIS).

Assim, em julho de 2020,  foi inaugurado o Novo Sistema Indenizatório (Novel) - a partir da experiência de Baixo Guandu - como uma via “alternativa” ao Programa de Indenização Mediada (PIM) e à judicialização individual ao longo da bacia do Rio Doce.

O objetivo inicial da criação do novo sistema foi atender a situações de difícil comprovação de danos. Porém, o Novel tem sido utilizado ao longo da bacia como única opção oferecida às pessoas que sofrem diariamente as consequências do desastre. Esse sistema exige que os atingidos assinem um documento de quitação total para as empresas, abrindo mão de acionar a justiça brasileira e no exterior sobre qualquer outro direito. Na prática, o sistema Novel tem se tornado o único caminho de acesso à indenização para muitos dos atingidos.

Para ser colocado em prática, as comissões locais têm de concordar com o encerramento do cadastro. Assim, por discordâncias em torno deste e de outros pontos, em diversos territórios ao longo da bacia novas comissões foram criadas por atingidos interessados em aderir ao sistema, mesmo que já houvesse comissões consolidadas no local. De acordo com reportagem da Agência Pública, a coordenação da Comissão de Baixo Guandu relatou que a ideia do novo sistema teria partido da própria Fundação Renova, em reunião com os atingidos. As indenizações são baseadas numa Matriz de Danos elaborada pelo próprio juiz Mário de Paula (12a Vara da Justiça Federal de Minas Gerais), sem apresentação dos fundamentos técnicos  que  conduziriam aos valores fixados, justificando-os apenas através de argumentos tais como: “a experiência comum revela…”. Além do mais, as indenizações se dão mediante a aceitação da quitação total e da contratação de advogados, que devem receber, a título de honorários, 10% do valor de cada indenização.

Com o novo sistema sendo implementado ao longo da bacia do rio Doce e as defensorias públicas sobrecarregadas, as pessoas atingidas passaram a ser constantemente procuradas por advogados particulares para ingressarem no Novel (já que apenas esses profissionais podem acessar a plataforma online da Fundação Renova). Na maior parte das comunidades, as assessorias técnicas não foram contratadas, de forma que os atingidos não têm acesso, sequer, à assessoria jurídica que lhes é de direito.

No dia 31 de março de 2021, o Ministério Público Federal e as Defensorias Públicas da União, de Minas Gerais e do Espírito Santo entraram com pedido de suspensão do juiz Mário de Paula Franco Júnior, da 12ª Vara Federal de MG, responsável pelo Caso Samarco. O pedido de suspensão do caso foi baseado em matérias realizadas e divulgadas pelo Observatório da Mineração*, em que o juiz aparece em reuniões orientando advogados sobre como deveriam proceder para conseguir acesso ao Sistema Indenizatório Simplificado. 

*Matéria do Observatório da Mineração: Vídeo de reunião indica possível suspeição do juiz responsável pelo caso do desastre de Mariana

De acordo com os argumentos utilizados pelo MPF e pelas Defensorias Públicas, o juiz Mário tem agido de forma parcial e contrariamente aos direitos dos atingidos, e o sistema criado está definindo baixos valores de indenização aos atingidos, lesando seus direitos. Porém, no dia 25/05/2021, a Desembargadora Daniele Maranhão Costa, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, negou o pedido de suspeição do juiz federal substituto da 12ª Vara Federal de Belo Horizonte, alegando que o pedido foi realizado fora do prazo e que o Novel é um sistema “mais célere e simplificado” do que os demais acordos. (Leia na íntegra: Desembargadora nega suspeição de Mário de Paula, o 'juiz Moro do caso Samarco')

Já no município de Mariana (MG), a indenização é realizada de forma singular a partir do processo de negociação no território, pois os acordos estão inseridos no âmbito da ACP instaurada logo após o rompimento da barragem, e são conduzidos junto à Comarca local. Entretanto, membros da Comissão de Atingidos foram procurados pelo ex-prefeito de Mariana, que estava interessado em discutir junto aos atingidos a possível adesão ao sistema Novel. Em 22/03/2021, foi criada uma nova comissão (nomeada “Comissão de Atingidos de Mariana''), paralela à que existe desde dezembro de 2015 (a “Comissão dos Atingidos pela Barragem de Fundão - CABF”). A nova comissão, formada por  atingidos não reconhecidos pela Fundação Renova ou que não tiveram acesso ao PLCI (a exemplo de comerciantes do centro urbano), pleiteia o ingresso no Sistema Novel. Chamando atenção para a existência de uma Comissão desde 2015, as empresas entraram com um recurso à petição protocolada pela Comissão Paralela na 12ª Vara, alegando que as ações em Mariana são conduzidas junto à Comarca local e dentro da ACP específica do território. Porém, na sentença do dia 20/08/2021, o juiz da 12ª vara reconheceu a nova comissão ao decidir estender o Novel também ao município de Mariana.

Desse modo, os atingidos atualmente possuem três vias de indenização: a) a via extrajudicial, com o Programa de Indenização Mediada (PIM), ou no caso de Mariana, em que o processo ocorre de forma diferente do restante da bacia, a Fase de Negociação Extrajudicial (FNE) - uma negociação baseada na autodeclaração, que considera, a princípio, o cadastro e o dossiê elaborado pela assessoria técnica; b) o Novel, que tem o objetivo de quitar todas as pretensões financeiras presentes e futuras; c) a judicialização individual.

Na FNE, após a finalização do processo de cadastro e entrega do dossiê pela assessoria técnica, a Fundação Renova tem 90 (noventa) dias para apresentar uma proposta de indenização ou alegar inelegibilidade do atingido e 12 (doze) meses de negociação, embora, de acordo com relatos dos próprios atingidos, a Fundação Renova  desrespeite sistematicamente esses prazos. Durante a negociação, os atingidos poderiam, em princípio, contrapor as propostas da Fundação a partir da Matriz de Danos elaborada pela Cáritas. No entanto, os parâmetros de indenização propostos pela assessoria e atingidos são regularmente ignorados (veja Relatório - Processo Indenizatório na Fase de Negociação Extrajudicial dos Atingidos e Atingidas pelo Rompimento da Barragem de Fundão - Cáritas Brasileira, Regional Minas Gerais, outubro de 2021). Já o Novel não permite  uma negociação. Nesse sistema, o atingido (através de advogado/ advogada) faz uma declaração e apresenta os documentos comprobatórios. A Fundação Renova avalia e julga a elegibilidade do atingido e, se o considerar elegível, procede à indenização com base na Matriz de Danos criada pelo juiz da 12a Vara Federal de Minas Gerais. Já a judicialização individual atende aos casos de inelegibilidade e desacordo com a proposta de indenização. A decisão é tomada pelo judiciário, que ouvirá a Fundação Renova e o atingido (representado por advogado(a) ou defensor(a) público), que poderá apresentar documentos como a Matriz de Danos, o dossiê e as avaliações feitas pela assessoria técnica para disputar a indenização.  

 

PRESCRIÇÃO E CADASTRO EM MARIANA

O acordo homologado pela Justiça no dia 2 de outubro de 2018, nos autos da Ação Civil Pública de Mariana, ajuizada pelo MPMG, interrompeu o prazo prescricional para que os atingidos no município de Mariana apresentem seus pleitos de indenização junto ao sistema de justiça. De acordo com o Código Civil, o prazo para agir em busca da reparação por um direito violado é de três anos. O prazo prescricional passou a ser contado a partir da data da última decisão, logo, 2 de outubro de 2021.

No entanto, a fase de negociação extrajudicial (FNE/PIM) está ocorrendo através de um processo lento, desigual, injusto e imposto, em que não há efetivamente negociações. O acordo sobre as indenizações determina que as informações levantadas pelo cadastro das famílias atingidas devem ser consideradas para reconhecimento e fixação das indenizações. Entretanto, as informações do cadastro não são consideradas pela Fundação Renova, que descumpre o acordo quando determina unilateralmente  os danos reconhecidos e os valores para a indenização. A Fundação também determina quais atingidos são elegíveis às indenizações. Além disso, o que tem sido recorrentemente relatado é que quando as famílias ingressam na FNE, a Fundação Renova demora muito para realizar a proposta de indenização ou simplesmente não apresenta a proposta. Foi pontuado pela Cáritas que muitos núcleos familiares aguardam por mais de um ano a apresentação e/ou reanálise de proposta da FNE. Com isso, as famílias não possuem meios suficientes  para realizarem a análise acerca da proposta de indenização e definirem como agir a partir desta análise (aceitar a proposta ou judicializar caso a proposta da Renova não os atenda).

Mais informações: Ameaça de prescrição gera incertezas sobre indenizações às pessoas atingidas

Desde março de 2020, a Assessoria Técnica, representada pela Cáritas, vem realizando o processo de cadastramento das vítimas sem a renovação dos projetos do cadastro, ou seja, estavam atuando com recursos financeiros e humanos escassos. Na audiência de conciliação do dia 15/07/2021, em Mariana, referente ao processo no 0043356-50.2015.8.13.0400, ficou acordada a continuidade dos cadastros por mais 8 (oito) meses a partir do alvará de liberação do recurso financeiro para para continuidade do trabalho da Cáritas no prazo definido. A conclusão dos cadastros ficou prevista para março de 2022. Cerca de 300 pessoas atingidas ainda estão em processo de cadastramento. Portanto, o prazo prescricional não deveria ser considerado, uma vez que o desastre está em curso e os efeitos sobre os territórios não cessaram, além disso, o cadastro das famílias não foi finalizado e as negociações dos danos através da FNE são marcadas pelas inúmeras assimetrias assinaladas. .

Desde julho de 2021, são realizadas audiências de conciliação (no formato virtual em decorrência da pandemia do Covid-19) na Comarca de Mariana para a decisão sobre a data da prescrição. A juíza Drª Marcela Decart, responsável pelo caso em Mariana, tenta realizar um acordo acerca do prazo prescricional com as empresas responsáveis pelo crime (Samarco, Vale e BHP).

Em audiência no dia 1º de outubro de 2021, foi decidido que dentre as 312 famílias identificadas pela Cáritas (Assessoria Técnica) que ainda não tiveram os seus cadastros concluídos, 135 famílias, que correspondem àquelas que tiveram o  cadastramento iniciado, terão os seus cadastros concluídos até o dia 04/12/2021. Já  as 177 famílias cujos cadastros  não foram iniciados, a data de conclusão prevista é  04/04/2022. Segundo o entendimento da juíza, para essas famílias não se aplicará a prescrição.

Em relação às famílias que ainda não receberam proposta indenizatória ou que estão aguardando reanálise em fase de negociação extrajudicial (FNE), a juíza afirmou o entendimento de que nesses casos há descumprimento dos prazos por parte da Fundação Renova, o que suspende o   prazo prescricional para a judicialização. A juíza também chamou a atenção para a razoabilidade da análise de cada caso, tendo em vista que, na sua leitura, caso as famílias estejam aguardando há mais de um ano, sem retorno, devem judicializar suas demandas.

 A audiência do dia 08 de outubro de 2021 seguiu sem solução, uma vez que as empresas não aceitaram formalizar acordo quanto à não prescrição para todas as famílias cadastradas. Nesta mesma audiência, as empresas rés se comprometeram a reunir os seguintes dados: a) famílias que já foram indenizadas, b) famílias que foram consideradas inelegíveis para a indenização, c) famílias que receberam a 1ª proposta e não teve acordo, d) famílias que já entraram com suas ações e os processos não receberam sentença. Posteriormente, a juíza designará nova audiência para discutir novamente a possível repactuação do acordo de 2018, quanto a prazos e formas de negociação.

REASSENTAMENTO

O prazo estipulado para entrega dos reassentamentos coletivos, no dia 27 de fevereiro de 2021, sob multa diária de 1 milhão de reais em caso de mais atrasos, foi novamente descumprido pelas empresas mineradoras, por meio da Fundação Renova. E, mais uma vez,  as empresas solicitaram judicialmente nova data para terminar as obras. O caso está na 2ª instância (TJMG), mas não tem previsão de julgamento pelo Tribunal de Justiça. Contudo, as empresas haviam também entrado com pedido de prorrogação do prazo em 1ª instância (comarca de Mariana), o que pode gerar confusão no processo.

As empresas justificam o atraso da entrega dos reassentamentos sob o pretexto de burocracias, pandemia, clima, etc, ou ainda, transferindo a responsabilidade dos atrasos para os atingidos, alegando demora na escolha de itens da casa ou mudanças no projeto.

No entanto, as alegações não condizem com a realidade. Desde o início, o processo é acompanhado por erros da Fundação Renova e pelo jogo de empurra entre as instituições, o que acarreta em grande morosidade. O relatório produzido pela Cáritas traz, de forma sistematizada, os atrasos no processo de reassentamento das comunidades atingidas desde os primórdios: ATRASOS:  Relatório de entrega dos reassentamentos - 27 de fevereiro de 2020.

No dia 17 de junho de 2021, atingidos da comunidade de Paracatu de Baixo se mobilizaram e realizaram um protesto contra a lentidão das obras no reassentamento. Após quase 6 anos de espera, nenhuma casa havia sido construída na Nova Paracatu de Baixo. Entre as reivindicações estavam: a aceleração das obras e alvarás de construção, a contratação de mão-de-obra dos moradores dos distritos afetados, a definição de previsão de entrega das casas, reparos na igreja e nas ruas da antiga Paracatu. Em resposta à manifestação, a Fundação Renova enviou um documento aos atingidos que informava que a previsão de início das obras seria em setembro de 2021.

Graças à manifestação, a comunidade se reuniu com a Prefeitura e a Fundação Renova para alinhar os próximos passos e buscar celeridade no processo. No dia 15 de setembro de 2021, a Renova colocou o primeiro tijolo de uma das casas na comunidade de Paracatu de Baixo. A Fundação Renova buscou trazer um tom de celebração para o feito, mas os atingidos pontuaram que não há nada a se comemorar, pois são quase 6 anos fora de suas casas e do convívio da comunidade, além de não haver prazo para finalizar o reassentamento. No mesmo dia, às 11 horas, foi realizado um “tuitaço” intitulado: 6 ANOS POR UM TIJOLO! Durante o evento do primeiro tijolo, os atingidos presentes vestiam uma camisa com os dizeres: 6 anos e Paracatu de Baixo continua na luta pelo reassentamento.

Pontos críticos que dificultam ou impossibilitam a retomada dos modos de vida*:

Paracatu de Baixo

  1. Nenhuma casa construída
  2. Evasão do reassentamento coletivo        
  3. Terraplanagem e infraestrutura pendentes
  4. Falta de contratação de pessoas atingidas
  5. Situação dos sitiantes
  6. Áreas institucionais sem uso definido
  7. Não reconhecimento: novos núcleos, meeiros, cedidos, inquilinos
  8. Lotes com características desfavoráveis
  9. Necessidade de água bruta
  10.  Plantio e benfeitorias nos lotes

 

Bento Rodrigues

  1. Projetos arquitetônicos das casas
  2. Evasão do reassentamento coletivo
  3. Fornecimento de água bruta
  4. Bens públicos e comunitários
  5. Cemitério
  6. Áreas susceptíveis à erosão
  7.  Áreas de produção agropecuária estão restritas
  8. Déficit de área
  9. Insatisfações quanto aos lotes ofertados
  10.  Aterro sanitário

 

*Fonte: VIOLAÇÃO DE DIREITOS na reparação às comunidades atingidas de Mariana/MG - Agosto de 2021 - Cáritas e CABF.

 

ALIMENTAÇÃO ANIMAL

 

A partir da mobilização de atingidos que vinham denunciando a situação calamitosa enfrentada por seus animais em decorrência da alimentação fornecida pela Fundação Renova (como divulgado em matéria do Brasil de Fato), o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) abriu um inquérito para tratar da questão em juízo. Dentre as denúncias estão o recebimento de insumos vencidos, mofados, apodrecidos e em quantidades insuficientes, o que tem causado o adoecimento e a morte de vários animais e prejuízos aos produtores rurais. Durante a audiência de conciliação, realizada no dia 24/09/2021 pela juíza Marcela Decat (2a Vara de Mariana), foram relatados também a prática de coerção por funcionários da Renova para que os atingidos alterassem a modalidade de fornecimento de alimento in natura para pecúnia, atrasos, interrupção e suspensão no fornecimento de alimentação sem que a Fundação Renova apresente justificativa da medida ao(à) atingido(a), e  consideração de inelegibilidade, por parte da Renova, dos descendentes dos animais atingidos e dos animais substituídos para recebimento de alimento. Nessa audiência foi construído um acordo em que as empresas se comprometeram a manter regularmente, em quantidade e qualidades suficientes, o fornecimento de alimentação para os animais dos atingidos, inclusive aqueles que são descendentes dos animais atingidos e nasceram depois do rompimento da barragem, bem como os substituídos a partir da data da audiência, em qualquer circunstância, até o respectivo reassentamento e/ou retomada produtiva; também se comprometeram a  garantir aos atingidos a livre escolha pela prestação da alimentação dos animais in natura ou em pecúnia, e a conceder um prazo de 90 (noventa) dias aos atingidos que assinaram o termo de adesão ao recebimento em pecúnia, para optarem pela modalidade que desejarem. Além disso, segundo o acordo, se o atingido decidir alterar a modalidade do fornecimento de alimentação para os animais, as empresas têm o prazo máximo de 60 (sessenta) dias corridos para iniciar o fornecimento, devendo, nesse período, continuar com a prestação definida anteriormente; as empresas se comprometeram a melhorar os canais de atendimento, identificar e afastar os funcionários da Fundação Renova que estão abordando os atingidos para informar que a entrega de alimentação aos animais seria obrigatoriamente substituída por pecúnia e, no prazo de trinta dias corridos, justificar nos autos a interrupção ou a suspensão do fornecimento de alimentação para os animais dos atingidos. Porém, os compromissos firmados no acordo do dia 24 de setembro não vêm sendo cumpridos pela Fundação Renova e os animais continuam adoecendo e morrendo, como denunciaram atingidos e assessoria técnica em reportagem do G1 publicada no dia 26 de outubro de 2021.

 

ASSESSORIAS TÉCNICAS

 

Embora Mariana tenha passado por um processo diferente de implementação de assessoria técnica, que aconteceu em 2016, no contexto da Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público Estadual, o direito à Assessoria Técnica Independente foi reconhecido para todas as comunidades atingidas da bacia do Rio Doce no final de 2017, através do Aditivo ao Termo de Ajustamento Preliminar (TAP). Até a data de atualização desta ficha, foram implementadas apenas 5 assessorias: Cáritas (Mariana); AEDAS (Barra Longa); Rosa Fortini (Rio Doce, Santa Cruz do Escalvado e distrito de Chopotó - Ponte Nova); ASPERQD (Território Quilombola de Degredo); e IPAZ (Território Indígena Krenak). A contratação da AEDAS também precedeu a assinatura do Aditivo ao TAP, enquanto a Rosa Fortini foi implementada em 2018, mas de forma paralela aos acordos assinados entre instituições de justiça e empresas.

Segundo o que foi previsto no Aditivo ao TAP e no TAC Governança, o Fundo Brasil de Direitos Humanos organizou o processo de escolha das entidades que prestariam assessoria aos atingidos. As comunidades atingidas foram organizadas em 18 territórios, tendo os processos de escolha ocorrido entre o final de 2018 e meados de 2019, conforme relatado no site do Fundo Brasil. A escolha das entidades foi homologada pela 12ª Vara da Justiça Federal em Minas Gerais em audiência judicial realizada no dia 19 de setembro de 2019 (JUSTIÇA FEDERAL, 2019). Na mesma ocasião, o MPF abriu mão dos embargos de declaração interpostos contra a decisão que estabeleceu as “ressalvas judiciais" sobre as assessorias técnicas e o juiz autorizou a contratação imediata das entidades. No entanto, as empresas apresentaram diversas discordâncias com relação aos Planos de Trabalho das assessorias e, apesar das alterações feitas pelas entidades e o Fundo, as contratações não ocorreram e as negociações extrajudiciais foram  encerradas em dezembro de 2019 (JUSTIÇA FEDERAL, 2021). Com a judicialização dos Eixos Prioritários, o juiz convocou, em janeiro de 2020, as empresas para que se manifestassem sobre a contratação das entidades. Nos autos, Samarco, Vale e BHP defenderam que as assessorias atuassem por apenas dois anos e não pudessem “executar” ações de reparação, como a revisão do cadastro, a construção de matrizes de danos, nem pudessem realizar estudos com dados primários que poderiam contrastar com os estudos feitos pela Renova. Também foram apresentados aos autos os Planos de Trabalho construídos pelas entidades selecionadas junto das comunidades, Fundo Brasil e Ministério Público,  que previam um prazo de 4 anos de assessoria, com a possibilidade de contratação de produtos (consultorias) para realização de atividades de formação sobre direitos humanos, sociais e econômicos e de estudos que auxiliassem no reconhecimento das afetações. Além da diferença dos escopos e prazos, as empresas propunham uma quantidade muito inferior de pessoal, número de sedes e valores para execução das atividades de assessoria  ao que fora planejado pelas entidades.

Diante da negativa da Samarco, Vale e BHP em consolidar a contratação das entidades e da não-decisão do judiciário sobre o tema, a comissão de atingidos de Degredo (Território 17), junto da ASPERQD, abdicou do Plano de Trabalho apresentado nos autos pelo MPF e iniciou, com autorização do juiz, negociação direta com as empresas. Nas negociações, o prazo que prevaleceu foi aquele de dois anos, defendido pelas empresas, tendo o acordo para a contratação da ASPERQD sido homologado e bastante elogiado pelo juiz da 12ª Vara (JUSTIÇA FEDERAL, 2020c). Após esse acordo, o MPF propôs novas revisões nos Planos de Trabalho das demais entidades que reduziram o número de programas e pessoal com base na assessoria de Degredo, mesmo assim, não houve acordo com as empresas. Com a delonga do tempo para contratação das entidades, os Krenak, junto ao IPAZ,  também saíram do processo de negociação coletiva e ajustaram seu Plano de Trabalho de acordo com algumas exigências das empresas, tendo o juiz homologado o novo plano e decidido sobre algumas questões de dissenso, como os honorários dos assessores (JUSTIÇA FEDERAL, 2020d).

Os planos de trabalho das assessorias previam a contratação de uma auditoria independente para acompanhar os trabalhos a serem desenvolvidos, no entanto, o juiz decidiu que essa fiscalização seria realizada por um perito judicial por ele indicado. Inicialmente, o juiz sinalizou pela contratação da AECOM, todavia, com a impossibilidade dessa empresa de iniciar imediatamente o trabalho de perícia, a 12ª Vara designou a Kearney para realizar auditoria financeira e finalística das assessorias (JUSTIÇA FEDERAL, 2020c, 2020d, 2020e, 2020f). Os valores da auditoria foram contestados pelas empresas, tendo a execução da primeira fase (primeiros três meses) do trabalho de fiscalização da ASPERQD um valor de R$ 2.388.782,00. Esse valor foi aprovado pelo juiz, que justificou que o trabalho do perito não se reduziria a elaborar relatórios periódicos, se caracterizando na verdade como um acompanhamento permanente e em tempo real das assessorias, tendo o objetivo de fiscalizar e orientar o trabalho dessas, podendo a Kearney, inclusive, propor alterações no Plano de Trabalho.

Além da saída da ASPERQD e IPAZ das negociações coletivas dos Planos de Trabalho, algumas das comissões municipais de atingidos do Espírito Santo que inauguraram o Sistema Indenizatório Simplificado (São Mateus, Conceição da Barra, Baixo Guandu, Linhares e Aracruz) solicitaram a desconstituição das assessorias escolhidas através do Fundo Brasil. Essas comissões  argumentaram que o processo de escolha foi monopolizado, que a ADAI - entidade escolhida - nunca esteve presente nos territórios dando apoio às comunidades e que seus vínculos com o MAB não agradavam aos atingidos. Algumas dessas comissões manifestaram interesse em substituir a ADAI pela Universidade Livre do Meio Ambiente (UNILIVRE), solicitando ao juiz que pudessem iniciar o processo de negociação diretamente com as empresas, através do consórcio UNIFIA, do qual a UNILIVRE faz parte. Antes de se decidir, o juiz convocou audiências com as comissões para os meses de novembro e dezembro (JUSTIÇA FEDERAL, 2021).

No dia 04 de outubro de 2021 (JUSTIÇA FEDERAL, 2021), passados mais de dois anos da autorização para contratação das entidades, o juiz emitiu decisão deliberando sobre as discordâncias com relação aos Planos de Trabalho das assessorias técnicas. O juiz afirmou que as propostas das entidades estariam “superdimensionadas”, enquanto as das empresas estavam “subdmensionadas”. No entanto, grande parte das reivindicações das empresas foram atendidas pelo juiz, que ratificou o prazo de dois anos de assessoramento aos atingidos, e definiu que as chamadas atividades de “execução” como cadastramento e construção de matriz de danos junto aos atingidos não faziam parte do escopo das assessorias. Ficou decidido também que a contratação de consultorias (produtos) pelas assessorias técnicas seria atividade extraordinária que precisa passar pela aprovação prévia do juízo para ocorrer, não sendo permitida a destinação de recursos para realização de estudos com dados primários. Apesar de afirmar que a decisão estabeleceria um ponto intermediário entre as propostas das entidades escolhidas pelos atingidos e das empresas, o número de funcionários e de estruturas físicas (sede e bases de apoio) das assessorias definido pelo juiz foi muito mais próximo do que defendiam a Samarco, Vale e BHP. Por fim, o juiz designou novamente a Kearney para fiscalizar as assessorias e também para apurar denúncias feitas pelas empresas sobre supostas irregularidades na atuação da AEDAS, em Barra Longa.

PROCESSOS CONTRA A FUNDAÇÃO RENOVA

Passados cinco anos do rompimento da barragem de Fundão, os limites do processo de reparação ficaram evidentes na não concretização dos reassentamentos, na protelação das discussões sobre indenizações, no controle da Fundação Renova sobre o reconhecimento de atingidos, na não contratação das assessorias técnicas escolhidas nos 18 territórios de atuação do Fundo Brasil de Direitos Humanos, entre outros aspectos. Aliás, no final de 2020, a Samarco retomou suas operações.

Ante essa situação, o MP reagiu denunciando a Fundação Renova por propaganda enganosa, pedindo a suspensão do juiz da 12a Vara e pedindo a extinção da Fundação Renova pelo não cumprimento dos seus objetivos estatutários. No dia 28 de janeiro de 2020, o MPMG instaurou um Inquérito Civil (Inquérito Civil PJTF n. MPMG 0024.20.001180-7) para apurar problemas e irregularidades quanto à gestão e  à autonomia da Fundação Renova; além de descumprimento do TTAC e TAC Governança, especialmente aos programas,  e quanto à transparência das informações que devem ser prestadas sobre os afetados, entre outros.

Um ano depois, no dia 17 de fevereiro de 2021, a Força Tarefa Rio Doce (do Ministério Público Federal) enviou uma representação à Promotoria de Justiça de Tutela de Fundações*, acusando a Fundação Renova e solicitando providências administrativas e judiciais.

 

*Na estrutura dos Ministérios Públicos, existem divisões por área de atuação. O MPMG se divide em atuação cível, atuação criminal, defesa do cidadão, 2a instância, controle da constitucionalidade, conflitos de atribuições e centros de apoio operacional. Na área de defesa do cidadão é feita outra divisão, por temas, entre: Conflitos Agrários; Consumidor; Controle Externo da Atividade Policial; Crianças e Adolescentes; Direitos Humanos; Educação; Eleitoral; Fundações e Entidades de Interesse Social; Habitação e Urbanismo; Idosos; Inclusão e Mobilização Sociais; Meio Ambiente; Ordem Econômica e Tributária; Patrimônio Cultural; Patrimônio Público; Pessoas com Deficiência; Saúde; e Violência Doméstica Contra a Mulher. As Promotorias de Justiça de Tutela das Fundações estão inseridas no tema das Fundações e Entidades de Interesse Social. De acordo com a descrição feita no site do MPMG, “as fundações são permanentemente acompanhadas pelo Ministério Público, desde o seu nascimento até eventual morte jurídica, de forma judicial e extrajudicial. A atuação das Promotorias de Justiça de Tutela das Fundações do Estado de Minas Gerais está disciplinada na Resolução nº 30/2015”.

 

Em 24 de fevereiro de 2021,  a Promotoria de Justiça de Tutela de Fundações do MPMG encerrou o inquérito e ajuizou ação, apontando falta de autonomia e independência da Fundação Renova, além de práticas de desvio de finalidade, e pedindo a extinção da mesma (veja o processo aqui). A petição inicial foi sorteada e enviada à  5ª Vara Cível de BH. A União enviou pedido de liminar por conflito de competência ao Supremo Tribunal de Justiça, que em 24 de maio de 2021 resolveu a favor da competência da  12ª Vara da Justiça Federal de Minas Gerais.

Menos de um mês depois de ser conhecida essa petição inicial, houve decisão do Juiz da  12ª Vara da Justiça Federal de Minas Gerais,  em resposta a um pedido da Advocacia Geral da União, de criação de um Eixo Prioritário destinado a auditar e reorganizar a Fundação Renova, e de concentrar toda ação vinculada ao TTAC ou TAC Govenança na  12ª Vara (na contramão da estratégia recente do MP, tanto nesta petição inicial como na ação sobre propaganda enganosa, de conseguir tramitar em outra jurisdição).

 

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Assim, os problemas da Fundação Renova ficaram na órbita do Eixo 13 do juiz da  12ª Vara da Justiça Federal de Minas Gerais (criado em 16 de março de 2021 a pedido da Advocacia Geral da União), que resolveu considerá-la uma instituicao sui generis, ou seja, “de propósito vinculado e específico ao atendimento do interesse público federal, sujeita a uma disciplina legal própria”. O juiz, então, contratou a Kearney como perito judicial para realizar um diagnóstico independente em um prazo de 180 dias. Definiu que o processo de repactuação dos programas socioeconômicos e socioambientais, previsto no TTAC e no TAC Governança, aconteceria pela via judicial, que tem a competência exclusiva; convocou o Comitê Interfederativo (CIF) a apresentar proposta de remodelação em 90 dias e deferiu a intervenção da Fundação Renova até a apresentação de um relatório preliminar da Kearney, com prazo de 90 dias.

 

NEGOCIAÇÃO DA REPACTUAÇÃO NO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

 

O Observatório Nacional sobre Questões Ambientais, Econômicas e Sociais de Alta Complexidade e Grande Impacto e Repercussão, dependente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP),  foi instituído pela Portaria Conjunta nº 1/2019 e, desde então, acompanha os mais de 90.000 processos judiciais que compõem o “Caso Barragem Mariana”. Em abril de 2021, por iniciativa do juiz da 12ª Vara da Justiça Federal de Minas Gerais, Dr. Mário Paula de Franco Jr, o CNJ recebeu os governadores de Minas Gerais e Espírito Santo para “permitir que os governadores também falem dos impactos que estão sentindo”. Nessa audiência, transmitida pelo YouTube em  06 de abril de 2021, os governadores reclamaram do “modelo de governança" que havia sido criado para o desastre do Rio Doce e se manifestaram a favor de um acordo nos moldes do desastre da Vale na bacia do Paraopeba. Najla Lamounier, Diretora Jurídica de Riscos da Samarco, disse ver “com bons olhos a proposta de repactuação dos programas que foram previstos no TTAC”. Ao término dessa audiência, o ministro Fux afirmou que: “O STF pode homologar um grande acordo que seja satisfatório para todos os interessados e eu me disponho a presidir essa grande conciliação (...) Minha mensagem é para que instrumentalizem quais são as dificuldades para que nos possamos sentar numa mesa, aqui no STF, e sair daqui um grande acordo que resolva definitivamente essa tragédia que representou Mariana”.

Entre 06 de abril e 1º de junho, foram realizadas 10 reuniões entre o CNJ, o setor público e o setor privado. Assim, na segunda audiência com governadores, em 1º de junho de 2021, a conselheira Maria Tereza Uille disse que “foram construídas propostas de premissas, tanto pelo lado do setor privado como pelo lado do setor público e agora nós estamos numa fase quase final de consolidação disso, faltando muito pouco para dizer das premissas colocadas, quais são as premissas nas que existe consenso, consenso com destaque de alguns pontos ou dissenso”. Nessa segunda audiência participaram o Presidente do CNJ, Ministro Luiz Fux; a conselheira Ma. Tereza Uille; o Dr. Juiz da 12ª Vara, Mário de Paula Franco Jr.; o Advogado Geral da União (AGU), André Mendonça; o Governador do Espírito Santo, Renato Casagrande; o Governador de Minas Gerais, Romeu Zema; o Presidente do TJMG, desembargador Gilson Soares; um representante do TJES; o Procurador Geral de Justiça de Minas Gerais (PGJ-MG), Jarbas Soares; o Procurador de Justiça do ES; Procurador Geral da República (PGR), Augusto Aras (problemas de conexão), e a Diretora de Riscos Jurídicos da Samarco, Najla Lamounier. Todos os participantes se ouviram e concordaram em caminhar juntos até um novo acordo, nos moldes de Brumadinho. Finalmente, em 22 de junho de 2021 deram a conhecer a carta com 10 premissas que orientarão o novo acordo

Nesse contexto, em 10 de agosto de 2021, o CNJ publicou um edital de convocação para a realização de três audiências públicas para oitiva das pessoas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão, as quais aconteceram nos dias 10 de setembro e 6 de outubro de 2021 e no dia 4 de fevereiro de 2022. Todas as audiências foram marcadas por queixas dos atingidos sobre o pouco tempo de fala (de apenas 5 minutos), a falta de garantia no cumprimento dos acordos já assinados e a demora na contratação das assessorias técnicas já escolhidas. Além disso, as enchentes de janeiro de 2022 afetaram novamente a muitos produtores, depositando lama nos seus terrenos. As maiores preocupações foram sobre a qualidade da água, a retomada dos modos de vida das populações afetadas e a exigência de aceitar quitação total para indenização através do Sistema Novel.

  

IV. 7 ANOS DE DESASTRE: PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS DE NOVEMBRO DE 2021 A NOVEMBRO DE 2022
REPACTUAÇÃO

Durante a primeira metade de 2022, a "repactuação" foi frequentemente apresentada como inexorável pela mídia e por representantes  do poder público. Ao longo desse mesmo ano, as negociações com vistas a um novo acordo final entre as empresas, os governos de Minas Gerais e Espírito Santo, as instituições de justiça e representantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) transcorreram com  a mediação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A proposta era definir um valor global a ser pago pelas empresas, transformando sua "obrigação de fazer" em "obrigação de pagar". O montante final seria destinado aos estados, prefeituras e atingidos para a gestão da própria reparação. Por essa via, as empresas  obteriam a quitação final de suas responsabilidades para com o desastre.

 No entanto, a negociação foi sigilosa e nunca foram divulgados os valores discutidos nas audiências públicas realizadas ou nas atas de reuniões. Desse modo, muitos pontos ficaram obscuros: por exemplo, quem seria responsável por gerir os fundos e o que aconteceria com a Fundação Renova e os compromissos assumidos por ela.

         Em março de 2022, os atingidos de Mariana receberam a visita da “Comissão Externa de Acompanhamento e Fiscalização da Repactuação do acordo referente ao crime ambiental da Samarco/Vale/BHP Billiton, em novembro de 2015” (instalada em 1 de dezembro de 2021, por Req 1954/2021). Na ocasião, a Comissão de Atingidos pela Barragem de Fundão (CABF) e sua assessoria técnica, Cáritas, entregaram aos deputados um documento com "Considerações para a continuidade da reparação em Mariana (MG)", em que elencaram 93 diretrizes pendentes, organizadas em quatro eixos: reconhecimento e garantia de direitos, reparação dos territórios atingidos, moradia digna, e trabalho e renda.  

Pouco depois, no mês de maio, representantes da Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Sociais (Cimos) e promotores do MPMG convocaram os atingidos de Mariana para a elaboração de uma proposta no âmbito da repactuação. O objetivo da proposta era transformar  as pendências de reparação identificadas em valores monetários passíveis de serem levados à mesa de negociação. Naquele contexto, o novo acordo deveria ser alcançado antes de 30 de junho de 2022 devido às restrições eleitorais que impediriam a execução dos recursos provenientes da reparação pelos governadores ( Resolução TSE 23.610). 

Além das restrições eleitorais, foram emitidas novas  decisões judiciais entre as quais se destaca a designação de um  novo juiz federal responsável pelo caso, Michael Procopio Ribeiro Alves Avelar, da 4ª Vara de Belo Horizonte (MG). O novo juízo sentenciou que as indenizações no âmbito do Novo Sistema Indenizatório Simplificado deveriam ser consideradas como um pagamento mínimo, sem  quitação final. Ademais, os atingidos que aderissem ao Novel  poderiam também recorrer às instâncias judiciais no exterior (como no caso da ação movida contra a BHP Billiton no Reino Unido) e não teriam o pagamento do Auxílio Financeiro Emergencial (AFE) interrompido.

Denunciando que as empresas propunham um valor muito baixo a ser executado ao longo de dez anos, em 8 de setembro de 2022, os governos de Minas Gerais e Espírito Santo, os Ministérios Públicos (Federal e Estaduais) e  as Defensorias Públicas (da União e dos Estados) enviaram um ofício ao CNJ destacando que não havia consenso e solicitando o encerramento formal das negociações no âmbito da repactuação. Em outubro, o novo juiz determinou que as assessorias técnicas independentes iniciassem imediatamente seus trabalhos junto às comunidades atingidas. Caso a contratação se concretize, se abre a possibilidade de uma nova repactuação, com participação dos atingidos organizados em Comissões Locais e com apoio de organizações escolhidas por eles, nos termos previstos originalmente no TAC Governança de 2018.

  

BARRETOS

Barretos (ou Barreto, como é comumente chamado por seus moradores) é uma das comunidades atingidas pelos rejeitos da barragem da Samarco, carreados através do rio Gualaxo do Norte desde o rompimento. São frequentes, por exemplo, os relatos de moradores que desenvolveram problemas de saúde após o contato com a lama, como manchas e feridas na pele, coceiras, dores de cabeça e até mesmo perda de cabelo. Além disso, os atingidos narram a perda do rio, agora contaminado pelos rejeitos, onde já não é mais possível nadar, pescar, dar de beber para os animais e nem mesmo plantar em suas margens. 

No entanto, as reivindicações dos moradores da comunidade foram obliteradas no processo de reparação, principalmente pelas empresas responsáveis pelo desastre, permanecendo invisibilizadas neste processo até 2022. De fato, a comunidade de Barretos possui uma especificidade que impõe diferenças marcantes no seu processo de reparação face às comunidades vizinhas: apesar de integrar o município de Barra Longa (MG), Barretos está geograficamente próximo a Campinas, um subdistrito de Águas Claras, pertencente a Mariana e com o qual a comunidade desenvolveu laços históricos. Ou seja, essa localização singular entre limites administrativos reflete em distinções processuais no que se refere à reparação, pois enquanto esse processo no município de Barra Longa é conduzido pela Justiça Federal, as ações e acordos que tramitam na Comarca local de Mariana são válidas apenas para o território de Mariana. Soma-se a isso a relação historicamente frágil entre esta comunidade rural e a Prefeitura de Barra Longa, ausente no cotidiano dos moradores. Desse modo, são frequentes as queixas em relação à demora no reconhecimento dos danos, à ausência do acompanhamento sistemático de uma assessoria técnica independente, ao não atendimento de demandas e  cortes no auxílio financeiro emergencial e no fornecimento de alimentação para os animais.

A fim de visibilizar seus pleitos, moradores de Barretos, em diálogo com outras comunidades atingidas, contactaram o Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (GESTA/UFMG), que iniciou visitas à localidade em 2020 a fim de contribuir para a construção conjunta de estratégias de incidência política dos atingidos no processo de reparação. Uma das vias selecionadas foi a ampliação da interlocução com os agentes institucionais, em especial, o Ministério Público Federal. Em abril de 2022, a convite do GESTA-UFMG, uma representante da Força-Tarefa Rio Doce esteve em Barretos. Na ocasião, as principais demandas da comunidade foram expostas em uma reunião coletiva, na qual foi solicitado o acompanhamento sistemático da Procuradoria da República em relação às reivindicações de reparação apresentadas à Fundação Renova e à prefeitura municipal de Barra Longa. A partir dos encaminhamentos dessa reunião preliminar, representantes da Fundação Renova e da Prefeitura Municipal realizaram, em 2022, a primeira reunião de caráter coletivo na localidade, após anos de ausência ou de atuação exclusiva por via de negociações privadas.

 

 

V. 8 ANOS DE DESASTRE: PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS EM 2023

 

CONTINUIDADE DAS DISPUTAS PELO CADASTRAMENTO DOS ATINGIDOS EM MARIANA

 

O cadastramento em Mariana foi iniciado em fevereiro de 2018, após um longo processo de revisão dos instrumentos e metodologias propostas para a identificação das vítimas e levantamento dos danos.  O questionário fora discutido e revisto a partir das reivindicações dos atingidos. Ele era aplicado pela Fundação Renova e contava com o acompanhamento da assessoria técnica que, posteriormente, com a adição de recursos complementares ao cadastramento, introduziu ainda a tomada de termo e a cartografia social. Contudo, em fevereiro de 2020, apesar da existência de reivindicações para realização de cadastramento junto a novos demandantes, havia a oposição da Fundação Renova e das empresas responsáveis pela continuidade da aplicação do cadastro. Em 07 de fevereiro de 2023, em reunião realizada em Mariana, representantes da Fundação Renova estimaram que 1.073 solicitações de cadastramento não poderiam ser efetivadas, conforme o procedimento original adotado. Tendo em vista tais divergências quanto ao cadastramento, fora sentenciado que os novos cadastros não poderiam ser conduzidos com o protocolo anterior, que contava com a participação da assessoria técnica. Dessa forma, os novos cadastros são realizados pela Fundação Renova, que adotou metodologia própria, impossibilitando que haja isonomia em comparação ao processo de cadastramento realizado anteriormente. Segundo o representante da Fundação, o cadastramento deve ser realizado apenas para as pessoas que solicitaram cadastro pelos Canais de Relacionamento da Renova até o dia 31/12/2021, e que não foram cadastradas anteriormente.

 

 

REPACTUAÇÃO

 

Após serem suspensas durante o período eleitoral em 2022, as negociações para o possível acordo final de reparação foram retomadas. Em 2023, a Casa Civil do Governo Federal coordenou, junto com a Advocacia Geral da União, um grupo de trabalho (GT) composto por 14 ministérios envolvidos na repactuação. Ademais, foram contactados pesquisadores de Universidades e Institutos Federais, parlamentares, representantes de movimentos sociais e eclesiais, além das Assessorias Técnicas Independentes, no intuito de colaborarem com as ações do GT. Ao longo de 2023, as negociações pela repactuação foram conduzidas pelo Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6). 

 

Entretanto, o debate para a construção dos termos do acordo permanece restrito aos segmentos do Estado e agentes corporativos, sem a efetiva participação dos atingidos. 

 

Ao longo do mês de julho, a Secretaria-Geral do Governo Federal realizou nove encontros em territórios atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão. Os encontros tinham como objetivo debater os espaços e mecanismos de participação social para o novo acordo. A equipe do Gesta esteve presente no primeiro deles, realizado em Mariana no dia 14/07. Nessa ocasião, participaram representantes da Secretaria-Geral da Presidência, do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, do Ministério da Saúde, da Secretaria de Comunicação Social, da Cáritas, do MAB e da CABF, além de dezenas de atingidos de diferentes localidades. Os atingidos se mostraram divididos quanto à repactuação: enquanto alguns confiam no processo, outros reforçam a ineficiência de todos os acordos estabelecidos com as empresas desde o rompimento. 

 

No mês seguinte, em agosto deste ano, a Secretaria-Geral da Presidência entregou ao desembargador Ricardo Rabelo, do Tribunal Regional da 6ª Região (TRF-6), um relatório com propostas sobre a participação social dos atingidos (Brasil, 2023). 

Em coletiva de imprensa realizada na Casa de Cultura de Mariana, no dia 01/11/2023, os membros da Comissão de Atingidos pela Barragem de Mariana (CABF) manifestaram ceticismo em relação à repactuação. Membros da Comissão da comunidade de Paracatu de Baixo refletiram que o primeiro acordo  (TTAC) não foi cumprido e não houve sequer punições: “Se sair o segundo acordo, a repactuação, a única certeza que todos tem é que foi bom para as mineradoras, pois ninguém assina um acordo que se auto-prejudique”, avaliou o representante da comunidade. 

Por fim, no dia 05 de dezembro, as negociações para a repactuação foram novamente suspensas. Em uma Nota Conjunta do Poder Público (assinada pelos governos Federal, de Minas Gerais e do Espírito Santo, pelas Defensorias Públicas da União e dos dois estados, bem como pelos Ministérios Públicos Federal e estaduais), a suspensão é justificada em função da proposição por parte das empresas de valores considerados insuficientes para  a reparação do Rio Doce. Diante da negativa quanto à revisão do montante proposto, o valor de R$42 bilhões, ofertado pelas mineradoras, foi rejeitado pelo poder público, dada sua divergência em relação aos R$126 bilhões solicitados (Jornal Folha 1, 2023).

 

PROCESSO DE MARIANA PASSA A FAZER PARTE DA 4ª VARA FEDERAL

 

Diferentemente do restante da bacia do rio Doce, desde o rompimento da barragem, as ações relacionadas ao caso no município de Mariana vêm sendo julgadas pela Comarca local por meio de uma Ação Civil Pública própria (ACP de Mariana - processo nº 0043356-50.2015.8.13.0400). Entretanto, tendo em vista as negociações para a composição do acordo final, em fevereiro de 2023, o juízo do caso  (à época, o Juiz Michael Procopio Ribeiro Alves Avelar), decidiu pela competência exclusiva e definitiva da Justiça Federal na condução dos processos coletivos. A justificativa para a mudança está atrelada ao julgamento de conflito de competência entre as esferas estadual e federal. Com efeito, o processo que tramitava na esfera local por meio da 2ª Vara Cível, Criminal e de Execuções Penais da Comarca de Mariana passou a ser julgado pela 4ª Vara Federal Cível e Agrária da Subseção Judiciária de Belo Horizonte (antiga 12ª Vara Federal de Minas Gerais).

 

Diante disso, a magistrada até então responsável pelo caso em Mariana, recorreu da decisão federal, argumentando que após 7 anos e o estabelecimento de inúmeros acordos coletivos no âmbito da ACP de Mariana, a mudança poderia acarretar atrasos adicionais nas indenizações e na reparação do direito à moradia. Além disso, o entendimento é que a mudança resultaria na falta de isonomia entre os atingidos já indenizados e aqueles que aguardam decisão (Minas Gerais, 2023). 

 

No curso das discussões,  sentenças emitidas pela 4ª Vara já apresentam repercussões para a reparação em Mariana, a exemplo da Decisão (ID 1481569373) de 25/01/2024 relativa à indenização por danos morais coletivos de caráter extrapatrimonial. Na referida sentença, para a qual ainda cabe recurso, houve a condenação das empresas rés ao pagamento de 47 bilhões e seiscentos milhões de reais em indenização pelos danos morais coletivos, "em razão da violação de direitos humanos nas comunidades atingidas" (Brasil, 2024, p. 35). O valor será destinado ao fundo previsto pela Lei 7.347/85 e deverá ser utilizado exclusivamente, segundo a decisão, nas áreas impactadas pelo rompimento da barragem de Fundão. 

 

AÇÕES NA INGLATERRA

 

Em 2018, um escritório de advocacia internacional moveu, na corte britânica, uma ação contra a BHP Billiton, pois é em Londres onde se localiza o escritório central desta mineradora. Segundo informações veiculadas na mídia, os atingidos(as) de toda bacia do Rio Doce poderiam ingressar no processo que, em caso de sucesso, irá indenizar as vítimas do rompimento de Fundão no exterior (Drumond, 2018).

 

No dia 08 de abril de 2022, atingidos de Mariana foram convidados pelo escritório que está movendo a ação na Inglaterra para acompanhar uma audiência em Londres. Lá foi realizado um ato, em frente ao tribunal, contra a falta de justiça e reparação após anos de desastre (Silva et al, 2022).

 

Em primeira instância, o juiz inglês da corte de justiça cível de Manchester considerou que seria um abuso de jurisdição julgar a BHP em concomitância às possíveis condenações no Brasil. Entretanto, após apelações por parte dos advogados, o Tribunal em Londres aceitou a jurisdição e o caso está em julgamento também na Inglaterra (G1 Vales de Minas Gerais, 2022). A justiça inglesa deverá determinar a responsabilidade das empresas sobre os danos causados pelo desastre.

 

Nos dias 12 e 13 de julho de 2023, lideranças das comunidades atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão participaram de outra importante audiência em Londres. Mais uma vez, manifestações ocorreram com o intuito de dar visibilidade ao caso e de exigir medidas efetivas de reparação. A audiência em questão teve como objetivo tratar do pedido da BHP de incluir a Vale no processo de reparação, de modo que as empresas repartam eventual condenação na ação coletiva. No dia 07 de agosto, a decisão proferida pelo judiciário inglês foi de que a Vale é parte do processo (Machado, 2023; Moreira, 2023).

 

A ação movida contra a Vale e a BHP Billiton foi tema de audiência pública na Câmara dos Deputados no dia 20 de setembro de 2023. A audiência foi mobilizada pela Comissão Externa para Fiscalização dos Rompimentos de Barragens e Repactuação (Couzemenco, 2023). Em 2023, a ação ainda aguarda um julgamento final. 

 

CAMPANHA “REVIDA MARIANA”

 

Poucas semanas antes do marco de 8 anos do rompimento da barragem de Fundão, atingidos(as) da Bacia do Rio Doce - incluindo indígenas, quilombolas e comunidades ribeirinhas -, além de apoiadores, se uniram para o lançamento da campanha “Revida Mariana: justiça para limpar essa lama”. A campanha tem como objetivo chamar a atenção da sociedade, nacional e internacional, sobre os danos acarretados pelo desastre  e pressionar para que medidas de  responsabilização e reparação sejam efetivamente tomadas (Leitão, 2023). 

 

Segundo Leitão (2023), o MAB é o responsável pela mobilização da campanha cujo objetivo é “dar visibilidade à luta das milhares de vítimas que continuam sofrendo a devastação deixada pelas mineradoras responsáveis pelo desastre”. 

 

É possível matar dezenas de pessoas, arrasar a vida de outras milhares, contaminar um rio, destruir a fauna e a flora em mais de 46 cidades e ainda assim ficar impune?”. Essa é a pergunta presente logo na primeira página do site “Revida Mariana”. Em outubro de 2023, mais de 100 entidades brasileiras e internacionais já haviam assinado o manifesto da campanha (Revida Mariana, 2023).

 

A campanha “Revida Mariana” publica materiais audiovisuais, incluindo vídeos com o depoimento de atingidos e declarações de apoio de  artistas e influenciadores digitais. O material produzido expõe em diversas redes sociais as afetações vivenciadas nas áreas atingidas pelo rompimento de Fundão. 

 

 

PROCESSO CRIMINAL 

 

A denúncia instaurada pelo Ministério Público Federal (MPF), em outubro de 2016, acusou 22 pessoas físicas e 4 pessoas jurídicas por crimes ligados ao rompimento de Fundão, que incluíam homicídio qualificado, inundação, desabamento, lesões corporais, crimes ambientais e apresentação de laudo ambiental falso. No entanto, em 2019, as acusações de homicídio e lesões corporais foram retiradas do processo criminal pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), com a justificativa de que as mortes foram consequências da inundação pelo rompimento (Brasil, 2023). 

 

Após 8 anos de desastre, a Justiça brasileira começou a interrogar, pela primeira vez, os réus desse processo. Importa considerar  que há apenas 7 pessoas físicas e 4 pessoas jurídicas (Samarco, Vale, BHP e VogBr - empresa que emitiu o laudo de estabilidade da barragem) ainda acusadas por crimes ligados ao rompimento da barragem de Fundão (Brasil, 2023). 

 

As audiências de julgamento se iniciaram no dia 06 de novembro de 2023, isto é, um dia após o marco anual do rompimento. A previsão era de que o interrogatório dos réus se encerrasse no dia 13 de novembro (Brasil, 2023). No entanto, a previsão atual é que a sentença seja proferida no segundo semestre de 2024 (Alvim et al , 2023).

 

ENTREGAS NOS REASSENTAMENTOS  

 

Com obras ainda em andamento nos reassentamentos das comunidades de Bento Rodrigues e de Paracatu de Baixo, as chaves para entrega de algumas moradias, a princípio concluídas, foram repassadas aos atingidos pela Fundação Renova. Segundo reportagem do Jornal O Tempo, dos 248 imóveis que devem ser construídos no novo Bento Rodrigues, 168 estão finalizados e apenas 53 foram entregues (Gurgel, 2023). 

 

Com o recebimento das chaves, as famílias atingidas deixarão de receber o auxílio-moradia repassado pela Renova desde a perda dos seus lares nas comunidades de origem. Em reunião acompanhada pela equipe do Gesta, em maio de 2023, na qual estavam presentes atingidos da comunidade de Paracatu de Baixo, assessores da Cáritas e representantes da Fundação Renova, foram relatados casos de famílias que aceitaram a oferta do recebimento das chaves sem a devida ciência das implicações. Prevalece um contexto de inconclusão dos reassentamentos, em meio à continuidade das obras que causam transtornos às famílias já realocadas. Também são recorrentes os relatos de rachaduras, janelas emperradas, vaso sanitário entupido, infiltração e outros tantos problemas estruturais nas casas entregues às famílias.

 

Ademais, há preocupações quanto às possibilidades de reconstituição do antigo modo de vida cujas atividades produtivas garantiam a oferta e diversidade de alimentos , além de autonomia na produção e circulação dos produtos familiares. Entre as condições que prejudicam a retomada produtiva, estão a declividade dos terrenos e a falta de acesso à água bruta. 

 

Outro motivo de preocupação para as famílias atingidas é a transferência das aulas para as escolas construídas nos reassentamentos. Desde o segundo semestre de 2023, os alunos da Escola Municipal de Bento Rodrigues começaram as aulas nas novas instalações no reassentamento. Já os alunos da comunidade de Paracatu de Baixo permanecem na escola improvisada no bairro Barro Preto, na sede de Mariana, com a previsão de mudança para o reassentamento no primeiro semestre de 2024.

 

Em coletiva de imprensa ocorrida no dia 01 de novembro na Casa de Cultura de Mariana, uma liderança da comunidade de Bento Rodrigues fez um breve relato sobre as dificuldades que os alunos  enfrentaram com o início das aulas na escola do reassentamento. De acordo com a liderança, a escola está funcionando dentro de um canteiro de obras e o Ministério Público tentou impedir a situação, mas sem sucesso. Os transtornos ligados ao deslocamento dos alunos da sede de Mariana e de outros distritos rurais para o reassentamento foram também mencionados, ressaltando os riscos relacionados ao trânsito. 

 

 

ENCERRAMENTO DO SISTEMA INDENIZATÓRIO SIMPLIFICADO

 

O magistrado Vinicius Cobucci, que assumiu a 4ª Vara Federal Cível e Agrária da Subseção Judiciária de Belo Horizonte (antiga 12ª Vara Federal de Minas Gerais), decidiu em agosto de 2023 pelo encerramento do Sistema Indenizatório Simplificado em toda a bacia do rio Doce. O sistema, também conhecido como Novel, já vinha sendo alvo de críticas por diversos atores, sobretudo pelo Ministério Público Federal, desde sua criação. Para o juiz Vinicius Cobucci, o Novel “apresenta sinais claros de esgotamento e padece de nulidades absolutas” relativas, sobretudo, à legitimidade de algumas comissões  locais para a representação dos atingidos (Angelo, 2023). Por esses motivos, a decisão determina o encerramento do ingresso de novos atingidos no sistema a partir de 29 de setembro de 2023. 

 

AMEAÇA DE FINALIZAÇÃO DOS TRABALHOS DA  CÁRITAS 

 

Diante da possibilidade de encerramento das atividades de Assessoria Técnica Independente (ATI) realizada pela Cáritas Brasileira Regional Minas Gerais no município de Mariana, a Comissão de Atingidos pela Barragem de Fundão (CABF) iniciou uma mobilização intitulada “Manifesto pela permanência da Assessoria Técnica Independente para as pessoas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão em Mariana - MG”. 

 

São inúmeros problemas enfrentados pelas comunidades atingidas, em meio a um desastre que segue reproduzindo e agravando padrões de vulnerabilização. Os atingidos lidam com a impossibilidade de retomada plena de suas atividades econômicas, com o desabastecimento hídrico, a contaminação do solo e da água, problemas relacionados à saúde, entre outros danos permanentes. Nesse contexto, a continuidade das atividades  da assessoria mostra-se fundamental.

 

Após mobilizações por parte dos atingidos e da assessoria, no dia 18/12, foi publicada uma decisão em que o judiciário da 4ª Vara Cível e Agrária de Belo Horizonte determinou a continuidade do trabalho da Cáritas em Mariana por mais três meses, até março de 2024 (Cáritas, 2023). 

 

ATIVIDADES DOS 8 ANOS

 

Do dia 01 ao dia 09 de novembro de 2023 foram realizadas atividades ligadas ao marco de rememoração do rompimento com a campanha intitulada “Mariana 8 anos: A reparação na balança das Geraes”. A programação contou com coletiva de imprensa, atos religiosos nos territórios de origem, mostra de documentários e rodas de conversa. 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS 

ALMEIDA, A. “A gente entende que, enquanto no mínimo mais de 50% da comunidade escolar não voltar, a escola deveria continuar aqui”. Jornal A Sirene. 5/11/2023. Disponível em:https://jornalasirene.com.br/educacao/2023/11/05/a-gente-entende-que-enquanto-no-minimo-mais-de-50-da-comunidade-escolar-nao-voltar-a-escola-deveria-continuar-aquil

ALVIM, C. E. et al . Tragédia em Mariana: última oitiva de réu é interrompida por causa de fumaça no prédio da Justiça. G1 . 13/11/23. Disponível em: https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2023/11/13/tragedia-em-mariana-oitiva-de-reu-e-interrompida-por-causa-de-fumaca-no-predio-da-justica.ghtml

A Sirene, Jornal. Por: MENEGHIN, Guilherme de Sá. Direito de Entender: A terra prometida. Ed. 46 (Fevereiro/2020). Disponível em: https://issuu.com/jornalasirene/docs/edi__o_46_-_fevereiro_de_2020_issuu. Acesso em março de 2020.

A Sirene: Para não esquecer, Jornal. Edição 17. Agosto de 2017.

 

A  Sirene: Para não esquecer, Jornal. Edição 46, fevereiro de 2020.

 

AGÊNCIA BRASIL. Mariana: 83 famílias afetadas por rompimento de barragem fazem acordo. Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2019-07/mariana-83-familias-afetadas-por-rompimento-de-barragem-fazem-acordo. Acessado em: agosto de 2019

ARQMARIANA. Ocupação no escritório da Renova em Mariana termina com vitória dos atingidos. Disponível em: https://arqmariana.com.br/noticia/3083/ocupacao-no-escritorio-da-renova-em-mariana-termina-com-vitoria-dos-atingidos. Acessado em: março de 2020

 

ANGELO, M. Observatório da Mineração. Estado de Minas Gerais aprova a volta das atividades da Samarco. 25 de outubro de 2019.  Disponível em:  https://observatoriodamineracao.com.br/estado-de-minas-gerais-aprova-a-volta-das-atividades-da-samarco-vale-bhp/?fbclid=IwAR2uJmkDWwUa2kM2UAG1jsulCJViuXSW5SkdfT-oN9IjvWyd9VLMaWSDJS8

 

ANGELO, M. Sistema indenizatório adotado por Renova/Samarco/Vale/BHP no desastre de Mariana “padece de nulidades absolutas”, decide justiça. Observatório da Mineração. 01/08/23. Disponível em: https://observatoriodamineracao.com.br/sistema-indenizatorio-adotado-por-renova-samarco-vale-bhp-no-desastre-de-mariana-padece-de-nulidades-absolutas-decide-justica/ 

 

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JUSTIÇA FEDERAL. Decisão do PJE Nº 1000504-03.2020.4.01.3822 ("BARRA LONGA"). CASO SAMARCO (DESASTRE DE MARIANA) TRAMITAÇÃO CONJUNTA - AUTOS PRINCIPAIS: 69758-61.2015.4.01.3400 (PJE 1024354-89.2019.4.01.3800) e 23863- 07.2016.4.01.3800 (PJE 1016756-84.2019.4.01.3800) e Autos Físicos 10263- 16.2016.4.01.3800, 2020a.

JUSTIÇA FEDERAL. Decisão do processo 1010332-43.2020.4.01.0000. Processo de referência 1000260-43.2020.4.01.3800, 2020b.

JUSTIÇA FEDERAL. 12ª Vara Federal Cível e Agrária da SJMG. Decisão do processo nº 1003050-97.2020.4.01.3800 (Eixo Prioritário 10 - Contratação das Assessorias Técnicas). "CASO SAMARCO" (DESASTRE DE MARIANA) TRAMITAÇÃO CONJUNTA - AUTOS PRINCIPAIS: 69758-61.2015.4.01.3400 (PJE 1024354-89.2019.4.01.3800) e 23863-07.2016.4.01.3800 (PJE 1016756- 84.2019.4.01.3800) e Autos Físicos 10263-16.2016.4.01.3800, 06 de abril de 2020c.

JUSTIÇA FEDERAL. 12ª Vara Federal Cível e Agrária da SJMG. Decisão do processo nº 1003050-97.2020.4.01.3800 (Eixo Prioritário 10 - Contratação das Assessorias Técnicas). "CASO SAMARCO" (DESASTRE DE MARIANA) TRAMITAÇÃO CONJUNTA - AUTOS PRINCIPAIS: 69758-61.2015.4.01.3400 (PJE 1024354-89.2019.4.01.3800) e 23863-07.2016.4.01.3800 (PJE 1016756- 84.2019.4.01.3800) e Autos Físicos 10263-16.2016.4.01.3800, 14 de julho de 2020d.

JUSTIÇA FEDERAL. 12ª Vara Federal Cível e Agrária da SJMG. Decisão do processo nº 1003050-97.2020.4.01.3800 (Eixo Prioritário 10 - Contratação das Assessorias Técnicas). "CASO SAMARCO" (DESASTRE DE MARIANA) TRAMITAÇÃO CONJUNTA - AUTOS PRINCIPAIS: 69758-61.2015.4.01.3400 (PJE 1024354-89.2019.4.01.3800) e 23863-07.2016.4.01.3800 (PJE 1016756- 84.2019.4.01.3800) e Autos Físicos 10263-16.2016.4.01.3800, 08 de junho de 2020e.

JUSTIÇA FEDERAL. 12ª Vara Federal Cível e Agrária da SJMG. Decisão do processo nº 1003050-97.2020.4.01.3800 (Eixo Prioritário 10 - Contratação das Assessorias Técnicas). "CASO SAMARCO" (DESASTRE DE MARIANA) TRAMITAÇÃO CONJUNTA - AUTOS PRINCIPAIS: 69758-61.2015.4.01.3400 (PJE 1024354-89.2019.4.01.3800) e 23863-07.2016.4.01.3800 (PJE 1016756- 84.2019.4.01.3800) e Autos Físicos 10263-16.2016.4.01.3800, 05 de julho de 2020f.

JUSTIÇA FEDERAL. 12ª Vara Federal Cível e Agrária da SJMG. Decisão do processo nº 1003050-97.2020.4.01.3800 (Eixo Prioritário 10 - Contratação das Assessorias Técnicas). "CASO SAMARCO" (DESASTRE DE MARIANA) TRAMITAÇÃO CONJUNTA - AUTOS PRINCIPAIS: 69758-61.2015.4.01.3400 (PJE 1024354-89.2019.4.01.3800) e 23863-07.2016.4.01.3800 (PJE 1016756- 84.2019.4.01.3800) e Autos Físicos 10263-16.2016.4.01.3800, 04 de outubro de 2021.

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[1] Processo no  0023863-07.2016.4.01.3800, atual PJe n  1016756-84.2019.4.01.380.

[2] Esse processo ensejou o TAP (assinado em 18-1-2017, homologado parcialmente em 16-3-2017), o Termo Aditivo ao TAP e o TAC Governança (assinado em 25-6-2018, homologado em 31-8-2018).

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