ÚLTIMA ATUALIZAÇÃO

19/08/2013

ATORES ENVOLVIDOS

Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG); CONAMA (Conselho Nacional de Meio Ambiente); FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente); Federação dos Pescadores de Minas Gerais; FUNDACENTRO (Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho); IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis); IEF (Instituto Estadual de Florestas); Justiça Federal; Ministério Público Federal (MPF); ONG S.O.S. São Francisco; Votorantim Metais.

MUNICÍPIO

Três Marias

CLASSIFICAÇÃO GERAL E ESPECÍFICA

Atividades Industriais (Mineração)
Atividades Industriais (Metalurgia / Siderurgia)

Atividades / Processos Geradores de Conflito Ambiental

Contaminação da água por metais pesados oriundos da atividade minerária.

Descrição do caso:
(população afetada, ecossistema afetado, Área atingida, histórico do caso)

 

Desde que a empresa Votorantim se estabeleceu na cidade de Três Marias, houve despejos de resíduos sem tratamento no córrego Consciência, afluente do rio São Francisco, onde já foi constatada a mortandade de um número muito elevado de peixes. Em 1983 foi construída a primeira barragem de rejeitos da empresa, às margens do rio São Francisco, onde, na época, existia uma lagoa marginal. Essa barragem, conhecida como Barragem Velha, foi construída em uma propriedade arrendada nas adjacências da empresa, tendo funcionado até o ano de 2001, período em que foi preenchida em sua totalidade. O enchimento total dessa barragem, seguido de diversos episódios de constatação de poluição dos vertedouros d’água em suas adjacências, acarretaram em uma participação mais ativa do órgão ambiental competente junto à Votorantim Metais, tendo este exigido a aquisição de uma nova localidade para a construção de um novo depósito para a alocação dos rejeitos químicos. Aliado ao preenchimento de sua capacidade foi comprovada, via parecer técnico, a inviabilidade de operação da barragem devido a sua localização. Desta forma, foi exigida a desativação da mesma pelos órgãos ambientais responsáveis, e determinada a construção de uma barragem nova.

 

De acordo com depoimento de um morador durante a oficina de atualização do Mapa dos Conflitos Ambientais – mesorregião Central Mineira e Oeste de julho de 2013, a obtenção do território onde foi estabelecida a nova Barragem Lavagem (segunda barragem) foi feita a partir de um arrendamento feito pela empresa com antigos moradores do local.

 

Uma família antiga que vendeu a terra da Barragem Lavagem. O terreno fica próximo à nossa propriedade, que também faz margem à Barragem Murici, que foi a última barragem feita pela Votorantim Metais. Quando nós compramos a fazenda havia um grande morro, e foi sugerido pelo antigo dono do local que não comprássemos a área, pois era improdutiva. Foi pensado a princípio realizar uma doação do local para uma criação de uma reserva, o que não foi feito. Adiante, a empresa negociou com o dono uma boa quantia de dinheiro para a construção da Barragem Lavagem. (Relato de morador de Três Marias na Oficina de Apresentação e Atualização do Mapa dos Conflitos Ambientais – mesorregião Central Mineira e Oeste de Minas. Belo Horizonte, julho de 2013).

 

Assim, a Votorantim Metais adquiriu o terreno, situado em uma área limítrofe ao córrego Lavagem, onde foi então, construída a Barragem Lavagem. O projeto foi apresentado e aprovado pelos órgãos ambientais competentes (IBAMA, FEAM e ANA), e obteve a Licença Prévia no ano de 2001. No entanto, uma gama de irregularidades foi percebida pelos próprios moradores do entorno já durante o período de construção da barragem, situação que resultou em denúncias recorrentes aos órgãos ambientais citados. De acordo com os moradores, esta nova barragem não oferecia garantias de operação, pois não estava sendo construída de acordo com o que foi apresentado no EIA-RIMA do projeto. A principal irregularidade percebida consistia na diminuição brusca da vazão do córrego a jusante, tendo este diminuído de tal forma que vazava entre 36 a 38 metros cúbicos de água por hora, tendo este filete a função de manter o córrego lavagem. Este fato obrigou a empresa a prover abastecimento de água através de caminhões pipa para as famílias que foram diretamente afetadas.  A barragem, por ter sido projetada no leito do rio, desviou por uma margem o córrego e aproveitou, indiscriminadamente, a sua bacia.

 

Em 2002 a Barragem Lavagem obteve a aprovação da Licença de Operação junto à FEAM. Em fevereiro do mesmo ano, ainda sem ter finalizado o projeto, a empresa obteve autorização para depositar produtos nesta nova barragem. Entretanto, a manta impermeabilizadora e o canal de cintura para desvio do córrego pelas margens, não foram feitos pelo empreendedor, conforme previsto no projeto de engenharia apresentado no EIA-RIMA. Segundo relato de moradores durante a Oficina de Atualização do Mapa dos Conflitos Ambientais – mesorregião Central Mineira e Oeste de 2013, uma semana após a colocação das primeiras toneladas de rejeito na Barragem Lavagem, o córrego lavagem já apresentava altos índices de contaminação. A barragem esteve em operação até o ano de 2011.

 

Episódios de contaminação das águas da região de Três Marias têm mobilizado movimentos sociais e associações locais no sentido de exigirem ações de reparação da área junto aos órgãos ambientais e à justiça. A ONG SOS São Francisco já entrou com uma ação na Justiça Federal contra o IBAMA, a FEAM, o IEF e a própria Votorantim, exigindo o ressarcimento pela mortandade dos peixes e outros danos ambientais. A justiça, contudo, pediu aos integrantes da ONG, que retirassem o nome do IBAMA do processo para que o julgamento dessa ação passasse para a justiça comum, porém, a organização não governamental impediu que isso ocorresse. (Relato do pescador e representante da ONG-SOS São Francisco, 2009). 

 

Essa mesma barragem também causou dano ao contaminar, por meio de infiltração, o córrego Espírito Santo, também afluente do rio São Francisco. Essa contaminação ainda se estendeu aos poços artesianos dos moradores do entorno. A poluição dos cursos d’água decorreu do lançamento dos seguintes metais pesados presentes nos rejeitos: chumbo, cádmio, zinco, manganês, cobalto, sulfato de alumínio, entre outros.

 

Em um artigo sobre a questão, publicado no site do Conlutas, datado de 08 de março de 2008, foi ressaltada a existência de diversos relatórios produzidos sobre a contaminação por metais pesados no município de Três Marias. No relatório produzido pelo SISEMA, foi constatado que o nível de zinco nas águas do córrego Consciência atinge o índice de 5.280 vezes acima do limite legal. O Cádmio apresenta uma quantidade 1140 vezes acima do permitido, o chumbo 46 vezes e o cobre 32 vezes acima do limite legal permitido pelo CONAMA. Além dos laudos técnicos, o artigo ainda salienta que qualquer pessoa pode constatar a presença de metais nas margens do rio. Nas margens do córrego Consciência, por exemplo, é possível coletar resíduos tóxicos no solo de suas encostas. Em exames realizados pela FUNDACENTRO na população local, foi constatada a contaminação por arsênio, manganês e zinco (CONLUTAS, 2008).

 

Pesquisas realizadas por grupo de geólogos e geográfos da Universidade Federal de Minas Gerais mostraram que o acúmulo de metais pesados lançados pela extinta Companhia Mineira de Metais seriam até os dias hoje responsáveis pela contaminação das águas do Rio São Francisco. Segundo estes pesquisadores a Votorantim Metais não lança metais pesados, e que os rejeitos lançados no passado formariam um "estoque de contaminação" constante para a água (ECO DEBATE, 2011). 

 

A empresa, conforme pode ser percebido pelo percentual de poluição apresentado por meio dos relatórios supracitados, já tentou algumas vezes burlar as normas de segurança para esses tipos de rejeitos e também as proibições às suas atividades, como por exemplo, construindo tubos secretos, que despejavam os resíduos diretamente no fundo do rio no período noturno para que ninguém percebesse. Para comprovar esses fatos, o morador afirma que existem relatos de mortandade freqüente de peixes nos córregos da região, assim como no rio São Francisco, que se encontra a apenas 8 km a jusante. Para dar continuidade ao descarte de resíduos, a Votorantim comprou, em 2005, uma área nas proximidades da sua antiga barragem e apresentou um projeto para desviar o córrego e fazer o isolamento do solo.

 

Em 2005, em função destas contaminações, a sociedade civil entrou com uma ação no Ministério Público Federal pedindo o embargue de operação da Barragem Lavagem caso não fosse resolvido os problemas de poluição por metais pesados. Em função da ação movida pela sociedade civil, o Ministério Público Federal celebrou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a empresa, tendo uma de seus condicionantes um prazo de sete anos para a retirada de 100% dos rejeitos presentes na Barragem Velha e Barragem Lavagem. Assim, a Votorantim Metais teria até o ano de 2012 para realizar a medida. Em função deste TAC, a empresa adquiriu um novo terreno para a construção do Depósito Murici (terceira barragem), localizado nas proximidades da Barragem Lavagem. O depósito Murici tem vida útil de 20 anos, e o projeto prevê a construção de três “baciões” impermeabilizados, em uma área aproximada de 45 hectares. De acordo com informações extraídas da Associação de Gestão de Bacias Hidrográficas Peixe Vivo:

 

A construção do Depósito Murici faz parte do Protocolo de Compromisso assinado em junho de 2005 com a Agência Nacional de Águas (ANA) e com a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD) para a solução dos passivos ambientais das barragens e também é uma condicionante da Licença de Operação da Unidade (Associação Executiva de Apoio à Gestão de Bacias Hidrográficas Peixe Vivo, 2010).

 

O Depósito Murici obteve Licença de Operação no ano de 2013, e a empresa já retirou 70% dos rejeitos presentes na Barragem Velha e 30% da Barragem Lavagem, além de ter depositado novas pilhas de rejeito provenientes da sua produção atual. A empresa conseguiu uma prorrogação do prazo de desativação plena da Barragem Velha e da Barragem Lavagem até o ano de 2015, entregando também, o córrego lavagem sem presença de resíduos químicos. Conforme relatado na Oficina de Atualização do Mapa dos Conflitos Ambientais de Minas Gerais realizada em Belo Horizonte, julho de 2013, a Votorantim já possui um plano de descontaminação da Barragem Velha. Entretanto, o mesmo planejamento não ocorreu em relação à Barragem Lavagem. A ineficiência na realização de ações práticas para descontaminação do local, segundo o relator, leva a crer que, a empresa não conseguirá retirar o rejeito da Barragem Lavagem até o prazo previsto, em 2015.

 

Em relação a problemas já constatados no Depósito Murici, moradores de Três Marias descobriram a existência de rumores por meio de trabalhadores da empresa de que têm ocorrido vazamentos na nova barragem. Seria necessária uma perícia pelos órgãos ambientais, pois a Votorantim Metais veta qualquer visita sem permissão judicial. Ainda sobre os possíveis perigos do depósito, indícios apontam para o armazenamento indevido de produtos químicos de alta letalidade. O empreendimento ainda não possui licença para a criação de um depósito para o acondicionamento devido, sendo o produto estocado em um canto do lote da empresa e coberto por uma lona plástica. Nas palavras do relator:

 

Teve uma época que eles pegaram esses rejeitos letais e despejaram no córrego consciência, e muitas pessoas responsabilizam a empresa pela mortandade de peixes no ano de 2005. Sabe-se também que o córrego da Matinha, que está nas proximidades do córrego Murici, hoje já está seriamente comprometido pela poluição. Até porque grande parte do deslocamento de terra nas suas proximidades já desceu córrego abaixo acarretando assoreamento, e este córrego possui extensão de 3 quilômetros e é afluente direto do Rio São Francisco. Embora o depósito Murici tenha sido começado a construção 200 metros afastado da cabeceira deste córrego, hoje pode se dizer que a base do aterro já está junto à nascente do córrego. Dentre os córregos afetados, há de se lembrar também do córrego Retiro Velho, que fica na outra margem, que, caso o vazamento do depósito Murici exista, este córrego também está condenado à poluição em breve. (Relato obtido na Oficina de Atualização do Mapa dos Conflitos Ambientais, mesorregião Central Mineira e Oeste. Belo Horizonte, julho de 2013).

 

Em relação à participação da sociedade civil nas etapas de licenciamento da Barragem Lavagem e do Depósito Murici, a única barragem em que houve consulta à população, a partir de audiência pública, foi o projeto do Depósito Murici. De acordo com o relator, durante a realização de uma audiência pública, os moradores contrários à empresa não tiveram direito à fala:

 

Solicitamos uma audiência para falar sobre os problemas mas não deixaram a gente explicar. Quando chegamos, a audiência ocorrendo em um clube, estava um tanto de faixas apoiando a Votorantim, nós fomos chamados de "vermes" porque estávamos querendo fechar a fabrica, tivemos que ir na Câmara explicar a razão do protesto contra a empresa, chegaram até a desligar nosso microfones na hora de nossas falas. Então eles colocaram as faixas nos muros, os lojistas apoiando a Votorantim, porque o pessoal trabalha, tem muito pessoal da cidade que trabalha lá né? Somente na audiência de Murici que aí o Ministério acatou tudo e nós podemos participar, mas não tivemos muita força pois já estava tudo resolvido, já ia construir, já estava tudo adquirido. (Relato obtido na Oficina de Atualização do Mapa dos Conflitos Ambientais – mesorregião Central Mineira e Oeste de Minas. Belo Horizonte; julho de 2013).

 

Fonte(s):  

 

ASSOCIAÇÃO EXECUTIVA DE APOIO À GESTÃO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS PEIXE VIVO. O Depósito Murici da Votorantim Metais de Três Marias já está com 56% de suas obras concluídas. 2010. Disponível em: <http://www.agbpeixevivo.org.br/index.php/noticias/50-noticias-externas/257-o-deposito-murici-da-votorantim-metais-unidade-tres-marias-ja-esta-com-56-das-obras-concluidas.html>. Acesso em 19/08/2013.

 

CONLUTAS. Grupo Votorantim causa desastre ecológico em Minas Gerais. Maio de 2008. Disponível em: <http://conlutas.org.br/site1/exibedocs.asp?id=1068&pagina=40>, consultado em 02/07/2010. 

 

ECO DEBATE. Votorantim continua causando morte no rio São Francisco, denúncia de Frei Gilvander Moreira. Outubro de 2009. Disponível em: http://www.ecodebate.com.br/2009/10/06/votorantim-continua-causando-morte-no-rio-sao-francisco-denuncia-de-frei-gilvander-moreira/. Acesso em: 02/07/2010. 

 

ECO DEBATE. Pesquisas mostram contaminação por metais pesados no Rio São Francisco. Fevereiro de 2011. Disponível em: http://www.ecodebate.com.br/2011/02/09/pesquisas-mostram-contaminacao-por-metais-pesados-no-rio-sao-francisco/. Acesso em: 31/08/2011.

 

MANUELZÃO. Morrem os peixes, ficam as versões. Março de 2006. Disponível em: <http://www.manuelzao.ufmg.br/assets/files/revista/jornal-34.pdf> Consultado em 02/07/2010. 

 

Relato de proprietário atingido pela barragem da Votorantim na Oficina Cidadania a Justiça Ambiental / Central Mineira e Oeste de Minas. Contagem. Nov/2009.

 

Relato do pescador e representante da ONG-SOS São Francisco, na Oficina Cidadania e Justiça Ambiental – Central Mineira e Oeste de Minas. Betim, novembro de 2009.

 

Relato de morador Oficina de Atualização do Mapa dos Conflitos Ambientais de Minas Gerais / Mesorregião Central Mineira e Oeste. Belo Horizonte, julho de 2013.

 

VOTORANTIM. Disponível em: <http://www.votorantim.com.br/en-US/Pages/Home.aspx>. Consultado em 02/07/2010.