ÚLTIMA ATUALIZAÇÃO

28/06/2013

ATORES ENVOLVIDOS

CComissão Interestadual Parlamentar de Estudos para o Desenvolvimento Sustentável da Bacia do Rio Doce (CIPE Rio Doce); Associação Comunitária de Barra do Manhuaçu (ACOBAMA); Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG); VALE; Ministério Público Estadual de Minas Gerais (MPE/MG); Ministério Público Federal (MPF) de Governador Valadares; Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA); Associação dos Proprietários Rurais Atingidos pela Usina Hidrelétrica de Aimorés (APRAPUHA); Associação dos Pescadores de Resplendor (APERDOCE); Associação dos Moradores de Itueta; Comunidade Indígena Krenak; Fundação Nacional do Índio (FUNAI); Centro de Apoio Técnico (CEAT) do MPE/MG; Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB); Prefeitura Municipal de Itueta; Câmara Municipal de Itueta; Prefeitura Municipal de Aimorés; Polícia Militar de Meio Ambiente de Minas Gerais (PMMA); Polícia Rodoviária Estadual de Minas Gerais; população atingida pela UHE Aimorés dos municípios de Resplendor, Itueta e Aimorés.

MUNICÍPIO

Aimorés, Itueta, Resplendor

CLASSIFICAÇÃO GERAL E ESPECÍFICA

Infra-Estrutura (Energia)

Atividades / Processos Geradores de Conflito Ambiental

Hidrelétrica (UHE)

Descrição do caso:
(população afetada, ecossistema afetado, Área atingida, histórico do caso)

Com licença de operação deferida em 2005, a Hidrelétrica Eliézer Batista, mais conhecida como UHE Aimorés, atingiu três municípios em Minas Gerais (Resplendor, Itueta e Aimorés), além de Baixo Guandu, no Espírito Santo, onde já existe a UHE Mascaranhas. Sua implantação gerou diferentes conflitos ambientais em decorrência de alterações físicas no curso do rio Doce e de problemas relacionados ao cumprimento de condicionantes do  licenciamento ambiental.

 

Operada pelo consórcio CEMIG/VALE, a construção da barragem foi desde o início motivo de vários questionamentos. Um dos pontos em questão foi a alteração do projeto inicial, que modificou a localização da barragem e da casa de força da hidrelétrica, inicialmente planejadas para serem construídas no estado do Espírito Santo. O argumento utilizado para justificar tal alteração foi o de que o aproveitamento energético seria pequeno; contudo, a mudança no projeto acarretou em um aumento de 2200 hectares da área alagada, aproximadamente três vezes além do planejado, segundo o presidente da Associação dos Proprietários Rurais Atingidos pela Usina Hidrelétrica de Aimorés, a APRAPUHA (SÉCULODIÁRIO, 2006). Esse aumento implicou no alagamento total da cidade de Itueta, que foi reconstruída em outro local, sendo necessário remover toda a população urbana do município.

 

Outro fato apontado foi a permissão dada pelo IBAMA para o aumento da cota altimétrica da represa, que de 88 metros passou para 90 metros, atingindo também um número maior de proprietários rurais da região. A cota de segurança do município de Resplendor seria de 94 metros: "O risco para a comunidade é certo. Foi determinada a construção de bombas para esgotamento das águas. Mas elas um dia vão falhar, com toda certeza. E haverá alagamento” (SÉCULODIÁRIO, 2006).  

 

As alterações do projeto contribuíram para os vários e significativos impactos ambientais gerados pelo empreendimento, que atingiu, em Minas Gerais, distintos grupos sociais da região que têm no Rio Doce a sua base de existência econômica e cultural. 

 

Em setembro de 2005 houve uma série de reuniões da Comissão Interestadual Parlamentar de Estudos para o Desenvolvimento Sustentável da Bacia do Rio Doce (CIPE Rio Doce) nos municípios mineiros atingidos pela UHE Aimorés. Foram ouvidas queixas sobre os problemas que estavam ocorrendo desde o início das obras, em 2000, entre eles: proliferação de insetos transmissores de doenças e destruição de habitat da fauna aquática do Rio Doce; a assimetria no tratamento e indenização dos atingidos de Aimorés; desrespeito dos representantes do Consórcio junto aos atingidos de Resplendor; críticas aos métodos utilizados para a remoção dos moradores da cidade de Itueta, com promessas - não cumpridas - para que os moradores deixassem suas casas mais rapidamente; e vários outros questionamentos e dúvidas não esclarecidas pelos representantes do Consórcio. Alguns atingidos alegaram que tiveram suas vidas destruídas pela hidrelétrica (ALMG, 2005).

 

No caso de Itueta, a implantação da UHE Aimorés deixou a antiga cidade completamente submersa, sendo construída uma “nova” Itueta. O local de realocação da cidade foi escolhido pelos moradores entre três propostas pelo Consórcio. Para viabilizar a construção da nova cidade, foram adquiridas 14 propriedades rurais, negociação que se deu de forma amigável em alguns casos e de forma judicial em outros. Alguns moradores de Itueta, mesmo após a mudança para a nova cidade, não receberam as escrituras de suas casas (MINAS GERAIS, 2007). Além disso, do total de trabalhadores rurais – estimado em 225 pessoas – somente 30 foram assentados e 20 indenizados (MINAS GERAIS, 2007). As doceiras de Itueta, que há anos vendiam seus produtos na antiga estação ferroviária, também foram prejudicadas com o alagamento da cidade. Apesar de o consórcio ter oferecido às doceiras a construção de uma fábrica, elas rejeitaram a proposta, solicitando ao consórcio indenização monetária pela perda da renda com a venda dos doces. Até hoje elas não foram indenizadas e estão aguardando na justiça a solução do caso.

 

As primeiras chuvas enfrentadas por esses moradores revelaram a infra-estrutura precária da nova cidade, pois ocorreram enchentes que invadiram as casas. Em janeiro de 2008, devido às fortes chuvas do período, ocorreu o transbordamento e o rompimento de uma barragem de contenção de chuvas construída pelo consórcio CEMIG/VALE na nova cidade de Itueta, causando prejuízos aos moradores do entorno pelo alagamento de suas casas (MINAS GERAIS, 2008).

 

Em pesquisa de campo na cidade de Itueta (2009), pôde-se verificar a situação de alguns moradores após a construção da nova cidade. O presidente da associação dos moradores de Itueta questionou o processo de realocação dos moradores, muitos ainda não possuem a escritura de suas propriedades, além do fato de que muitas casas têm apresentado rachaduras em sua estrutura. Segundo o presidente, devido à necessidade de enchimento do reservatório, os representantes do consórcio agiram apressadamente para retirar a população da antiga cidade, não respeitando o tempo necessário para o aterramento da área. Isso faz com que, em algumas partes da cidade, o terreno sofra rebaixamentos, gerando os danos à estrutura das moradias. Existem também críticas às compensações dadas aos moradores, as quais beneficiaram grupos mais influentes em detrimento de parte mais simples da população.

 

Uma antiga moradora afirma que o principal impacto da usina foi a quebra das relações sociais entre os habitantes de Itueta; locais e práticas sociais dos moradores foram destruídos, além de haver problemas internos entre os atingidos, devido às assimetrias nos benefícios das compensações.

 

A situação dos moradores de Resplendor também causa preocupação. O enchimento do reservatório trouxe impactos significativos para os pescadores do rio Doce no município. Segundo o presidente da associação dos pescadores de Resplendor (APERDOCE), muitas espécies de peixes, como o Cascudo e a Traíra, desapareceram, o que desestabilizou a atividade pesqueira no município. Ainda segundo o presidente da APERDOCE, antes de 2005 era possível pescar aproximadamente 20 quilos de Cascudo por noite, mas atualmente “a vida no rio Doce acabou”.

 

Sobre as estratégias utilizadas pelo Consórcio durante as negociações, o representante dos pescadores afirmou que houve muita pressão sobre os atingidos, com o intuito de acelerar a inauguração da usina, não se havendo a preocupação com os impactos socioambientais que seriam provocados. O presidente da APERDOCE disse que foi pressionado por representantes do Consórcio para sair do barracão onde morava para viabilizar a construção de uma estrada. Após negociar um barracão novo, ele aguarda por mais de seis anos que o consórcio cumpra o acordo.

 

Segundo os pescadores da região, é com muita dificuldade que se vive da pesca em Resplendor após a construção da usina. A empresa tentou, via condicionantes para mitigação dos impactos aos pescadores, introduzir outras espécies de peixes no rio. Porém, essas espécies possuem pouco valor comercial. Além disso, os pescadores receberam como indenização cartas de crédito destinadas apenas à compra de barcos a motor e outros equipamentos.

 

Outro problema que afeta a pesca é o lançamento de esgoto no rio. Apesar de ter sido construída uma ETE como condicionante do licenciamento ambiental, nem todas as residências foram ligadas às novas redes coletoras, havendo ainda esgoto sendo lançado no rio. Com o enchimento do lago, as águas do Doce que corriam em Resplendor estão paradas, ocasionando sua contaminação pelo esgoto.

 

Muitas das condicionantes relacionadas a obras de urbanização do município não foram cumpridas. A questão do esgoto, segundo um membro do STR de Resplendor, constitui em uma das grandes reclamações a respeito da barragem. Ele alega que o sistema de tratamento do esgoto foi construído com material de baixa qualidade e não atende a todas as residências da cidade. Como o esgoto se acumula no lago existe incômodo com a proliferação de insetos e com o mau cheiro.

 

Outro problema se liga à remoção de famílias das margens do Doce. O membro do STR de Resplendor informou que um bairro novo, Antônio de Matos, foi construído para a realocação de famílias, mas estas ainda não obtiveram a escritura dos imóveis. Da mesma forma, representantes do Consórcio prometeram terras a algumas pessoas que trabalhavam como meeiros em propriedades atingidas pelo enchimento do reservatório; contudo, esses trabalhadores também não possuem a titulação das propriedades. Alguns optaram por indenizações em dinheiro.

 

Em determinado momento do processo de licenciamento da usina, a cota altimétrica foi alterada (de 88 metros para 90 metros) sem consulta à população, como prevê a Resolução do CONAMA (nº 009 de 03/12/1987). Assim, não houve demarcação da área de segurança para a cota de 90 metros na área indígena dos Krenak, que já estava situada na zona de influência da usina com a cota de 88 metros.

 

Em entrevista com membros da etnia Krenak em julho de 2009, foi dito que a comunidade não foi devidamente consultada durante o início do processo de licenciamento da UHE Aimorés. No início do licenciamento ambiental, alguns pesquisadores estiveram na comunidade, mas não informaram que estavam coletando dados para produção do EIA/RIMA da usina. As terras dos Krenak que estão na área de influência do empreendimento foram negligenciadas no EIA/RIMA.

 

O estudo da área indígena contida no EIA/RIMA negou que a UHE iria atingir a comunidade, o que foi questionado pelo MPF. A antropóloga contratada para a realização de tal estudo afirma ter sofrido pressões para que seu trabalho concluísse que o empreendimento não causaria qualquer tipo de impacto ao território Krenak (MPF, 2007b). Após a construção da barragem é que a comunidade tomou consciência de todo processo.

 

O MPF instaurou uma Ação Civil Pública para apurar os danos morais causados aos Krenak, determinando o pagamento de indenização aos indígenas. Posteriormente foi realizado um parecer de valoração econômica com o objetivo de quantificar os danos causados aos Krenak e, assim, estabelecer as indenizações a serem pagas. Foi firmado um TAC, no qual a empresa deveria realizar estudos ambientais complementares.

 

Com o início das negociações e a falta de um acordo entre as partes, os Krenak decidiram, em dezembro de 2005, fechar a ferrovia Vitória-Minas, da VALE, como forma de protesto contra a empresa. Os indígenas alegaram que a VALE tem atuado historicamente contra os Krenak na região, e exigiram que a empresa retomasse o diálogo com a comunidade sobre os impactos da UHE, além da demarcação da área do Parque Estadual dos Sete Salões como território Krenak. A ação teve o apoio de outras etnias indígenas de Minas Gerais e do Espírito Santo (CIMI, 2005).

 

Após um longo processo em que o Consórcio propunha medidas compensatórias que foram rejeitadas pelos índios, houve o acordo entre o grupo indígena, o consórcio VALE/CEMIG e o MPF, encerrando a Ação Civil Pública. Foi definido no acordo que o Consórcio pagaria à comunidade 10 milhões de reais através da implementação de projetos sociais, de pecuária e de recuperação ambiental, bem como cestas básicas e valores em dinheiro. Porém, várias irregularidades foram apontadas pelos índios em relação ao acordo firmado, como a péssima infra-estrutura dos currais, das áreas de pastagens, cercas e estradas de acesso, assim como a pulverização de agrotóxicos nas plantações de cana-de-açúcar – utilizada para alimentar o gado – e até a condição dos gados fornecidos.

 

Segundo um representante dos Krenak, projetos de auto-sustentabilidade são propostos para a comunidade, mas antes da construção da usina as práticas dos Krenak já eram sustentáveis, afirmando também que o funcionamento da usina alterou as práticas ancestrais de pesca no rio Doce, além de terem afetado a relação sagrada dos Krenak com o rio.

 

De acordo com o promotor de justiça de Resplendor, em julho de 2009, ainda existem muitos fatos relacionados aos impactos gerados pela usina a serem averiguados. O MPE havia solicitado uma diligência ao Centro de Apoio Técnico (CEAT) do MPE/MG para investigar diversos pontos críticos do caso, que vão desde os impactos ambientais gerados pela UHE Aimorés até o não-cumprimento de condicionantes do licenciamento ambiental.

 

Em relação ao município de Aimorés, os principais atingidos pela construção da barragem foram os pescadores e os agricultores das ilhas do Rio Doce. Um pescador da cidade de Aimorés informou que nas primeiras audiências públicas em Aimorés a possibilidade de secamento do trecho do rio Doce que passa pelo município sempre era colocada pela população. Porém, os empreendedores alegavam que não haveria impactos para os pescadores e sempre prometiam melhorias - como a de que o lago da usina seria rico em pescado - durante as várias reuniões realizadas entre o consórcio, os pescadores e o MPE. Na opinião do pescador, essas promessas fizeram com que, até o término da construção da UHE Aimorés, não houvesse questionamentos mais rígidos contra a usina. Outro ponto mencionado pelo pescador foi sobre os “royalties” prometidos para o município, utilizado como argumento favorável inclusive pelo poder público para aceitação da barragem nas audiências. 

 

Também foi informado que, durante as abordagens iniciais dos representantes do Consórcio da UHE Aimorés, o mesmo pescador contribuiu para o mapeamento e a identificação de todos os pescadores da região, acreditando que o Consórcio iria incorporar ao projeto as características da pesca local. Contudo, posteriormente a empresa chegou a contrapor algumas informações passadas por ele.

 

Em meados do ano de 2000, iniciou-se a construção da barragem, primeiramente, com o desvio do rio Doce acima da cidade de Aimorés, na altura da Pedra Lorena. Esse desvio foi feito com a utilização de explosivos, o que impediu a pesca nessa parte do rio durante a construção da hidrelétrica. Após esse fato, os pescadores pediram um auxilio financeiro pelo tempo em que ficaram impossibilitados de pescar, o que foi negado pelo Consórcio, gerando indignação e grandes prejuízos.

 

Após três anos de negociações, foi oferecida pelo Consórcio a alguns pescadores a quantia de R$ 11.500,00 via carta de débito para a compra de barcos e equipamentos, não dando liberdade para os pescadores decidirem o que fazer com as indenizações. Também foi relatado sobre a desigualdade nas indenizações pelo Consórcio - produtores rurais teriam recebido quantias muito superiores do que as recebidas pelos pescadores. Além disso, houve um aumento de pessoas que se declaravam pescadores, muitos interessados em ganhar com indenizações. Isso levou a conflitos entre os pescadores locais, causando impactos nas relações sociais da classe. Houve conflitos até nas relações familiares.

 

As alterações no rio e os impactos às espécies de peixes levaram também à alteração no tipo da pesca, sendo que os equipamentos tradicionalmente utilizados pelos pescadores perderam sua utilidade. Os pescadores tiveram sua área de pesca reduzida a 1/3 com o desvio do rio, sendo obrigados a pescar em uma área sem condições de segurança e sem ter conhecimento de como lidar com essas alterações. Outro fator que prejudicou a pesca foi o fechamento de algumas estradas de acesso ao rio Doce, fazendo com que os pescadores tivessem de andar cerca de dez quilômetros para poder pescar. Os problemas foram levados à Justiça, mas até a data do relato nenhuma resposta foi dada.

 

A sobrevivência através da pesca após a chegada da barragem acabou. Com a construção da UHE Aimorés, houve uma grande mortandade de peixes, registrada em um filme produzido sobre a barragem. As denúncias feitas na época ao IBAMA não surtiram efeito; o órgão apenas lavrou multas que não se sabe se foram pagas. O pescador informou que o EIA/RIMA da UHE Aimorés já descrevia a mortandade de peixes como impacto da obra.

 

A ACOBAMA procurou o MPF devido ao desaparecimento dos peixes de maior valor econômico e a inundação de ilhas que serviam para cultivos de subsistência, após a implantação da Usina. Depois do represamento, os gastos da comunidade aumentaram. No ano de 2008, o nível da água do reservatório foi rebaixado para facilitar a passagem de sedimentos, gerando mais riscos e prejuízos para os pescadores, como atolamento dos barcos e retenção dos peixes na lama, novamente inviabilizando a atividade pesqueira em tal período.

 

De acordo com o pescador, há um sentimento de injustiça e abandono por parte dos pescadores, devido à perda e às alterações de seu território e da atividade pesqueira.

 

Em setembro de 2009, o MPF obteve uma decisão judicial que obrigou o consórcio formado pela CEMIG e VALE a pagar a quantia de um salário mínimo mensal a cada pescador do município de Resplendor. Tal decisão fez cumprir uma outra decisão judicial de 2008. Segundo o MPF, “os 23 pescadores estão em estado famélico e ao desamparo, enquanto um consórcio composto por duas das maiores empresas do país se esconde em subterfúgios para descumprir a decisão judicial que os ampara” (AMARNATUREZA, 2009). O fornecimento de salário mínimo e cestas básicas era uma das condicionantes estabelecidas pelo IBAMA, mas que não foi cumprida pelo consórcio, que também foi condenado por litigância de má-fé.

 

No mesmo ano, o MPF ajuizou outra ação contra o consórcio da UHE Aimorés, desta vez por improbidade administrativa. Na ação, também foram acusados o prefeito e o presidente da câmara dos vereadores de Itueta, por conluio para o descumprimento de uma das condicionantes da licença de Operação da barragem, que determinava a reconstrução do trecho da estrada Beira-Rio, alagada com a construção da UHE Aimorés (JUSBRASIL, 2009).

 

Já em março de 2010, durante as comemorações do dia internacional de luta contra as barragens, um ônibus que saia de Itueta com destino a Aimorés foi impedido pela Polícia Militar de Meio Ambiente e pela Polícia Rodoviária Estadual de atravessar a rodovia que liga os dois municípios. Os policiais argumentaram que o grupo de atingidos que estavam no ônibus levava risco à UHE Aimorés. Porém, os atingidos estavam a caminho do acampamento de Aimorés, onde iriam realizar, junto ao INCRA, o cadastro das famílias atingidas pela barragem que ainda não foram assentadas. Com a interdição da estrada, o ônibus teve que realizar um desvio que aumentou o trajeto em cerca de 70 quilômetros. O MAB lançou uma nota de repúdio ao Consórcio CEMIG/ VALE e a Polícia Rodoviária e de Meio Ambiente sobre o fato.

 

Segundo informações da FEAM, obtidas em reunião da Comissão Interestadual Parlamentar de Estudos sobre a Bacia Hidrográfica do Rio Doce (CIPE Rio Doce) em 2004, existiam cerca de 90 empreendimentos hidrelétricos na bacia do Rio Doce com requerimento de licenciamento ambiental. Considerando todos os problemas ainda indefinidos gerados pela construção da UHE Aimorés, esses dados causam preocupação diante do descaso dos empreendedores e de órgãos públicos, além dos impactos socioambientais causados apenas por um empreendimento.

  

Durante oficina de atualização do Mapa dos Conflitos Ambientais de Minas Gerais, realizada em Governador Valadares em 13 de abril de 2013, um representante da Colônia de Pescadores Z-19 ressaltou o impacto das hidrelétricas, em particular a UHE Aimorés, sobre a biodiversidade da região. Ele relatou que a introdução de peixes feita como compensação aos impactos da UHE Aimorés não foi precedida de um estudo específico da bacia do Rio Doce. Ele afirmou que o empreendedor utilizou um estudo ambiental de outra bacia hidrográfica, uma vez que a biodiversidade relatada não condizia com a realidade local. Isso gerou a proliferação de espécies de peixes não nativas e a extinção, ou quase extinção, de espécies nativas, como o piau. O pescador chamou atenção para a ausência de peixes no rio em função também dos agrotóxicos que contaminam a água. Ele relatou que ao longo do ano mantas de lodo são formadas no rio e o lago torna-se um grande depósito de lodo: “Se você for a um lago como o do Salto Grande, uma região sem muitas cidades, esse lodo não é encontrado, sendo essa uma evidência de influência da ação humana no processo. No Rio Doce, isso acontece com grande intensidade. No período de chuvas, essa manta se dissolve” (Pescador da Colônia Z-19, Oficina, 13 de abril de 2013).

 

Outro pescador, na mesma oficina (13 de abril de 2013), relatou que atualmente não são todos os pescadores que recebem a compensação no valor de um salário mínimo mensal, como determinado pela ação judicial. Alguns estão movendo processos em diversas instâncias para conseguir seus direitos.

 

Ele reafirmou a recorrência da proliferação das algas no período da seca e acrescentou que a água fica completamente impotável e as pessoas não podem tomar a água da COPASA.  Além disso, denunciou que em Resplendor os moradores já pagam uma taxa para o tratamento do esgoto, mas que o serviço só será, de fato, iniciado em 2014 ou 2015. Segundo o relator, o projeto teria ainda irregularidades, uma vez que o esgoto está sendo retirado a 15 metros de onde a água é bombeada. Os moradores de Resplendor estiveram em uma reunião com o MPF, em dezembro de 2012, para tratar dessas questões, mas ainda aguardam por um encaminhamento pelo órgão. O morador ainda mencionou que haveria planos para construção de outra barragem na região. Sobre a existência desses planos, o representante da FUNAI em Governador Valadares informou que seriam, de fato, duas barragens chamadas Krenak e Resplendor, e que a FUNAI precisaria emitir parecer sobre a questão indígena na área de impacto para que o empreendimento seja construído (o componente indígena do EIA-RIMA).  Entretanto, aproximandamente 20 dias antes daquela oficina a FUNAI teria recebido um comunicado do empreendedor (CEMIG), informando a suspensão dos planos de construção das barragens.

 

Uma representante do STR de Coroaci ressalta que os conflitos relatados anteriormente sobre a UHE AImorés ainda permanecem. Integrantes do Movimento dos Atingidos por Barragens teriam informado que o terreno destinado para reassentar famílias em Itueta ainda não havia sido completamente negociado. Muitas famílias não teriam os documentos das casas, mas apenas o Contrato de Comodado. Ela afirmou ainda que quando as famílias saem para denunciar as ações da empresa, sofrem ameaças (Oficina, 13 de abril de 2013).

 

Segundo depoimento de outro pescador, “antes da construção da barragem os pescadores costumavam dividir áreas para pescar no rio Doce” (Oficina, 13 de abril de 2013). Ou seja, cada pescador tinha sua área de pesca em uma faixa específica do rio, e outro pescador em outra. Historicamente falando, esses combinados eram rigorosamente cumpridos entre s pescadores, sendo esta prática iniciada pelos seus parentes mais remotos. Entretanto, a diminuição da vazão do rio e o aumento da mortandade de peixes desestabilizou este sistema, e acabou por minar as relações tradicionais entre os comunitários, tendo alguns se desligado de ações e reuniões nas associações comunitárias. Essas reuniões tinham, por função, discutir formas de reduzir os passivos gerados pelo empreendimento no período pós-concessão de Licença de Operação (LO) para encaminhamentos junto ao MP. Para o pescador, “o que mais angustia a todos é a sensação de ansiedade, pois nunca recebemos a resposta dos processos judiciais em andamento” (Oficina, 13 de abril de 2013).

 

Fonte(s):

 

AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. Processo nº 48500.004042/04-21 – Voto. Disponível em: <http://www.aneel.gov.br/cedoc/areh2006295_1.pdf>. Acesso em: 07/06/2010.

 

ALMG. Atingidos por barragens reúnem-se em Aimorés, Itueta e Resplendor. Set/2005.

 <http://amarnatureza.org.br/site/mpf-obtem-decisao-que-obriga-consorcio-uhe-aimores-a-cumprir-decisao-judicial-em-favor-de-pescadores-de-resplendor,9882/>. Acesso em: 16/06/2011.

 

 BRASIL DE FATO. Mulheres ocupam por 12 horas ferrovia da Vale do Rio Doce em Minas. Disponível em:

<http://www.brasildefato.com.br/node/836>. Acesso em: 16/06/2011.

 

CONSELHO INDIGENISTA MISSIONÁRIO. Krenak ocupam estrada de ferro da Companhia Vale do Rio Doce. Disponível em:

<http://www.cimi.org.br/?system=news&action=read&id=1594&eid=349>. Acesso em: 27/05/2010.

 

CORREIO DO BRASIL. Índios Krenak fecham a ferrovia Vitória-Minas em sinal de protesto. Disponível em: <http://www.correiodobrasil.com.br/noticia.asp?c=98772>. Acesso em: 18/05/2010.

 

ELETROBRÁS. Notícias econômico-financeiras: Ibama ameaça suspender licença de operação da usina de Aimorés. Disponível em:

<http://www.eletrobras.gov.br/IN_Noticias_Temas/2006/regulacao.asp>. Data de acesso: 07/06/2010.

 

Entrevista com o presidente da Associação dos Pescadores de Resplendor (APERDOCE). Pesquisa de campo do projeto Mapa dos Conflitos Ambientais do Estado de Minas Gerais. Resplendor, julho de 2009.

 

Entrevista com pescador da cidade de Aimorés. Pesquisa de campo do projeto Mapa dos Conflitos Ambientais do Estado de Minas Gerais. Aimorés, julho de 2009.

 

Entrevista com o presidente da Associação dos Moradores de Itueta. Pesquisa de campo do projeto Mapa dos Conflitos Ambientais do Estado de Minas Gerais. Itueta, julho de 2009.

 

Entrevista com moradora da cidade de Itueta. Pesquisa de campo do projeto Mapa dos Conflitos Ambientais do Estado de Minas Gerais. Itueta, julho de 2009.

 

Entrevista com representante do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Resplendor. Pesquisa de campo do projeto Mapa dos Conflitos Ambientais do Estado de Minas Gerais. Resplendor, julho de 2009.

 

Entrevista com membros da etnia Krenak. Pesquisa de campo do projeto Mapa dos Conflitos Ambientais do Estado de Minas Gerais. Resplendor, julho de 2009.

 

FISHER, Eliot Gray & KONGS, Anna. Power on the River. Filme produzido para o Programa de Estudos Documentários. College of Santa Fé, Novo México, 2006. 33 min.

 

HOJE EM DIA. Aimorés: Cenário de deserto no Rio Doce. Disponível em:

<http://www.hojeemdia.com.br/cmlink/hoje-em-dia/minas/aimores-cenario-de-deserto-no-rio-doce-1.89076>. Acesso em: 25/05/2010.

 

INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO ESTRATÉGICO DO SETOR ENERGÉTICO. Ibama pode suspender licença de operação da usina de Aimorés. Disponível em:

<http://www.ilumina.org.br/zpublisher/materias/Noticias_Comentadas.asp?id=18708>. Acesso em: 07/06/2010

 

JUSBRASIL NOTÍCIAS. Consórcio da Usina Hidrelétrica de Aimorés é réu em mais uma ação do MPF/MG. Disponível em:

<http://www.jusbrasil.com.br/noticias/1860159/consorcio-da-usina-de-aimores-e-reu-em-mais-uma-acao-do-mpf-mg>. Acesso em: 01/06/2010.

 

MINAS GERAIS. Ministério Público Estadual. Procedimento Administrativo 001/2008. Resplendor, 2008. [Consultado em 15/07/2009].

 

MINAS GERAIS. Ministério Público Federal. Inquérito Civil 1.22.009.000069/2007-15. Governador Valadares, 2007. [Consultado em julho de 2009].

 

MINAS GERAIS. Ministério Público Federal. Inquérito Civil 1.22.009.000101/2007-62. Governador Valadares, 2007. [Consultado em julho de 2009].

 

POVOS INDÍGENAS DO BRASIL. Cidade mineira será inundada para dar espaço a usina. Disponível em: <http://pib.socioambiental.org/en/noticias?id=32557>. Acesso em: 01/06/2010.

 

Relato de representante dos pescadores de Aimorés na Oficina Cidadania e Justiça Ambiental – Vale do Rio Doce e Mucuri. Governador Valadares, setembro de 2009.

 

Relato de representante dos pescadores de Aimorés na Oficina de Atualização do Mapa dos Conflitos Ambientais de Minas Gerais– Vale do Rio Doce e Mucuri. Governador Valadares, ï»¿ abril de 2013.

 

SÉCULO DIÁRIO. CEMIG triplica a área alagada pela usina de Aimorés para não dividir bolo do ICMS com o ES. Disponível em:

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SÉCULO DIÁRIO. Vale indeniza índios por Usina de Aimorés; pescadores do ES de fora. Disponível em: <http://www.seculodiario.com/exibir_not.asp?id=706>. Acesso em: 01/06/2010.

 

SEVÁ FILHO, A. O. & PINHEIRO, M.F.B. Conflitos Sociais e Institucionais na concretização recente de algumas Concessões de aproveitamentos hidrelétricos assinadas entre 1997 e 2000. Disponível em:

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO. Estação Itueta. Elementos técnicos de Aimorés: A represa que inundou Itueta. Disponível em:

 

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